JMJ Rio-2013: é a nossa vez!

 A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) da Espanha mal terminou, e já estamos envolvidos na preparação da próxima Jornada, que acontecerá no Brasil em menos de 2 anos! Mais exatamente, de 23 a 28 de julho de 2013, no Rio de Janeiro. Antes disso, porém, haverá os dias da Pré-Jornada, envolvendo, de alguma forma, o Brasil todo, com jovens vindos de numerosos países de todo o mundo, a serem a acolhidos em nossas dioceses e paróquias. Na Espanha, vinham de 170 países! De fato, a próxima Jornada já começa no próximo dia 18 de setembro, quando serão acolhidos os sinais da JMJ, a cruz e o ícone de Nossa Senhora em nossa cidade, como ponto de partida para sua peregrinação por todo o Brasil. Com a presença desses dois sinais da JMJ, as juventudes das dioceses e comunidades locais poderão se preparar para sua peregrinação, finalmente, ao Rio de Janeiro, em julho de 2013. Para o dia 18 de setembro, está sendo preparado o evento chamado BOTEFÉ, no Campo de Marte, com cantores, celebrações, testemunhos e várias outras iniciativas e atrações, para envolver a juventude e também os adultos e crianças, das 9h00 às 21h00; a cruz da JMJ será acolhida festivamente às 16h00 no local; em seguida, haverá a Missa. É a hora de manifestarmos nossa fé, carinho e apoio à juventude. Paróquias, famílias, grupos, movimentos, pastorais, organizações juvenis, escolas, todos estão convidados! O êxito do evento dependerá do envolvimento de todos nós, católicos paulistanos e paulistas! De fato, a preparação e a realização da JMJ-Rio 2013 será uma “tempo favorável”, uma graça especial para a juventude em nosso país. É ocasião para não se perder e para aproveitar desde o primeiro momento, que será, justamente, a acolhida da cruz em São Paulo, no dia 18. Em seguida, ela permanecerá em nossa Arquidiocese por alguns dias, em várias igrejas e locais, para que muitos tenham a oportunidade de venerar esses sinais, que já emocionaram milhões de jovens nas Jornadas. Para nossa alegria, o papa Bento XVI já definiu o tema da JMJ-Rio 2013: “Ide, pois, fazei discípulos entre todas as nações!” (Mt 28, 19); está na continuidade do tema da JMJ de Madrid: Estar “firmes na fé, enraizados e edificados em Cristo”, deve levar espontaneamente e organizadamente a “fazer discípulos” de Cristo. A fé, quando verdadeira, não fica guardada somente para si, mas torna-se contagiosa! Está na continuidade também dos temas que movem a evangelização na América Latina, depois da Conferência de Aparecida (2007): “discípulos missionários de Jesus Cristo, para que, nele, nossos povos tenham vida”. No final da JMJ de Madrid, o papa Bento XVI convidou os jovens a retornarem aos seus 170 povos diversos, para contar aos outros o que viram e ouviram durante aqueles dias memoráveis… Não é diverso daquilo que Jesus mandou os discípulos fazerem, ao enviá-los em missão entre todos os povos. Os cristãos têm muito para anunciar aos povos! E também têm bons motivos para convidar outras pessoas para irem ao encontro de Cristo, deixando-se envolver e encantar por ele… A festa que está sendo preparada para o dia 18 de setembro, no Campo de Marte, já será uma boa ocasião para fazer isso! Publicado em O SÃO PAULO, ed. de 30.08.2011 Card. Odilo P. Scherer Arcebispo de São Paulo

 

Preservar a natureza, respeitar os ecossistemas e não interferir indevidamente no delicado equilíbrio ambiental, para não comprometer a sobrevivência das espécies… Será apenas exaltação romântica de ambientalistas? Por certo, ninguém ousa mais afirmar isso; o desrespeito à natureza e uma relação inconsequente com o mundo que nos sustenta poderia custar caro. Também nós somos parte dessa natureza e dependemos dela.

Isso me faz refletir sobre a união estável entre pessoas do mesmo sexo, equiparada pelo STF à união estável entre pessoas de sexos diferentes; a decisão colocou ainda mais em evidência, na opinião pública, as temáticas de homossexualismo e gênero, em discussão um pouco por toda parte. Penso que isso requeira uma reflexão sobre a própria natureza do ser humano e sua sexualidade.

Parto da antropologia cristã, que procura compreender e explicar o ser humano à luz do desígnio de Deus sobre o homem e a mulher, perceptível pela inteligência a partir da natureza das coisas e da revelação divina, na Sagrada Escritura. O pensamento cristão reconhece dois gêneros complementares – masculino e feminino. O relato bíblico diz, de maneira poética, que Deus criou o ser humano à sua imagem e semelhança e constata: “homem e mulher Deus os criou” (Gn 1,27). E Deus viu que assim estava bem, muito bom!

O homem não é, pois, fruto de uma evolução caótica ou de um voluntarismo volúvel, mas do desígnio divino, sábio e bom, perceptível na própria natureza humana: na sua corporeidade, inteligência, vontade e capacidades espirituais, orientadas não apenas para a sobrevivência, mas também para a busca da verdade, do bem e da plenitude do viver. O homem é dotado de liberdade e tem a capacidade de discernir e de decidir-se pelo bem, ou pelo mal; no exercício da liberdade, com responsabilidade, está uma das razões de sua dignidade e grandeza.

Nem somos, como cantava um de nossos poetas, “esta metamorfose ambulante”, que segue vagando pela vida sem saber quem é, o que quer, para quê vive, por que é aquilo que é; e nem estamos presos a um determinismo cego, acorrentados aos acontecimentos e à ignorância sobre nós mesmos, sem que possamos ser senhores das nossas decisões e ações. Cabe-nos tomar conta de nós mesmos e viver de forma responsável, conforme nossa natureza e dignidade.

Um aspecto importante desse viver conforme a nossa natureza e dignidade consiste em assumir a própria identidade sexual. Sobre isso há muita confusão na cultura atual; ao invés de ter a identidade sexual como um dado de natureza, com significado e valores próprios, tende-se a ver nela um fenômeno cultural volúvel, uma “construção subjetiva”; cada um lhe daria a orientação ditada pela vontade, sentimentos e gostos pessoais. Nem mesmo a diferenciação sexual física entre o masculino e o feminino é levada a sério; seria apenas um “fato secundário”, quase um adereço descartável no corpo humano, contando mais aquilo que o sujeito decide ser. Identidade sexual seria, pois, uma questão de opção.

Será que não estamos aqui diante de um tremendo equívoco, apoiado no pressuposto errôneo de que a “natureza humana” não é um dado real, mas algo projetado pelo sujeito, de dentro para fora de si? Nega-se à natureza humana a “objetividade” que se afirma e defende, com razão, para a natureza dos outros seres. Uma consequência dessa confusão, relativa à identidade sexual, é o aumento de comportamentos pouco ou nada definidos, nem masculinos, nem femininos. A “troca de sexo” parece um fato banal, apenas uma intervenção cirúrgica no corpo… Neste contexto, ser heterossexual, homem ou mulher, seria apenas uma entre várias possibilidades e opções quanto à identidade sexual. E se chama “casamento” a união entre pessoas do mesmo sexo! Diante da pressão das circunstâncias, questionar isso, quem ousaria? Seria politicamente incorreto!

Mas… perguntar é preciso! Assim está bem? Assim vai ficar bem? Que conseqüências isso terá para o futuro? A antropologia cristã afirma que a diferenciação sexual física tem um significado próprio, a ser levado plenamente a sério. A pretensão de mexer na harmonia entre os sexos e de submeter a identidade sexual ao arbítrio da vontade e dos sentimentos, tão influenciáveis por fatores culturais e dinâmicas sócio-educativas (ou deseducativas…), é uma temeridade, que não promete bons frutos.

A Igreja católica vê com preocupação a crescente distorção sobre a identidade sexual. Antes mesmo de ser uma questão moral, é um problema antropológico. A Igreja não incentiva, não apóia nem justifica qualquer tipo de violência e agressão contra homossexuais, ou quem quer que seja, mas convida a uma séria reflexão. Não é pensável que a natureza tenha errado, ao moldar o ser humano como homem e mulher. Isso tem sentido e finalidade, que é preciso descobrir e acolher, em vez de banalizar.

A sexualidade qualifica todos os aspectos da pessoa humana, na sua unidade de alma e corpo, e diz respeito à afetividade, à capacidade de amar e procriar, de estabelecer vínculos serenos e altruístas com os demais. Cabe a cada homem e mulher reconhecer e aceitar a própria identidade sexual como um dom e uma missão; as diferenças físicas, morais e espirituais são voltadas para a complementariedade, um bem para as pessoas e para o fecundo convívio social.

O coração pode ser como um barco desatado; não comandado pela racionalidade, ele é arrastado pelas correntes oportunistas e se rebenta contra os rochedos… Não respeitar a natureza das coisas leva a desastres ambientais e compromete a sustentabilidade da vida. E não é assim, quando se trata da natureza humana?

SÃO PAULO, 08.07.2011

Card. Odilo P. Scherer

Arcebispo de São Paulo

 

Estimados irmãos e irmãs!

Com a Quaresma, fizemos um caminho penitencial, que nos levou, por meio da oração, do jejum e da esmola, a gestos concretos de boas obras, reforçando nossa solidariedade e comunhão eclesial. A CF-2011 nos ajudou a tomar consciência mais profunda que todos devemos cuidar bem da nossa casa comum, a natureza e a Terra, superando estilos de vida e de cultura que colocam em risco o futuro da vida no nosso Planeta. Somos discípulos do Ressuscitado, que veio “para que todos tenham vida em abundância”.

A Páscoa é a vitória da vida sobre a morte. O Deus Criador é também o Deus Salvador. O homem introduziu o pecado no mundo e, assim, a desordem nas relações com o próximo e com a natureza. Mas Cristo venceu o pecado e a morte mediante a sua fidelidade e obediência a Deus; entregou sua vida pela humanidade – “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Ele cumpriu a missão recebida de Deus Pai, “que amou tanto o mundo, a ponto de lhe entregar o seu Filho único, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16).

Celebremos, pois, a Páscoa com alegria e nova disposição para seguir o exemplo de Cristo. Convido todos a viverem com entusiasmo o período pascal até Pentecostes, que celebra o fruto maior da redenção, o dom do Espírito Santificador dado aos homens. Seja intensa nossa alegria pascal, pois cremos no Deus da vida e da esperança e seguimos a Cristo Salvador, que venceu a morte e é “garantidor” de nossa vida futura.

Convido, sobretudo, os jovens a olharem para a vida com confiança e esperança; embora haja tantos motivos de preocupação, não esqueçamos que a humanidade pode seguir com confiança, quando está com Deus; temos a certeza de que não estamos sozinhos ou sem rumo diante dos desafios do futuro: Deus entrou na nossa História e vai conosco; Ele nos ama e nos mostra os caminhos bons; seguindo por eles, estaremos seguros. Sigamos, pois, na vida, “enraizados e edificados em Cristo, firmes na fé” (cf Cl 2,7). Os jovens do mundo inteiro estão se preparando para a Jornada Mundial da Juventude, com o Papa, em Madrid, em agosto deste ano. Convido a Juventude nossas Comunidades a se preparar também para esse extraordinário encontro!

Votos de feliz e santa Páscoa para todos, com a bênção de Deus!

Card. Dom Odilo P. Scherer

Arcebispo de São Paulo

 

Com a festa de São Paulo, nosso patrono, dia 25 de janeiro, fazemos também a abertura do Ano Pastoral em nossa Arquidiocese. Ao mesmo tempo, oferecemos a Deus nossos grandes propósitos e projetos para o ano e pedimos, pela intercessão do apóstolo São Paulo, nosso patrono, a graça da fidelidade, da perseverança e dos bons frutos nos objetivos que nos propomos.

Mesmo sem planejamentos especiais, bastaria seguir bem o ritmo do Ano Litúrgico para termos um ano cheio de propostas. De fato, acompanhar e viver a mística do Ano Litúrgico é uma prática saudável e de grande valor pedagógico para a vivência pessoal da fé e para o serviço de evangelização da Igreja. A Igreja tem uma rica proposta de evangelização, cada ano, nas celebrações e comemorações do tempo litúrgico. Quem segue regularmente as celebrações litúrgicas da Igreja tem farto alimento para a fé e para o testemunho cristão no mundo, passo a passo, ao longo de todo o ano.

Porém, em 2011, a Arquidiocese de São Paulo coloca em destaque, para a reflexão e a ação pastoral, a paróquia, “comunidade de comunidades”. Centrando nossas atenções sobre a paróquia, enquanto expressão mais próxima e concreta do Mistério da Igreja, queremos avançar na proposta do 10° Plano de Pastoral da Arquidiocese, que nos convoca a sermos discípulos missionários de Jesus Cristo na grande e complexa cidade de São Paulo de forma nova e mais incisiva.

Seria impossível pensar nossa Igreja, sem as paróquias, com seu padre, suas igrejas matrizes, seus espaços de vida e ação pastoral, sua presença no espaço social e cultural… Mesmo com as dificuldades e deficiências próprias do nosso tempo e do contexto da metrópole, e sem ter a pretensão de que a paróquia consiga sozinha enfrentar todas as necessidades e desafios da missão da Igreja, continua verdadeiro que ela ainda tem sua razão de ser e de existir; a Igreja nunca abandonou a paróquia, mas convida a rever e aprofundar o seu significado, sua vida e missão.

Neste ano, portanto, tentaremos fazer o que depender de nós para que as paróquias se renovem e sejam autênticas comunidades de discípulos missionários de Jesus Cristo nesta cidade, que Deus ama. Um processo de conversão pastoral é necessário para recobrar as motivações e dar vida nova; talvez para superar cansaços, estagnação e a lógica da mera conservação. As paróquias precisam ser marcadas por nova dinâmica e um impulso decididamente missionário. Se não estivermos atentos, elas se fecham sobre si mesmas, ao invés de ser a presença missionária que se projeta ao seu redor, para o meio da comunidade humana. Para alcançar esta meta pastoral ao longo do ano, todos estão convidados a arregaçar as mangas: clero, leigos, religiosos, famílias, organizações várias da Igreja presentes nas paróquias… Os jovens terão um ano privilegiado; com o clero, teremos uma reunião importante já dia 15 de fevereiro, para tratar do assunto. Como arcebispo, escreverei uma Carta Pastoral para toda a Arquidiocese sobre esse assunto.

Mas o ano pastoral de 2011 nos prepara ainda muita coisa: a Campanha da Fraternidade, com o tema – Fraternidade e a vida no Planeta –, é um convite a cuidar, com responsabilidade compartilhada, da nossa casa comum, aprofundando a cultura do respeito, do cuidado e da solidariedade. As catástrofes naturais desses dias desafiam nosso senso ético diante da natureza e dos demais habitantes da Terra.

O 1° Congresso de Leigos, realizado em 2010, mobilizou milhares de leigos e leigas, que querem se envolver numa ação mais planejada eficaz do laicato em nossa Arquidiocese. Os muitos propósitos elaborados nas Oficinas Temáticas e apresentados no encerramento do Congresso precisam ser retomados e trabalhados. Em agosto será realizada a Jornada Mundial da Juventude com o papa, em Madrid; muitos jovens já estão se mobilizando para ir à Espanha e, com centenas de milhares de outros jovens de todas as partes do mundo, desejam participar, se “enraizar” mais em Cristo.

Nossa Arquidiocese também terá um fato novo e importante para a vida da nossa Igreja e sua dimensão missionária: está sendo aberto um Seminário Redemptoris Mater, confiado à direção do Caminho Neo Catecumenal, para formar padres seculares com carisma missionário. Que São Paulo, discípulo e missionário de Jesus Cristo, interceda por nós!

 

 

Publicado em O SÃO PAULO, ed. de 18.01.2011

Card. Odilo P. Scherer

Arcebispo de São Paulo

 

Querido povo de Deus em São Paulo!

Feliz e abençoado Natal para todos! Que a recordação do nascimento de Jesus Cristo traga bênção, paz e alegria aos seus lares e seja motivo de renovada esperança e conforto para os que sofrem ou andam tristes. Deus pensou em nós, em cada um de nós!

Por seu Filho eterno, nascido para este mundo como filho da Virgem Maria, Deus veio ao nosso encontro para ser Emanuel – Deus conosco. Por isso, ninguém deve sentir-se só e esquecido: Deus se fez próximo de nós todos e preenche nossa vida de sentido. Ele está no meio de nós!

Este ano foi marcado, em nossa Arquidiocese, pelo 1º Congresso de Leigos. Por isso, desejo saudar, de maneira especial, a todos os leigos e leigas. É belo pensar que o nascimento de Jesus foi um acontecimento que envolveu, sobretudo, leigos e leigas: Maria, José, os pastores, os reis magos… Houve também o sacerdote Simeão e a profetisa Ana… Mas foi um acontecimento em família, envolvendo leigos, sobretudo.

E a Boa Nova do nascimento de Jesus Cristo, proclamada pelos anjos, também foi acolhida e difundida, em primeiro lugar, por leigos e leigas. Não seria isso um sinal forte do desejo de Deus? Ainda hoje, a Igreja conta com a participação de todos fiéis leigos e leigas para que a Boa Nova do Natal seja acolhida e difundida em todo o mundo. Conta com os pais cristãos e as famílias que, como Maria e José, se colocam a serviço de Deus e colaboram com sua obra.

Os pais têm a grande chance de apresentar seus filhos pequenos a Deus, como fizeram Maria e José, introduzindo Jesus no templo, diante do sacerdote; podem transmitir-lhes as primeiras práticas e ensinamentos da fé, o senso da consciência moral, amor e delicado respeito ao próximo; isso eles conservarão para toda a vida. A transmissão da fé, de geração em geração, acontece sobretudo na família e os pais cristãos são os primeiros evangelizadores dos seus filhos.

Neste Natal peço que Deus abençoe a todos os leigos e leigas de nossa Arquidiocese; e os encorajo a serem anunciadores da Boa Nova do Natal à cidade, como foram os pastores nos campos de Belém. Sejam por toda parte sinais de que Deus habita esta cidade e quer bem a todos os seus habitantes!

Feliz e abençoado Natal a todos! E que o ano de 2011 seja portador de bênçãos e boas realizações, com a graça de Deus!

 

 

Card. Odilo P. Scherer

Arcebispo de São Paulo

 

 

No Natal comemoramos uma vez mais o nascimento de Jesus Cristo, acontecido há mais de dois mil anos. O evangelista S.Lucas nos conta que os pais de Jesus eram de Nazaré, na Galileia, mas na condição de migrantes forçados encontravam-se em Belém, na Judéia; não houve acolhida nas casas para eles – “não havia lugar para eles” – e Jesus teve que nascer fora da cidade, num abrigo para animais (cf. Lc 2,7). Logo em seguida, o rei Herodes quis matar o menino Jesus, porque via nele uma ameaça para seu trono. Então, Maria e José fugiram às pressas, para salvar o menino, e viveram como exilados no Egito (cf Mt 2,13-15).

O Cristianismo começa, pois, com fatos migração forçada e de exílio. O Filho de Deus, vindo ao mundo, conheceu logo as inseguranças e angústias da humanidade; por isso, a Igreja fundada por ele entende ser também seu dever estar ao lado dos que continuam a sofrer o desrespeito aos seus mais elementares direitos. E convida a humanidade a superar suas divisões, relações injustas e a indiferença diante aquilo que avilta a dignidade do próximo.

A Comissão Católica Internacional para as Migrações (CCIM) é um organismo fundado em 1951 pelo papa Pio XII, com sede em Genebra, para unir e coordenar os esforços das Associações e obras que já se ocupavam dos migrantes e refugiados e para suscitar novas e eficazes iniciativas em favor dos muitos desalojados e desenraizados pela 2ª. grande guerra mundial. A Comissão nunca mais parou de trabalhar. Guerras sucessivas, desigualdades econômicas e outros fatores continuaram a produzir milhões de migrantes e refugiados em todo o mundo. Nos anos sessenta, empenhou-se no socorro a refugiados políticos por causa das ditaduras e guerrilhas na América Latina; nos anos setenta, centenas de milhares de pessoas foram socorridas no sudeste asiático, sobretudo por causa da guerra do Vietnã. Nos anos oitenta, os refugiados do Leste europeu precisaram ser socorridos.

Os conflitos na região balcânica, nos anos noventa, deram origem a novas levas de refugiados, que precisaram ser socorridos e realocados; no mesmo período, tensões étnicas no continente africano criaram situações de verdadeira calamidade humanitária; a CCIM, mais uma vez entrou em campo para socorrer populações feridas e indefesas no Burundi e na Guiné. Agora faz o mesmo no Afeganistão, no Iraque e no Sudão… No sudeste asiático, tsunamis, enchentes e catástrofes naturais, além de conflitos e a miséria, não cessam de colocar em marcha milhões de pessoas à procura de abrigo seguro. Ondas migratórias atravessam o Mediterrâneo e o Caribe, muitas vezes em embarcações frágeis e superlotadas, ou cruzam as fronteiras secas do México e também do Brasil.  Mulheres, crianças e idosos são as maiores vítimas.

A CCIM continua com sua atenção voltada para a recolocação de refugiados, especialmente os mais vulneráveis. Ao contrário do que se poderia imaginar, são relativamente poucos os países dispostos a acolher refugiados. A Comissão atua em sintonia com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), com a Cruz Vermelha e a Cáritas Internacional. A questão tem implicações políticas, que precisam ser trabalhadas nas instâncias internacionais competentes. O papa Bento XVI bem recordou, na encíclica Caritas in Veritate, que nenhum país consegue enfrentar sozinho a questão migratória e, por isso, deve haver uma conjugação de esforços em âmbito internacional. Torna-se sempre mais necessário desenvolver políticas globais para as migrações a fim de harmonizar os esforços internacionais com as normas locais, para salvaguardar a dignidade e os direitos das pessoas e das famílias migrantes (cf. n. 62).

A Comissão empenha-se na defesa da dignidade e dos direitos dos migrantes e refugiados; e não é sem razão, pois numa massa tão grande e tão fragilizada também medram organizações criminosas dispostas a explorar de forma desumana essas pessoas. O tráfico de pessoas para a exploração sexual, a mão de obra semi-escrava e até para o comércio de órgãos é um fato vergonhoso para a civilização do século XXI e envolve números alarmantes; recentemente, a Organização Mundial para o Trabalho estimou que a cada ano cerca de 2,4 milhões de homens e mulheres caem nas redes desses inescrupulosos mercantes de seres humanos. Muitas vezes, depois de terem pago a peso de ouro as promessas de documentos, emprego e moradia a seus exploradores, essas pessoas são abandonadas a si em alto mar, em embarcações à deriva; outras vezes, ao chegarem ao sonhado país da liberdade e da prosperidade, são recolhidos em campos de prófugos, que mais parecem campos de concentração, ou são imediatamente devolvidos ao país de origem, com todo o sofrimento e os riscos que isso comporta. A dignidade dessas pessoas é aviltada completamente.

Mas voltemos ao Natal: o Filho de Deus veio unir na fraternidade e na paz toda a humanidade. Somos todos parte de uma única família de povos, raças, culturas, irmãos uns dos outros, de filhos e filhas amados por Deus. Esta é a grande mensagem do Natal para a humanidade; conforme o anjo anunciou aos pastores de Belém: “será uma grande alegria para todo o povo!” (cf. Lc 2,10).

A comemoração do Natal se expressa em gestos de solidariedade, amor desinteressado, perdão e acolhida simples e fraterna. Por quê, será? Será por uma trégua do poder do egoísmo que governa o mundo? Acho que não. São manifestações da inquieta nostalgia do bem que há no coração do homem, daquilo que há de mais verdadeiro e genuíno em nós. Que bom seria, se fosse Natal todos os dias! Não haveria mais migrantes forçados nem refugiados.

 

Publicado em O ESTADO DE SÃO PAULO,

ed. de 11.12.2010

Card. Odilo P. Scherer

Arcebispo de São Paulo

 

Tudo o que outrora foi escrito, foi escrito para nossa instrução, para que pela nossa constância e pelo conforto espiritual das Escrituras, tenhamos firme esperança” (Rm 15, 4). Enquanto peregrinamos na espera da vinda gloriosa do Senhor, as palavras do apóstolo nos abrem ao mistério da sua palavra vivente, por ele pronunciada todos os dias no segredo das consciências, nos acontecimentos da vida, nas belezas – e nas feridas – da criação e celebrada na liturgia. Deus continua nos falando com certeza para nos instruir sobre as verdades da fé e para orientar nossos comportamentos morais no dia a dia. Mas se fosse só isso, seria muito pouco. “As escrituras são a carta de amor de Deus à sua namorada: conhece o coração de Deus nas palavras de Deus!” (São Gregório Magno). Ele fica sendo nosso interlocutor apaixonado na experiência sempre nova do encontro transformador com o seu santo Espírito. 

A celebração litúrgica do Mistério Pascal é o lugar privilegiado deste encontro vivificador, pois é o centro, o motor de todo este dinamismo do amor divino. “A celebração litúrgica torna-se uma contínua, plena e eficaz proclamação da Palavra de Deus. Por isso, constantemente anunciada na liturgia, a Palavra de Deus permanece viva e eficaz pela força do Espírito Santo, e manifesta aquele amor operante do Pai que não cessa jamais de agir em favor de todos os homens” (Introdução ao Elenco das Leituras da Missa, 4). A esta história divina e humana – uma história de amor! – estão sendo sempre acrescentadas páginas novas ao livro que a narra. Juntos, com o Senhor, estamos escrevendo as páginas do ano 2010-2011; são páginas iluminadas por todas aquelas que as precederam e que por sua vez iluminam as do passado na luz do Espírito.

Apareceu João Batista, pregando no deserto da Judéia: “Convertei-vos, porque o reino dos céus está próximo…. Produzi frutos que provem a vossa conversão” (Mt 3,1-2;8). Um grito cortante e ameaçador se eleva no deserto da boca de João, o precursor do Senhor, para despertar as consciências do povo e prepará-lo para acolher o messias de Deus. Este está já presente no meio dele, escondido na humildade da condição do homem comum, mas ungido pelo Espírito Santo em cuja força haverá de renovar as situações mais fragilizadas. Os olhos do povo ficam fechados pelo preconceito; ele, o povo, imagina e pretende de Deus um Messias forte, capaz de produzir efeitos imediatos no âmbito daquilo que mais lhe interessa: o bem estar social e a liberdade política. Até mesmo os discípulos de Jesus se esforçarão muito para aderir ao estilo pobre de Deus e de Jesus; essa dificuldade permanecerá até a iluminação do Espírito e do próprio Jesus depois da Páscoa. Será que a nossa reação frente aos desafios e às dificuldades da vida é muito diferente?

Deus é fiel à sua promessa. A profecia de uma renovação radical da situação, portadora de consolação e esperança para um povo reduzido quase a nada pelo exílio na Babilônia (Is 40,3), está para tornar-se realidade no presente. Contra as expectativas negativas de todo mundo, um novo êxodo está para ter início e irá tocar as profundezas das consciências: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai sua veredas” (Aclamação ao Evangelho). Olhando para os grandes problemas que desafiavam a Igreja e a família humana em meados do século passado, o bem-aventurado Papa João XXIII, contra os que ele chamava de “profetas de desventuras”, apontava profeticamente à primavera do Espírito que estava manifestando-se na Igreja com o Concílio Vaticano II como um novo Pentecostes. Precisamos também hoje de mestres semelhantes, guiados pelo Espírito, para reconhecer as novidades de Deus.

O reino de Deus, sua ação salvadora, está desenvolvendo seu dinamismo transformador e vai manifestar-se. Arrependimento e conversão para o Senhor constituem os aspectos complementares do mesmo processo renovador da existência e as condições para reconhecer a ação de Deus em Jesus, compreender seu estilo e conformar-se com ele. O mesmo apelo é proclamado por Jesus (cf. Mt 4,17) como eixo central da “Boa Nova”, por Ele anunciada e inaugurada. Com uma diferença substancial em relação à pregação do Batista: Jesus não ameaça, mas ele mesmo se torna “encontro” com o pecador, transformando sua inicial e confusa procura interior num encontro inesperado de salvação: “Zaqueu, desce depressa, pois hoje devo ficar em tua casa… Hoje a salvação entrou nesta casa, pois ele também é um filho de Abraão” (Lc 19,5; 9). 

Se para João o machado já está posto de modo ameaçador à raiz das árvores, em Jesus o Pai concede ainda um ano de espera confiante para a figueira estéril produzir frutos (Lc 13, 6-9). É “o ano da graça do Senhor” que Jesus coloca no cerne da sua missão e que não tem medida de tempo: “hoje se cumpriu aos vossos olhos esta passagem da escritura” ( Lc 4, 21). Qual estilo prevalece nas nossas comunidades e nas nossas relações interpessoais: o de João ou o de Jesus ? 

Em sintonia com a mais pura tradição dos profetas (cf. Is 1, 10-20), João frisa a exigência de não ficar na ilusão da pertença formal ao povo de Deus e das práticas rituais: “Não penseis que basta dizer: Abraão é nosso pai”. O próprio Jesus será ainda mais radical sobre este assunto na polêmica com os fariseus. O estilo de vida revela a verdadeira qualidade de toda religião. 

O deserto da Judéia é o lugar onde ressoa a mensagem exigente e promissora de João. O “deserto” na linguagem da escritura é o lugar/tempo privilegiado dos grandes eventos da história de Israel na sua relação com Deus: da eleição e aliança até a traição idolátrica. Mas é também o lugar propício para retornar ao Senhor, assim como oportunidade para um novo êxodo e uma nova libertação do exílio. Lugar e tempo da tentação, da provação e da intimidade. Na pregação dos profetas o “deserto” se torna a geografia interior que o povo, e cada autêntico israelita, precisa aprender a descobrir e habitar, para reencontrar a verdade de si mesmo e da sua relação com Deus e com os demais. 

É no deserto que o próprio Jesus é impelido pelo Espírito depois do batismo de penitência recebido por João, para ali enfrentar os radicais desafios da missão, chamado a cumprir em total obediência ao Pai. Jesus sai vitorioso do deserto também para nós. O deserto é o lugar do combate com as potências obscuras que habitam o coração do homem e da mulher de todo tempo. É o lugar da descida, até os grotões mais obscuros de si mesmo para se conhecer, se assumir com verdade e se entregar com coragem e confiança ao coração do Pai. Os místicos e as místicas cristãos falam da necessidade de descer no deserto do próprio coração para que se desperte e se renasça à nova vida. Nos dizem que é somente no silêncio do deserto interior que podem ser celebradas as núpcias com o Esposo divino.

Quantas pessoas hoje têm a coragem de ficar consigo mesmas fazendo silêncio exteriormente e interiormente para descer no deserto do próprio coração e ficar consigo mesmas? Quem sente a necessidade urgente de reservar com fidelidade pelo menos um tempo de silêncio, para a leitura rezada da palavra de Deus, lutando com coragem contra a correria às vezes superficial de todo dia? Afinal, a “cela interior/espaço sagrado” na qual podemos nos deter para cultivar a amizade com o Senhor, antes que nos mosteiros se encontra no próprio coração. Apesar do silêncio ser elemento integrante e fundamental para a autêntica participação ativa à liturgia (SC 19 e 30), quanto valor e espaço é reconhecido/concedido ao “sagrado silêncio” nas nossas celebrações? O Advento é tempo propício para deixar o nosso árido deserto florescer de novo. 

Na perspectiva do profeta, através da ação do messias vislumbra-se uma nova criação e uma nova história: “o lobo e o cordeiro viverão juntos e o leopardo deitar-se-á ao lado do cabrito”. Um sonho ingênuo destinado a desaparecer frente ao assolado deserto humano das cracolândias de São Paulo e das grandes metrópoles e da violência sem fim que arrasa países e cidades, como o Rio de Janeiro nos dias passados? O futuro “novo” é fruto sem dúvida da ação do messias na potência do Espírito. Mas não por magia. É preciso atuar com responsabilidade na sociedade deixando-se guiar pelo mesmo Espírito. “O Deus que dá constância e conforto vos dê a graça da harmonia e concórdia, uns com os outros, como ensina Cristo Jesus… por isso, acolhei uns aos outros como também Cristo vos acolheu para a gloria de Deus”( Rm 15, 5;7). 

Até que não prevaleça a nova lógica divina – mesmo entre os membros da comunidade de Cristo – dominará, mais ou menos mascarada, a lógica do lobo e do cordeiro não pacificados, como nas relações tensas entre judeus e pagãos na comunidade de Roma (Rm 15, 7-9). Mas Jesus exercita sua realeza na cruz como “Cordeiro imolado e vivente”,  compartilhando a mesma realeza  somente com aqueles/as que o seguem no mesmo caminho do amor crucificado (Ap 14, 1-5).

Consciente das potencialidades provenientes do Espírito e das contradições humanas, a Igreja nos convida a pedir ao Pai “que nenhuma atividade terrena nos impeça de correr ao encontro do vosso Filho, mas instruídos pela vossa sabedoria, participemos da plenitude de sua vida” (Oração do dia). 

Por Dom Emanuele Bargellini, Prior do Mosteiro da Transfiguração

Agencia Zenit/prod.

D. Odilo Scherer: necessidade de conversão das organizações e estruturas pastorais 

O cardeal Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, considera que é necessária a “conversão missionária” das organizações e estruturas pastorais, em particular da paróquia, com tudo o que ela significa.

Em artigo na edição desta semana do jornal arquidiocesano O São Paulo, o arcebispo afirma que a paróquia deve-se tornar mais “comunidade de comunidades, grupos, associações, movimentos e organizações de discípulos missionários, que nela vivem e se expressam”.

Dom Odilo assinala a necessidade de se tomar uma nova consciência sobre a realidade da paróquia, no sentido teológico e pastoral, superando uma visão apenas burocrática ou jurídica.

“Ela é o rosto mais visível e concreto do Mistério da Igreja, ‘sacramento de salvação’ no meio do mundo; é uma comunidade de batizados, congregados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, vivendo a fé, a esperança e a caridade.”

A paróquia “se reúne em torno de Jesus Cristo, Senhor e Pastor da Igreja, representado visivelmente pelo ministro ordenado, que está no meio dela e à sua frente para servi-la na caridade. A assembleia eucarística é a expressão mais visível e sacramental da Igreja”, afirma. 

Segundo o cardeal, a paróquia é, portanto, “‘casa de Deus’ no meio das casas dos homens, templo de Deus edificado por pedras vivas, que são todos os batizados; é o ‘corpo de Cristo’, através do qual ele continua a se expressar (…); é o concreto e visível ‘povo de Deus’, que irradia no mundo a luz de Cristo”.

Na paróquia – prossegue o purpurado –, a Igreja inteira se expressa e realiza a missão recebida de Cristo: “anunciar e acolher a Palavra de Deus; testemunhar a vida nova recebida no Batismo, buscando e expressando a santidade de vida; organizar e realizar a caridade pastoral, em nome de Jesus, Bom Pastor, e a seu exemplo”. 

Para o arcebispo de São Paulo, uma definição que cabe bem à paróquia é de “comunidade missionária dos fiéis em Cristo no meio do mundo”.

A paróquia “é o ícone visível daquilo que a Igreja de Jesus Cristo é na sua totalidade. Evidentemente, nenhuma paróquia se basta a si mesma, nem realiza sozinha e autonomamente a sua missão, mas o faz na comunhão da Igreja particular (a diocese) e da comunhão universal da Igreja”.

Contudo – afirma Dom Odilo –, a paróquia “é a Igreja ‘na base’; se ali a vida e a missão da Igreja acontecem, também na grande comunidade eclesial elas acontecem; do contrário, a Igreja corre o risco de ‘rodar no vazio’ e de se reduzir a uma série de instituições, sem chegar ao povo e às pessoas concretas”.

fonte: zenit.org

 

Dia Nacional da Juventude (DNJ), promovido pela CNBB, acontece neste ano pela 25ª. vez; além disso, 2010 foi declarado pela ONU como o Ano Internacional da Juventude. Portanto há motivos para um destaque e uma reflexão especial.

O Setor Juventude escolheu como tema – “celebrando a memória e transformando a história”. Os jovens recordam o percurso desses 25 anos de evangelização da juventude e querem assumir seu papel na transformação da história, seguindo os ensinamentos de Jesus Cristo anunciados pela Igreja. De fato, a fé cristã é uma enorme força e uma luz poderosa para iluminar e mudar a história; e cada geração de jovens é chamada a acolher e traduzir esta força renovadora, de forma criativa, na vida pessoal e social. Juventude é sempre promessa de novidade e esperança.

Também a Igreja espera isso mesmo dos jovens. A eles dizia o papa João Paulo II: “Vocês são o rosto jovem da Igreja!” A Igreja tem consciência disso e deseja voltar-se mais para os jovens, dialogar com eles e convidá-los a participarem da sua vida e missão. Sim, também os jovens cristãos são discípulos missionários de Jesus Cristo e o devem ser sobretudo, enquanto jovens, no meio dos seus companheiros de idade. Preocupa-nos o índice relativamente baixo dos jovens na vida e ação da Igreja. Temos muito a fazer!

O DNJ deste ano chama a atenção para o fato dramático da violência contra a juventude e até do extermínio de jovens. É uma triste realidade. As estatísticas mostram que é assustador o número de jovens assassinados em todo o Brasil. Muitas vezes, este fato doloroso tem relação com o envolvimento dos jovens no tráfico e no consumo de drogas. O consumo de drogas mata, mas também as redes de tráfico exterminam muitas vidas jovens, quer nas guerras de gangues, quer como “queima de arquivo”. É necessária uma séria reflexão da sociedade e das autoridades sobre este fato e sobre como ele pode ser superado. Certamente, a educação, as oportunidades de trabalho, a pertença a uma família e a um grupo de referência positivo são parte de solução e requerem investimentos e políticas públicas adequadas.

Mas não tudo se resolve por aí. Os jovens necessitam de sentido para sua vida e isso, muitas vezes, lhes é negado, ou passado de maneira equivocada. A Igreja, ao mesmo tempo que apóia e incentiva a oferta de oportunidades de educação e trabalho para os jovens, convida-os ao encontro com Jesus Cristo, caminho, verdade e vida. Ele é capaz de preencher a vida de sentido. O papa Bento XVI dizia aos jovens, logo no início de seu pontificado: Não tenham medo de deixar Jesus entrar em suas vidas: ele não lhes tira nada do que é bom, mas faz conhecer e valorizar aquilo que é grande e belo e que merece ser abraçado com entusiasmo!

Desde 1989, em média a cada 3 anos, está sendo realizada a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) com o papa; a última foi em Sidney, na Austrália, e a próxima será em Madrid, de 16 a 21 de agosto de 2011. E já estamos felizes por saber que, depois, em 2013 ou 2014, a Jornada acontecerá no Brasil! Por isso mesmo o Encontro na Espanha interessa muito à juventude e à Igreja no Brasil; muitos jovens brasileiros, de todas as dioceses, deverão estar presentes em Madrid, quer para aprender a metodologia da realização das Jornadas, quer para acolher o anúncio da Jornada seguinte, a ser feita no Brasil. E já vai acontecendo uma mobilização de organizações da juventude na Igreja em vista da participação na Espanha; de fato, é preciso pensar na viagem, na hospedagem, na definição de quem irá como representante dos grupos e organizações. Haverá uma delegação oficial do Brasil, mas também muitos outros jovens poderão ir, organizando-se espontaneamente. O mesmo também está acontecendo em outros países.

As Jornadas têm sido ocasiões muito ricas para os jovens do mundo inteiro e para o trabalho da Igreja com eles. Além da reflexão temática propriamente dita, cria-se uma interação positiva e a percepção de que há muitos jovens pelo mundo todo que estão no mesmo caminho de busca e se alegram juntos pelas respostas encontradas no encontro com Cristo e na participação na vida da Igreja. Vamos lá, juventude, é ocasião para não se perder! Os frutos serão abundantes!

Card. Odilo P. Scherer

Arcebispo de São Paulo

Artigo publicado em O SÃO PAULO, na ed. de 01.11.2010

 

 

No mês das vocações, destacamos
a vocação dos cristãos leigos
e leigas. São todos os membros
da Igreja que vivem sua fé e sua
consagração batismal nas condições
ordinárias da vida: na família, nas
profissões, no mundo da cultura
ou exercendo responsabilidades sociais.
É esse imenso povo de Deus
presente em todo o tecido social,
permeando-o com o sal e fermento
do Evangelho e irradiando sobre
as realidades deste mundo a luz
de Cristo, que ilumina sua própria
vida.
Com frequência, somos levados
a considerar como “cristãos leigos”
apenas aqueles que realizam
atividades pastorais no ambiente
eclesial propriamente dito. Certamente,
a sua participação na vida
da Igreja, naquilo que lhe compete,
é de suma importância e a Igreja
agradece a sua colaboração generosa
nas diversas responsabilidades
das comunidades eclesiais, como a
catequese, a animação litúrgica ou
as muitas formas de ação pastoral
e administrativa. No entanto, nem
todos os fiéis leigos poderiam estar
empenhados em alguma pastoral.
De fato, porém, a vocação primordial
dos fiéis leigos é testemunhar
a novidade do Reino de Deus
no “mundo secular” (cf LG 31),
lá onde a Igreja não está presente
de forma institucional. Trata-se de
um vastíssimo e desafiador campo
para a ação missionária da Igreja,
a ser atingido, sobretudo através
dos leigos. A vida na comunidade
eclesial, as celebrações litúrgicas

e as organizações eclesiais são momentos
e espaços necessários para
o cultivo e a alimentação da fé, para
o suporte e o preparo para a ação no
mundo; toda a vida do cristão leva
à Eucaristia e, dela, tira sua força
toda a fecundidade para a vivência
apostólica diária. O mesmo poderia
ser dito da Palavra de Deus: dela
parte todo impulso para a missão e,
ao mesmo tempo, toda ação cristã
no mundo requer constante retorno
à Palavra de Deus para iluminar,
discernir, encorajar e sustentar a
vivência da fé. Mas a vida cristã

não se restringe a esses momentos
e espaços.
Na solenidade da Assunção de
Nossa Senhora ao céu, celebrada
dia 15 de agosto, apareceu mais de
uma vez a menção do simbolismo
bonito da “arca de Deus”, introduzida
na cidade santa (1Cr 15; Sl
131/132). A arca continha as tábuas
da Lei de Deus e lembrava sempre
a Aliança de Deus com seu povo
no sopé do Sinai: “se guardardes
as minhas palavras, minhas leis e
mandamentos (…), eu serei o vosso
Deus e vós sereis o meu povo”. Depois
de edificar a cidadela de Sião
(Jerusalém), Davi introduziu nela a
arca para simbolizar a permanente
presença salvadora de Deus com
seu povo (cf 1Cr 15). E a observância
da suprema Lei era sinal de
fidelidade do povo ao seu compromisso
para com Deus: “Faremos

tudo o que o Senhor nos ordenar”.
Ao mesmo tempo, esta fidelidade a
Deus ordenava o convívio social e
assegurava a paz.
A imagem da arca é aplicada a
Maria, que nos trouxe o Salvador
e supremo revelador da vontade
de Deus. Bonito é o Evangelho da
visita de Maria à sua prima Isabel (cf
Lc 1,39-56); ela é a arca da Aliança
introduzida na casa de Zacarias e
Isabel; a casa fica cheia de Deus!
Elevada ao céu, Maria é a arca de
Deus introduzida solenemente
na “cidade santa”, a Jerusalém
celeste e definitiva, anúncio e sinal
da plenitude da redenção, quando
também a morte será vencida (cf Ap
11,19; 12,10).
A imagem da arca também se
aplica à Igreja que, à imagem de
Maria, e tem a missão de ser o sinal
da perene presença e ação salvadora
de Deus no meio dos homens. A
comunidade cristã, Igreja viva, e
cada um de seus membros, devem
irradiar o reino de Deus no mundo;
pela ação missionária da Igreja, a
cidade dos homens, edifica-se em
cidade de Deus, até que chegue o
grande “dia do Senhor”. Esta missão
cabe, de maneira especial, aos
cristãos leigos e leigas, que estão em
contato direto com as “realidades
terrestres” e atuam no “mundo
secular”.
O Concílio indica que é lá que
os leigos são chamados por Deus
“para que, exercendo seu próprio
ofício guiados pelo espírito evangélico,
como o fermento na massa, de
dentro contribuam para santificar o
mundo. E assim manifestem Cristo
aos outros, especialmente pelo
testemunho de sua vida resplandecente
de fé, esperança e caridade”
(LG 31). Vocação bonita e missão
grandiosa, para cuja realização
podem contar com a fidelidade de
Cristo Salvador, que os envia: “eu
estarei sempre convosco, até o fim
dos tempos” (Mt 28,20).

.

 

Card. Dom Odilo Pedro Scherer

Arcebispo de São Paulo

Artigo publicado em O ESTADO DE SÃO PAULO, dia 17.08.2010