Gostaria de partilhar um texto que recebi do Padre Inácio José do Vale sobre os perigos do barulho na nossa saude fisica, mental e espiritual. Estou copiando na íntegra, espero que goste:
BARULHO: DOENÇA E
MORTE
“Melhor é aprender a colocar as potências em silêncio e calando para que fale Deus”.
São João da Cruz
Místico e Doutor da Igreja
Vamos aprender a viver de forma espetacular com o sagrado silêncio!
O silêncio é terapêutico. É um tesouro disponível para todos. Ele é fonte imensurável para saúde física, emocional e espiritual. O silêncio é um milagre que executamos com as nossas potências na graça de Deus.
O silêncio é um caminho perfeito na busca à procura do bom Deus. O Pai Eterno tem muita coisa a ser manifesto pela via do bendito silêncio. Procuremos caminhar com o coração ardendo nesse mistério, que em parte será revelado pela mística da escuta.
DOENÇAS CARDIOVASCULARES
A situação em minha vizinhança é típica do restante da cidade São Paulo, como comprovam dados da prefeitura da cidade e medidas feitas recentemente por pesquisadores do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Desde que foi criado, em 2005, para combater a poluição sonora provocada por estabelecimentos comerciais como bares e restaurantes, o Programa de Silêncio Urbano (PSIU) do município de São Paulo recebe em torno de 30 mil reclamações anualmente. Já os especialistas em acústica Cristina Ikeda, Marcelo Aquilino e Peter Barry, do IPT, mediram em 2010 o nível de pressão sonora em nove ruas diferentes regiões da capital paulista durante o dia, constatando que o tráfego de veículos gera um volume muito acima dos 50 dB (A) – limite máximo recomendado para zonas residenciais urbanas pela norma 10.151, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), bem como pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O nível de ruído na Avenida Ibirapuera, por exemplo, alcançou os 75 dB (A).
Por conta de as pessoas estarem vivendo cada vez mais apinhadas, cercadas por veículos motorizados e alto-falantes, o ruído intenso só tende a aumentar em todas as metrópoles no Brasil e no mundo. Tanto é assim que há mais de duas décadas a OMS considera a poluição sonora o terceiro maior problema ambiental nas grandes cidades, só atrás da poluição das águas e do ar, sendo inclusive responsável por mortes, relacionadas com a ação do estresse provocado pelo barulho na evolução de doenças cardiovasculares. Mesmo assim, a questão é uma das mais negligenciadas, talvez porque a maioria das pessoas já se acostumou tanto com o excesso de ruído ambiente que nem o nota mais.
ANOS PERDIDOS
Uma resolução publicada em 2002 obriga todos os países da comunidade européia a realizarem o mapeamento da poluição sonora. “Todos os municípios com mais de 250 mil habitantes precisam ter um mapa indicando onde há ruídos, para adequarem seus planos diretores com solução para o problema”, conta o pesquisador Stephan Paul, professor do primeiro curso de Engenharia Acústica do Brasil, na Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. O pesquisador explica que os mapas acústicos das cidades são feitos utilizando tanto medidas dos níveis de pressão sonora em vários pontos da cidade, com simulações por computador da propagação do som, que levam em conta a geometria das ruas e edifícios, como as estatísticas do trânsito e da potência sonora que cada tipo de veículo gera. Assim é possível estimar o nível de pressão sonora em cada ponto da cidade.
Usando esses mapas acústicos para comparar estatísticas de doenças em pessoas vivendo em vizinhanças anormalmente tranqüilas e barulhentas, uma equipe internacional de quase 70 cientistas coordenada por Rokho Kim, do Centro Europeu para Saúde e Meio Ambiente da OMS, em Bonn, na Alemanha, publicou em março de 2011 o relatório mais completo do impacto da poluição sonora na saúde da população européia. “Os estudos populacionais mostram que há mais pacientes com doenças cardíacas, distúrbios de sono, irritação constante, dificuldade no aprendizado e zumbido no ouvido entre pessoas vivendo em ambientes ruidosos, em comparação com populações em ambientes silenciosos”, diz Rokho.
O relatório é o primeiro no mundo a apresentar um cálculo do número de anos de vida saudável perdidos por uma população, ao sofrer desconforto, doenças e morte prematura, por conta do barulho. De acordo com os pesquisadores, os 125 milhões de europeus vivendo em ambientes barulhentos perdem um total de 1,6 milhão de anos de vida saudável anualmente. Isso faz da poluição sonora o segundo maior problema ambiental da Europa, somente atrás da poluição do ar, que afeta a maioria dos 500 milhões de europeus, tirando deles 4,5 milhões de anos de vida saudável todo ano. Rokho acredita que, caso sejam feitos estudos semelhantes em cidades grandes em outros continentes, os resultados devem ser parecidos.
O coordenador do Laboratório de Poluição Atmosférica da Universidade de São Paulo (USP), patologista Paulo Saldiva explica que a medida do número de anos de vida saudável perdidos por uma população, ou DALYs, na sigla em inglês, é usada pela OMS e por outros órgãos de saúde para calcular o custo de tratar uma doença, como por exemplo, a tuberculose, ou de controlar um impacto ambiental, como a poluição sonora.
O coordenador do Centro Europeu para Saúde e Meio Ambiente da OMS acha impossível concluir qual é exatamente o risco à saúde que o barulho traz a uma única pessoa, a partir dos números de DALYs tomados de uma população. Isso porque a doença de um indivíduo é causada por uma soma de fatores genéticos, comportamentais, sociais e ambientais. O patologista da USP, no entanto, sugere dividir o número de DALYs da poluição sonora pelo número de habitantes afetados por ela. Fazendo isso e multiplicando o resultado pela expectativa média de vida de um europeu (79 anos), chega-se ao número de 1 ano de vida saudável perdido ao longo da vida por conta do barulho. “Em São Paulo, a poluição do ar tira em média 3 anos de vida da população”, compara Paulo.
O barulho ambiental mata porque desencadeia em nós uma constante reação de estresse. “É como se a gente estivesse permanentemente em uma situação de perigo”, explica o fonoaudiólogo Heraldo Guida, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Marília. Sob estresse, o organismo produz hormônios como a adrenalina e o cortisol que fazem com que a pressão arterial e a frequência dos batimentos cardíacos aumentem. “Se você estiver coma veia coronária em boas condições, então pode ficar tranqüilo”, explica Paulo Saldiva. “Mas se o seu sistema cardiovascular já estiver meio periclitante, pode ter uma isquemia miocárdica (infarto)”.
Reaprender a Escutar
No combate à poluição sonora, o som é tratado como algo a ser eliminado. Mas o que as pessoas buscam em geral não é o silêncio absoluto. Elas querem um ambiente com menos sons de motores e máquinas, e mais sons agradáveis: o burburinho de água correndo, o canto dos pássaros, o vento farfalhando as folhas etc. na Europa, arquitetos, artistas e urbanistas trabalhando com espaços públicos vêm desenvolvendo projetos que prevêem que os sons desejados. É o chamado paisagismo sonoro.
Desde os anos 1960, as pesquisas sobre paisagens sonoras são influenciadas fortemente pelo pensamento do compositor e pesquisador canadense Murray Schafer, que foi o pioneiro em captar os sons ambientes de comunidades tradicionais e da natureza, refletindo sobre a sua prevenção. “O Schafer fala que toda sociedade deveria ter o direito de escolher o seu ambiente sonoro”, diz a pesquisadora Marisa Fonterrada, do Instituto de Artes da Unesp, especialista na obra do pesquisador canadense.
Marisa explica que o ambiente sonoro agressivo das grandes cidades faz com que as pessoas se fechem para os sons a sua volta, tantos os ruins quanto os bons. “Estamos vivendo uma época de anestesia, o contrário da estesia, que é a sensibilidade dos sentidos”, ela diz. “Não adianta combater a poluição sonora só com leis; temos de trabalhar a consciência das pessoas para que escutem mais.”
Essa conscientização pode começar na escola. Marisa recomenda aos professores o livro de Murray Schafer Educação Sonora, lançado pela Editora Melhoramentos, em 2009. A obra propõe 100 exercícios simples de escuta que aguça, os ouvidos para notarem sutilezas muitas vezes perdidas em ambientes ruidosos.
Barulho Escolar
O tráfego pesado de uma estrada ao lado da escola ou a algazarra do recreio podem prejudicar os estudantes muito mais do que se imagina. Diversos estudos vêm demonstrando que crianças de escolas em locais barulhentos apresentam atraso de meses no aprendizado, além de uma memória de longo prazo menor em comparação com crianças de escolas em lugares tranqüilos. “O ruído ambiental afeta negativamente a motivação, a capacidade de aprendizagem e concentração”, afirma Ana Claudia Fiorini, fonoaudióloga da PUC de São Paulo e da Unifesp.
Além disso, de acordo com a arquiteta Cristina Ikeda, do Laboratório de Conforto Ambiental e Sustentabilidade dos Edifícios do IPT, o projeto do prédio das escolas pode apresentar diversos problemas acústicos, como a localização dos pátios, ginásios e das janelas das salas de aula, que agravam o problema.
As normas brasileiras recomendam que o ruído nas salas de aula não ultrapasse os 50 dB (A), Mas as medições de um estudo em andamento pelos fonoaudiólogos Heraldo Guida e Ana Cláudia Cardoso, da Unesp, mostram que o ruído chega muitas vezes a ultrapassar os 85 dB (A).
CONCLUSÃO
As cidades são notoriamente barulhentas, devido à grande concentração de tráfego e pessoas. É quase impossível fugir de música em volume alto, barulho do toque do celular, máquinas ruidosas e vozes altas. Mas, o tipo de ruído que coloca em perigo o nosso bem-estar espiritual não é o ruído do qual não conseguimos fugir, mas o ruído que convidamos a entrar em nossa vida. Alguns de nós usamos o ruído como uma maneira de nos isolarmos da solidão: músicas e vozes de personalidades da TV e do rádio nos dão a ilusão de companhia. Alguns de nós utilizamos o ruído como uma maneira de manter os nossos próprios pensamentos isolados; outras vozes e opiniões nos poupam de termos de pensar por nós mesmos. Alguns de nós usamos o ruído como uma maneira de isolar a voz de Deus, pois a tagarelice constante, mesmo quando estamos falando sobre Deus, nos impede de escutar o que Ele tem a nos dizer.
Nosso Senhor Jesus Cristo, mesmo em Seus momentos de maior ocupação, fez questão de procurar lugares solitários onde pudesse manter uma conversação com Deus (Mc 1,35). Mesmo que não consigamos encontrar um lugar perfeitamente calmo, precisamos encontrar um lugar para aquietar as nossas almas (Sl 63,1.2), um lugar onde Deus possa ter a nossa total atenção (Sl 84).
No filme O Diabo no banco dos réus, Satanás esbraveja: “Eu criei o barulho e o barulho afasta qualquer pensamento de Deus”.
Realmente, o barulho é a arte de Satanás para distanciar as pessoas da arte do silêncio e de Deus.
O barulho causa perturbação, infelicidade e morte. Enquanto o silêncio é o fator de paz, felicidade é vida abundante.
A verdadeira maravilha do silêncio é com Deus consigo mesmo e com a beleza da natureza.
Vamos praticar o santo silêncio para o equilíbrio abissal da nossa alma e de todo o nosso bem-estar.
Oração, meditação, silêncio e solidão no contexto da espiritualidade cristã são riquezas colossais ao espírito a via unitiva.
Pe. Inácio José do Vale
Professor de História da Igreja
Instituto Teológico Bento XVI
EFOR-Escola de Formação de Resende
Especialista em Ciência Social da Religião
E-mail: pe.inaciojose.osbm@hotmail.com
Fontes
Quanta, janeiro/fevereiro de 2011, pp.20-26.
João da Cruz, São. Subida do Monte Carmelo. São Paulo: Paulus; Petrópolis.RJ, Vozes, 2010, p. 419.