Do Catecismo de São João Maria Vianney, presbítero
(Catéchisme sur la prière: A.Monnin, Esprit du Curé d’Ars, Paris1 899, pp.87-89)

(Séc.XIX)

20120804-083955.jpgA mais bela profissão do homem é rezar e amar

Prestai atenção, meus filhinhos: o tesouro do cristão não está na terra, mas nos céus. Por isso, o nosso pensamento deve estar voltado para onde está o nosso tesouro. Esta é a mais bela profissão do homem: rezar e amar. Se rezais e amais, eis aí a felicidade do homem sobre a terra.

A oração nada mais é do que a união com Deus. Quando alguém tem o coração puro e unido a Deus, sente em si mesmo uma suavidade e doçura que inebria, e uma luz maravilhosa que o envolve. Nesta íntima união, Deus e a alma são como dois pedaços de cera, fundidos num só, de tal modo que ninguém pode mais separar. Como é bela esta união de Deus com sua pequenina criatura! É uma felicidade impossível de se compreender. Nós nos havíamos tornado indignos de rezar. Deus, porém, na sua bondade, permitiu-nos falar com ele. Nossa oração é o incenso que mais lhe agrada. Contineu lendo…

Não preciso falar aqui da importânica de se cultivar as boas amizades para ser feliz. Milan Kundera diz que “toda amizade é uma aliança contra a adversidade, aliança sem a qual o ser humano ficaria desarmado contra seus inimigos. Os amigos recentes custam a perceber essa aliança, não valorizam ainda o que está sendo contraído. São amizades não testadas pelo tempo, não se sabe se enfrentarão com solidez as tempestades ou se serão varridos numa chuva de verão.”

A verdadeira amizade nos socorre quando menos esperamos! Podemos esquecer aquele com quem rimos muito, mas nunca nos esquecemos daqueles com quem choramos. Os corações que as tristezas unem permanecem unidos para sempre.

Na prosperidade os verdadeiros amigos esperam ser chamados; na adversidade, apresentam-se espontaneamente. A fortuna faz amigos. A desgraça prova se eles existem de fato. É preciso saber fazer e cultivar amizades. Isso depende de cada um de nós; antes de tudo, do nosso desprendimento e fidelidade ao outro.

Para conquistar um amigo é preciso criar um “deserto” dentro de si, aceitando que o outro venha ocupá-lo.

Acolher o amigo é, em primeiro lugar, ouvir. Alguns morrem sem nunca ter encontrado alguém que lhes tenha prestado a homenagem de calar-se totalmente para ouvi-los. São poucos os que sabem ouvir, porque poucos estão vazios de si mesmos, e o seu ”eu” faz muito barulho. Se você souber ouvir, muitos virão lhe fazer confidências.

Muitos se queixam da falta de amigos, mas poucos se preocupam em realizar em si as qualidades próprias para conquistar amigos e conservá-los.

Se você quiser ser agradável às pessoas, fale a elas daquilo que lhes interessa e não daquilo que interessa a você. A amizade é alimentada pelo diálogo; que é uma troca de ideias em busca da verdade. Muito diferente da discussão, que é uma luta entre dois, na qual cada um defende a sua opinião.

A verdadeira amizade não pode ser alimentada pela discussão, somente pelo diálogo.

Em vez de demonstrar exaustivamente que o amigo está errado, ajude-o a descobrir a verdade por si mesmo; isso é muito mais nobre e pedagógico.

Se você quiser agir sobre seu amigo, de verdade, para que ele mude, comece por amá-lo sincera e desinteressadamente.
A amizade também exige que se corrija o amigo que erra; mas devemos censurar os amigos na intimidade; e elogiá-los em público. Nada é tão nocivo a uma amizade como a crítica ao amigo na frente de outras pessoas; isso humilha e destrói a confiança. Nunca desista de ajudar o amigo a vencer uma batalha; não há nem haverá alguém que tenha caído tão baixo que esteja fora do alcance do amor infinito de Deus e do nosso socorro.

Uma amizade só é verdadeira e duradoura se é baseada na fidelidade. Cuidado, pois, para magoar alguém são necessários um inimigo e um amigo: o inimigo para caluniar e um “amigo” para transmitir a calúnia.

(Trecho extraído do livro “Para ser feliz”)

Foto

Felipe Aquino
felipeaquino@cancaonova.com

Prof. Felipe Aquino, casado, 5 filhos, doutor em Física pela UNESP. É membro do Conselho Diretor da Fundação João Paulo II. Participa de aprofundamentos no país e no exterior, escreveu mais de 60 livros e apresenta dois programas semanais na TV Canção Nova: “Escola da Fé” e “Trocando Idéias”. Saiba mais em Blog do Professor Felipe Site do autor: www.cleofas.com.br

Queridos irmãos e irmãs,

Hoje gostaria de dedicar um breve pensamento de coração sobre os extraordinários dias passados em Madri, na 26ª Jornada Mundial da Juventude. Vocês sabem, foi um evento eclesial emocionante; cerca de dois milhões de jovens de todos os continentes viveram, com alegria, uma formidável experiência de fraternidade, de encontro com o Senhor, de partilha e de crescimento na fé: uma verdadeira cascata de luz.

Agradeço a Deus por este dom precioso, que dá esperança para o futuro da Igreja: jovens com o firme e sincero desejo de enraizar suas vidas em Cristo, permanecer firmes na fé, caminhar juntos na Igreja.

Um obrigado a todos aqueles que trabalharam generosamente por esta Jornada: o Cardeal Arcebispo de Madri, seus Auxiliares, os outros bispos da Espanha e de outras partes do mundo, o Pontifício Conselho para os Leigos, sacerdotes, religiosos e religiosas, leigos… Renovo meu reconhecimento às Autoridades espanholas, às instituições e associações, aos voluntários e àqueles que oferecerem seu apoio na oração. Não posso esquecer a calorosa recepção que recebi de suas Majestades, os Reis da Espanha, como de todo o país.

Em poucas palavras naturalmente não posso descrever os momentos tão intensos que vivemos. Tenho em mente o entusiasmo irreprimível com o qual os jovens me receberam, no primeiro dia, na Praça de Cibeles, suas palavras cheias de expectativas, o forte desejo de se orientarem sobre a verdade mais profunda e de radicar-se nela, aquela verdade que Deus nos deu de conhecer em Cristo.

No imponente Monteiro de El Escorial, rico de história, espiritualidade e cultura, encontrei as jovens religiosas e os jovens docentes universitários. Primeiro, às jovens religiosas, recordei a beleza da vocação delas, vivida com fé, e a importância do serviço apostólico delas e seu testemunho profético. E permanece em mim a impressão do entusiasmo delas, de uma fé jovem, cheia de coragem em relação ao futuro, de vontade de servir assim a humanidade.

Aos professores recordei de ser verdadeiros formadores das novas gerações, guinado-se na busca da verdade não só com as palavras, mas também com a vida, cientes de que a verdade é o próprio Cristo. Encontrando Cristo, encontramos a verdade.

A noite, na celebração da Via Sacra, uma multidão variada de jovens reviveu com intensa participação as cenas da paixão e morte de Cristo: a cruz de Cristo dá muito mais do que o que é necessário, dá tudo, porque nos leva a Deus.

O dia seguinte, a Santa Missa na Catedral da Almudena, em Madri, com os seminaristas: os jovens que querem enraizar-se em Cristo para tornarem-se depois Seus ministros. Espero que cresçam as vocações ao sacerdócio!

Entre os presentes haviam alguns que tinham ouvido o chamado do Senhor justamente nas Jornadas da Juventude anteriores; estou certo que, também em Madri, o Senhor bateu às portas dos corações de muitos jovens para que o sigam com generosidade no ministério sacerdotal ou na vida religiosa.

A visita a um centro para jovens com diversas deficiências físicas me fez ver o grande respeito e amor que se nutre para cada pessoa e me deu a ocasião de agradecer aos milhares de voluntários que testemunham silenciosamente o Evangelho da caridade e da vida.

A Vigília de Oração, a noite, e a grande Celebração Eucarística conclusiva, no dia depois, foram dois momentos muito intensos: a noite uma multidão de jovens em festa, nada intimidados pela chuva e pelo vento, permaneceu em adoração silenciosa a Cristo presente na Eucaristia, para louvá-lo, agradecê-lo, pedir a ele ajuda e luz. E depois, no domingo, os jovens manifestaram a exuberância e a alegria de celebrar o Senhor na Palavra e na Eucaristia, para juntos sempre mais a Ele, reforçar sua fé e a vida cristã.

Num clima de entusiasmo encontrei os voluntários e os agradeci pela generosidade deles. E, na cerimônia de despedida, deixei o país levando no coração aqueles dias como um grande dom.

Queridos amigos, o encontro de Madri foi uma estupenda manifestação de fé para a Espanha e para o mundo antes de tudo. Para a multidão de jovens, provenientes de cada ângulo da Terra, foi uma ocasião especial para refletir, dialogar, trocar experiências positivas e, sobretudo, rezar junto e renovar o empenho de radicar a própria vida em Cristo, Amigo fiel.

Estou certo que eles retornaram a suas casas e retornam com o firme propósito de ser fermento na massa, levando a esperança que nasce da fé. Da minha parte, continuo a acompanhá-los com a oração, para que permaneçam fiéis aos empenhos assumidos. À materna intercessão de Maria, confio os frutos desta Jornada.

E agora quero anunciar os temas das próximas Jornadas Mundias da Juventude. Aquela do próximo ano, que se desenvolverá nas dioceses, terá como tema: “Alegrai-vos sempre no Senhor!”, da Carta aos Filipenses (4,4); enquanto na Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro, o tema será o mandamento de Jesus: “Ide e fazei discípulos todos os povo!” (cfr Mt 28,19). Desde já, confio às orações de todos para a preparação destes encontros muito importantes. Obrigado

O primeiro desafio é a linguagem, no sentido mais amplo da comunicação. Geralmente, a preparação de sacerdotes e religiosos, homens e mulheres, é dominada por categorias filosóficas e teológicas, resultando numa peculiar forma de pensamento e numa linguagem especifica, que configura uma comunicação inadequada ou limitada. Muitas vezes, os jovens não entendem esta linguagem. Eles têm outra linguagem, outros conceitos. Se não nos comunicarmos com os jovens na linguagem deles, não é possível de transmitir a fé.
Temos que ser capazes de compreender e falar a linguagem dos jovens para poder transmitir a fé, estar em contato, acolher os jovens onde estão. Habermas diz que a linguagem cria realidade. Através da realidade, criamos o mundo. Isso não acontece se não estivermos próximos deles.

A DIMENSÃO DO “EU”, DESAFIO DA COMUNIDADE ECLESIAL

Uma caracterização da modernidade é a nova consciência do papel ativo que a pessoa tem no mundo, tanto a nível social como individual. Esta conscientização afetou profundamente o sistema de valores individuais e sociais, indicando um processo de mudança. À privatização da vida, opomos nossa crença no valor da comunidade. Isso nos dá, por vezes, a sensação de andarmos contra a corrente. O mesmo vale com relação ao imediatismo É uma crise da religiosidade. Por isso, algumas considerações:

a) A crise religiosa se inscreve no marco de uma crise mais ampla
Podemos dizer que não é um caso particular de um fenômeno, mas algo mais amplo que se difundiu entre as pessoas a partir da segunda metade do século XX. Neste contexto coloca-se a crise da comunicação e do diálogo entre as gerações. Necessitamos, urgentemente, uma renovação geracional no clero. Há um superenvelhecimento do clero e das Congregações Religiosas. Muitos sacerdotes e religiosos, mesmo jovens, não querem trabalhar com a juventude.

Amplas zonas da vida humana que, antes, se percebiam fixos, agora aparecem como motivos de escolha. Isso afeta a religião. Além disso, a ordem social já não está tão evidente nem tão intocável. A fundamentalidade da religião para o funcionamento da sociedade não é mais tão evidente. É uma crise hierárquica das instituições. Já não existem funções estabelecidas. Tanto o individuo quanto a sociedade, devem enfrentar alternativas, obrigados a realizar escolhas. O mercado oferece aos jovens muitas possibilidades. Nós oferecemos outras; o neopentecostalismo outras; a política outras. Os jovens têm que decidir. A religião católica deixou de ser a religião hegemônica nas nossas sociedades. Muitos jovens se confessam cristãos, mas “à minha maneira”. “Deixem-me tranqüilo; sou cristão como quero, quando quero. Tenho filhos, educo os filhos como eu quero”

b) Dissociação entre socialização cultural e socialização religiosa
A socialização realizou-se eliminando a conexão estreita de interdependência entre sociedade-cultura e religião-igreja, de modo que o processo de socialização sucede à margem da religião e da influência da Igreja. As gerações jovens realizam o processo de se incorporar à sociedade e de se apropriar da cultura sem contacto algum com a religião. Ela não faz parte do conteúdo em que se socializam nem intervém no processo de socialização.

c) Crise da autoridade tradicional
A memória coletiva caiu em desuso e, com ela, seu caráter normativo para o presente. Essa memória era a base para a transmissão e celebração da fé. Com isso o imaginário coletivo comum das pessoas, em nossos países, tem sempre menos conteúdo religioso. Frente à autoridade da instituição, ergueu-se a autoridade da ilustração convidando o individuo a pensar por si mesmo. A ruptura da cultura tradicional, fortemente impregnada de religiosidade, levou ao desaparecimento da evidência de continuidade e à desplausibilidade da autoridade da tradição e da memória. Contudo, a perda da autoridade da memória deverá ser substituída por outra autoridade.

d) Configuração sem regras da própria crença
O quarto fator direcional foi a modernidade psicológica ou o movimento acerca do predomínio da autonomia do individuo, da importância da própria realização e do desenvolvimento pessoal, frente às pretensões das autoridades, princípios e instituições. “Se o mercado tem outras ofertas interessantes, aceito-as”. O mercado está veiculando um sem-numero de crenças e místicas orientais, oferecendo-os como produto de mercado. Os jovens entram, provam, tentam, como quem consome um prato de comida, uma roupa, uma distração. Este princípio desregula as crenças e práticas e configura o indivíduo como principal gestor de suas crenças, de modo que sua vida religiosa passa a caracterizar-se como algo nascido da livre escolha do sujeito que toma de diferentes tradições, mas não pertence a nenhuma delas.

A SECULARIZAÇÃO, DESAFIO DA INICIAÇÃO CRISTÃ

Muito foi dito sobre a secularização e sua implicância sobre uma nova ética secularizada, que reforça a idéia de progresso, a partir de onde haverá de partir o caminho que conduzirá à realização de uma humanidade melhor.

a) A antropologia secularizada
Esta é uma das maiores mudanças para a pastoral. Não se trata de que o homem viva e trabalhe em contextos ou ambientes amplamente secularizados, mas que pense e aceite sua existência em termos intramundanos, puramente históricos ou ateus. Não necessitamos mais da experiência e da existência de Deus para existir. Desde que começou a época moderna iniciou-se uma antropologia que nada tem a ver com a antropologia medieval precedente, que se caracterizava:

a) por uma visão verticalizada do ser humano, sempre orientada para o mais alto;
b) pela idéia de uma graça que projetava a existência terrena para a vida eterna;
c) pela verdade da fé, regra suprema da vida.

b) A religião neste mundo secularizado
Mudou a situação da religião. Parece que, definitivamente, terminou a época da religião do Estado. A religião pertence, juridicamente, ao terreno do privado. Esta privacidade se refere particularmente a três aspectos:

• Queda do poder político das igrejas.
• O privado como espaço de liberdade religiosa. Pela primeira vez na história da humanidade, o privado se subtraiu à invasão do poder político. E mais: o Estado o considera como um grande valor a defender.
• A propriedade privada articula todo o direito. Não se deve estanhar, por isso, que muitos cristãos hajam transferido esta apreciação e valorização do privado, também em sua relação com a Igreja institucional e seus ensinamentos no campo dogmático, moral ou social. Hoje, o vinculo social se encontra no “consenso”.

c) Permanência da religião na cultura secularizada
Este é o terceiro aspecto da mudança relacional entre Estado e Igreja: a religião já não constitui o vínculo social. A religião e os símbolos religiosos já não são o cimento da sociedade, nem a inspiração principal. Durante algum tempo via-se a secularização associada à tese da progressiva desaparição da religião da sociedade e da vida das pessoas. É a tese do positivismo, do marxismo, e da teologia da morte de Deus.

d) A questão do sagrado
1) Ocaso do sagrado x permanência do sagrado. Atualmente parece inegável que um amplo espaço do sacro e da sacralidade haja desaparecido definitivamente. Mas isto não quer dizer que a cultura moderna tenda a ser uma sociedade sem religião, tampouco que esta estaria prestes a desaparecer totalmente.

2) O sagrado como contracultura. As atuais formas do sagrado que emergem no âmbito do privado assumem, geralmente, a forma de uma contracultura, expressão de um profundo desgosto frente à exagerada racionalização da cultura moderna. Precisamente por este motivo, o sagrado se apresenta no contexto do irracional. Hervieu-Léger distingue quatro direções nas quais se expressam os novos movimentos religiosos:

 Evangelismo, fundamentalismo e neopentecostalismo no cristianismo;
 Crescente atração das religiões orientais;
 Uma miríade de grupos e movimento que perseguem a expansão do potencial humano (mistura de psicologia e elementos de misticismo oriental, mas interpretados de modo arbitrário);
 As seitas autoritárias em torno de lideres carismáticos com um poder quase ilimitado sobre seus seguidores.

3) Diferenciação entre sagrado, religião e fé cristã. O problema não é teórico nem engloba somente o significado destes termos, mas tem direta relação com a pastoral e a catequese. Tem que se distinguir duas rupturas que podem acontecer: uma, entre religião e pertença a uma igreja ou agrupamento religioso; outra, entre religião e fé crista.

d) Relação dos cristãos com o cristianismo
Sempre existiu certo pluralismo no cristianismo. Hoje, contudo, existe um pluralismo dentro do mundo cristão que é totalmente diferente do pluralismo tradicional de acentuações entre fé e vida cristã ou de espiritualidade.

1) Um cristianismo seletivo
Muitos cristãos selecionam partes da doutrina ou da moral, aceitando somente alguns aspectos e distanciando-se de outros. É uma espécie de supermercado cristão, onde cada um escolhe o menu.

2) A distância frente à moral oficial
Em geral se aceita, e até se deseja, que a Igreja intervenha no mundo da moral social e internacional. O problema se coloca quando toca a moral individual e, mais concretamente, a moral sexual.

3) Abandono da Missa e dos sacramentos. Há poucos anos atrás se considerava a freqüente participação na missa e a prática da confissão e da comunhão, bem como a substancial observação da moral, um critério primário da pertença à igreja. Hoje não é mais assim. As pessoas, mesmo que “não pratiquem”, continuam considerando-se e se professando cristãos. Não se pode dizer que não sejam cristãos. O problema é até quando eles poderão conservar a fé. Lamentavelmente, para muitos deles é já o primeiro passo decisivo no caminho da descristianização.

O mundo globalizado e neoliberal influi no modo de ser, pensar e se comportar dos jovens na sociedade. Cada sociedade constitui o jovem à sua própria imagem. Aprofundar o contexto da atual cultura Pós-Moderna em que os jovens se encontram é uma tarefa que permite verificar, identificar e entender como essa realidade interfere no momento em que os jovens estão vivendo, além de permitir visualizar as crises e opções que os inquietam e provocam.
A globalização é um fator que não pode ficar fora dessa consideração, pois a juventude, em seu tempo de construção de referenciais, está mais aberta às propostas de visualização e acesso a um mundo mais amplo, sem fronteiras. Os símbolos apresentados pela expansão global se tornam facilmente assimiláveis pela juventude. O desafio é entender como a cultura deste momento de evolução tecnológica atua nas expressões juvenis? Quais são os seus conteúdos? Como esta categoria é visualizada pela sociedade, na comunicação etc.
Uma questão que se apresenta é a de diferenciar o que é próprio deste período etário juvenil e o que é fruto da atual sociedade. Especula-se que a juventude é uma presa fácil do mundo Pós-Moderno, e que estaria mais vulnerável às conseqüências destas transformações. O desafio é entender a cultura dentro deste momento de evolução tecnológica em que tudo tem um conteúdo visual e sonoro e que trafega por veículos e meios rápidos e que se tornam globais, impondo um mesmo padrão cultural e uma mesma matriz a todos.

• A comunicação atual e seus efeitos sobre a juventude
O mundo atual é o tempo da comunicação e da informação. A realidade se apresenta como a era da informática, da civilização eletrônica, da imagem, do mundo da comunicação por vias virtuais. Essa nova era leva a juventude a construir seu imaginário dentro da cultura da imagem. Essas imagens são firmadas através de ícones e símbolos que se tornam mais expressivos a cada descoberta feita e desejada.
Esse padrão de consumo apresentado pela comunicação tem influência direta sobre a vida de todos, sobretudo da juventude. Os novos símbolos interferem na realidade em que os jovens se organizam e agem. As realidades, além de mais complexas, estão justapostas entre os fatos, as notícias, as particularidades e a fragmentação da sociedade. O mundo global coloca, através da Internet e suas redes de comunicação, uma infinidade de misturas de culturas, linguagens, códigos de comunicações e relações.
O mundo Pós-Moderno atua na cultura inculcando nos indivíduos que o importante para a comunicação é a pessoa se preocupar com sua imagem, aparecer e estar permanentemente preocupada com a sua autoconstrução. Esse modo de pensar e agir estão organizados e pensados para o individuo e, em especial, para o mundo juvenil. A mesma cultura de massa e de tecnologia não consegue garantir a todos o acesso ao saber, à cultura, ao lazer e ao desporto, pois a influência neoliberal prega um Estado mínimo, controlado pelo mercado. Sem contar que nesta mesma perspectiva a influência neoliberal prega um Estado mínimo que faz com que este se ausente de seu papel de garantir os direitos básicos da população no que se refere aos serviços de segurança, saúde, transporte, lazer, educação, apresentando-se cada vez mais precários, insuficientes e mal distribuídos.
Os jovens de hoje nascem na cultura da imagem e do desaparecimento da palavra. O mundo da Pós-Modernidade se baseia na especialização progressiva, do conhecimento da subjetividade. Criam-se novos padrões de transformação social, aparecem novas agências de publicidade, produzindo uma nova religião, pronta para impor um sentir e um desejar. Essa nova contextualização impõe aos jovens novos padrões de consumo, de maneiras de se perceber e desejar.
Seriam, então, os jovens o objeto direto do desejo do mercado em busca de consumidores? É preciso lembrar que os seres humanos têm necessidades e desejos naturais referentes a objetos que lhes são exteriores: alimento, bebida, habitação e, acima de tudo, a conservação do corpo. O desejo do homem é ser reconhecido, como um ser com certo valor e dignidade. A sociedade representa o que alguns pensadores já disseram: “Penso, logo existo” (Descarte), “Desejo, logo existo” (Freud), “Consumo, logo existo” (neoliberalismo).
Essa lógica reinante abre caminho para os meios de comunicação serem os agentes socializadores da juventude. Os meios de comunicação atuam de forma pedagógica. Utilizam-se, principalmente, da publicidade. A mídia moderna exerce uma função pedagógica de socializar indivíduos e transmitir-lhes códigos. A juventude se encanta e deseja essa comunicação veloz, desafiadora. A juventude se identifica com esse modelo de comunicação, pois foi educada por ela. Hoje, as crianças já nascem atraídas pela propaganda. Essa propaganda é subliminar e não visa convencer, mas seduzir. Apela para o inconsciente. Quer criar felicidade e hábitos de fidelidade forjando empatia, criando e comandando o desejo, o gosto. Atua com modelos de imitação. Utiliza-se do bom humor para ficar na memória. Fustiga o desejo e o olhar e causa uma insaciabilidade.
Os jovens têm, no seu horizonte, o desafio da busca do que lhe é desconhecido e ausente e a possibilidade do consumo se torna, para ele, uma janela de oportunidade. O consumo nunca descansa. Sempre surgem novos objetos desejáveis. A juventude se constituiu em um dos grupos que mais se sentem aguçados com a espera dos lançamentos do cinema, da TV, da informática. Os jovens acreditam e esperam, porque se identificam, reconhecem-se nela e no desejo que a propaganda cria.
Esse modelo de comunicação confunde os jovens, não lhes possibilitando diferenciar o que vem a ser desejo e o que são necessidades humanas. A mídia, aliada do mercado de consumo, desperta uma insatisfação que leva à exploração da vontade interna de ter o que o outro tem. Estimula a imitação de tudo que o outro possui. Causa o desejo mimético de ser o outro. Há quem diga que a comunicação educa para a mentalidade afirmativa – poder – superioridade; “eu narciso” num constante desejo de autoconstrução. Toda a sociedade e, em especial, os jovens, recebem a mensagem de que cada um dos seus membros tem a responsabilidade de se preocupar consigo mesmo (autocentramento).
A juventude inculca em seu sistema de compreensão e interação com o mundo um conjunto de satisfações pessoais. Quando não o consegue, experimenta uma insegurança generalizada. Para prevenir e impedir essa insegurança, a sociedade provoca um deslocamento da confiança nas relações de proximidade e intimidade para a relação técnica. Como resultado, há juventudes menos conceituais, analíticas e organizadas.
A cultura Pós-Moderna forja uma propaganda para que o indivíduo consuma o máximo possível. Nem todos os jovens, no entanto, conseguem ter acesso e condição de consumo como o mercado deseja. Cria-se, assim, nos jovens, uma ilusão de que tudo está à disposição de todos. Porém, pouquíssimos são aqueles que podem consumir tudo que ela propõe. A cultura midiática vende o que a sociedade está disposta a aceitar. É por essas razões que a juventude não pode ser deixada de lado na análise da comunicação, pois, por sua própria natureza, ela busca a curiosidade como elemento para se construir e se identificar socialmente.

• A cultura refletida sobre o corpo da juventude
Na temática da cultura Pós-Moderna o corpo ganha lugar de destaque, pois é por natureza um instrumento de comunicação. A etapa da juventude é um momento em que o corpo está cheio de vigor com capacidade de se expressar socioculturalmente. Sobre o corpo recai uma mensagem de interlocução constante, tornando-se um instrumento de comunicação visual. O tempo da juventude é entendido como potencialidades. Este tempo reflete diretamente no corpo dos jovens. Com isso as pessoas adultas querem ter a vitalidade da juventude, desejam energia. Essa concepção de corpo juvenil está ligada à visão mecanicista de utilidade e capacidade. Ninguém quer ser velho ou incapaz. Hoje, tudo passa pela experiência, pela vivência dos sentidos e dos órgãos do corpo.
Há diversos cenários para envolver a juventude no que se refere ao corpo. A sociedade moderna atua com a expectativa do estético. Investe no gosto da juventude, cria uma roupagem de modernidade e atua com propostas para esse corpo esteja em evidência. No campo afetivo, a paquera, o “ficar” e as relações acabam sendo temporárias e sem compromissos. São indicações de que as relações são articuladas na base do sentimento. Os modos e os meios de produção geram sujeitos carentes e sem compreensão de sexualidade e afetividade. São aspectos reforçados pela cultura e pelas relações sociais. A psicologia evolutiva produz cultura, ritmos, espaços e símbolos da indústria cultural adultocêntrica. O corpo é máquina – horizonte do desejo da construção da identidade. O corpo juvenil é o que marca o tempo para satisfação dos desejos e das possibilidades do imaginário.
Os padrões de beleza masculinos e femininos têm influência sobre os jovens submetendo-se às filosofias estéticas que não condizem, em sua maioria, com a cultura a que pertencem. Poucas têm sido as oportunidades para que os jovens e as jovens tenham seus corpos como instrumento político para manifestarem sua insatisfação com as estruturas. O corpo não pode ser reduzido ao horizonte do objeto do prazer e do disciplinamento de atitudes. Quando o prazer se torna um horizonte a ser conquistado pelos jovens e a sociedade moderna e pós-moderna impõe a forma de alcançá-los, provoca uma confusão na visão da juventude, fazendo crer que o gozo eterno não se encontra no cotidiano das relações, das descobertas, dos namoros ou dos afetos.

• O imediatismo nas socializações dos jovens e seus grupos
Quando se fala em juventude como um período cheio de mudanças e decisões, é preciso entendê-la como um fenômeno social de uma determinada geração, que representa um tipo particular de identidade que está se construindo dentro do processo social ao qual ela pertence historicamente. Entender essa questão possibilita verificar se a juventude é realmente imediatista. Pois pode ser que essa inconstância ou pouca temporalidade seja resultado do contexto pós-moderno em que vive a sociedade e, assim, não seria uma só uma questão dos jovens mas de todas as pessoas.
O pensamento de Fukuyama, afirma que esse mecanismo da provisoriedade e imediatismo, teria levado a humanidade ao “fim da história”. Com esse tipo de pensamento nasce na sociedade a idéia de que tudo é permitido. O que importa é viver aqui e agora. A sociedade, segundo ele,passaria sob duas lógicas: a lógica da ciência moderna que apresenta possibilidades e amplo horizonte de desejo, que atrai, cativa. Oferta-se a possibilidade de que todos podem buscar tudo que for sonhado. A outra lógica é a da luta por reconhecimento, que, segundo Fukuyama, é o motor atual que move a história. Na visão do autor é a lógica de reconhecimento que provoca no homem sentimentos de emoção, ira, desejo, orgulho, vergonha e auto-estima. Essas questões fazem com que as pessoas busquem agregar valor a tudo, razão e motivo de lutar para conquistar seus desejos, custe o que custar.
Esse desejo de reconhecimento é um elemento do neoliberalismo. Tornou-se o motor da história e interfere na cultura, na religião, no trabalho, no nacionalismo e nas guerras. Esse tipo de lógica produz um lixo cultural, ofertado durante 24 horas por dia, para a juventude consumir e assimilar. Essa realidade de descarte e de fragmentação leva os jovens ao desencantamento com o mundo e gera uma devastação do espírito e de valores permanentes no momento em que sua identidade está se firmando.
Vive-se um horizonte em que a aprendizagem passa pela revista ilustrada, pela propaganda, pelo slogan, pela insistência da iconografia da moda e pela cultura televisiva. Tudo passa pela experiência e pela vivência dos sentidos e dos órgãos do corpo. Os jovens, tempos atrás, diante de uma proposta, diziam “deixa-me pensar e depois decido”. Agora, diante das propostas dizem “deixa-me experimentar pra ver se vale a pena”. Experimentar indica ação, experiência, algo vivencial.
Há que ser lembrado que é próprio da juventude o tempo da experimentação; só mais tarde vem a fase projetiva. Os teóricos da psicologia dizem que a etapa da juventude seria o tempo da moratória. Acontece que a cultura pós-moderna, neoliberal e globalizada provoca uma fragmentação, a provisoriedade ou o tempo da “experimentação”. Existe uma dificuldade das pessoas em se comprometerem com experiências, nas decisões, opção de vida e na entrega total. Os jovens processam essas velocidades da Pós-Modernidade e sua fragmentação. Sabem que nem todos têm acesso a essas mudanças. Eles são forçados a diferenciar constantemente o que é real, mágico, fantasioso.
Além dos dados característicos, apresentados num contexto de Pós-Modernidade, diversos estudos do mundo urbano globalizado coincidem ao reconhecer traços comuns da cultura juvenil contemporânea. Esquematicamente, alguns aspectos dessa cultura, numa ótica mais psicológica, podem ser elencados da seguinte forma:
• Centralidade das emoções e relativização dos valores e das tradições. Funcionam escolhas de experiências sem critérios absolutos. Valoriza-se mais o flexível, o momentâneo; anseia-se gozar o momento presente, com poucas perspectivas para o futuro. Tem-se dificuldades com o silêncio interior.
• Uma geração de pouca leitura, de debilidade intelectual, uma geração de imagem, acostumada a estímulos constantes para manter sua atenção. Uma geração “zapping” com controle remoto na mão, mudando de canal em canal para encontrar novos estímulos.
• A não-crença em compromisso definitivo, nem na vida religiosa, nem na vida matrimonial. Tudo isso afasta e amedronta.
• Opção por relações interpessoais e horizontais. Preferência por relações democráticas, de tolerância horizontal e aberta. Os grupos de amigos são mais valorizados do que as relações familiares. Há uma rebeldia diante de instituições consideradas retrógradas e uma impaciência com autoridades despóticas. Percebe-se, também, o sentimento de pertença nas motivações e experiências horizontais e democráticas, menos segregação racial e situações preconceituosas e maior tolerância e sensibilidade a múltiplas formas de vida.
• Fragmentação da identidade, isto é, maior confusão quanto à imagem de si mesmo. Os jovens buscam o anonimato e se distanciam de relações estáveis.
• Maior entrosamento entre os gêneros masculino e feminino. Encontram-se homens que vivenciam harmoniosamente traços da feminilidade e mulheres que entram no mercado da força de trabalho em crescente igualdade de condições. Por isso, maior aceitação do homossexualismo e do modelo unissex de vestuário.
• Enfoque da subjetividade. O jovem da Pós-Modernidade está centrado, quase unicamente, nos seus problemas e necessidades pessoais.
• Desinteresse pela macro-política e pelas grandes estruturas. Há uma maior inclinação diante das pequenas transformações de ideais culturais do que de grandes obras ou revoluções. Individualista (e não solidária), conservadora (e não progressista), alienada (e não engajada), apática (e não participativa).
• Preferência pelo sincretismo religioso e pelas formas religiosas ecumênicas. Significa maior liberdade de expressão e dificuldade em viver vinculado a valores institucionais, a uma estrutura de paróquia e à figura de autoridade. Há uma volta ao sagrado, mas um sagrado mais privado, mais light, menos exigente.
• Tendência ao hedonismo e vulnerabilidade psicológica. Significa dificuldade de elaboração de momentos de frustração, do tempo de espera, das angústias, e opção preferencial pelo prazer e pela felicidade, entretenimento e consumo imediato. Não se questiona a sociedade de consumo. Frente aos desafios e obstáculos que a vida coloca no caminho, a tendência é desistir. Busca-se imperativamente a felicidade. “Um sujeito solto, sem rumo, arrastado pelos neurolépticos, pelo consumo metonímico, pela imagem narcisista, pelo massacre da mídia, pela velocidade do tempo urbano e pela religião espetáculo…” (Pereira, 2004).
• Papel dos adultos. Para Maria Rita Kehl, a vaga do adulto, em nossa cultura, está desocupada. (“Juventude e Sociedade do Projeto Juventude” – Instituto Cidadania. Organizado por Regina Novaes e Paulo Vannuchi). Outros teóricos dizem que a cadeira está ocupada por um adulto diferente, ainda não decifrado.
• Ausência dos pais. Os jovens externam a percepção de que os pais estão ausentes e alguns já sinalizam que as coisas poderiam melhorar na estrutura familiar, porque os papéis não estão sendo devidamente assumidos ou a liberdade anda excessiva, ou o tempo de convivência está ficando cada vez mais restrito.
Este perfil da juventude contemporânea pode aparecer muito negativo. Porém, não estamos falando de toda a juventude. Há jovens que são diferentes do retrato descrito. Estamos falando das grandes tendências. Não podemos cair na tentação de nostalgia, de que as gerações anteriores eram melhores. Cada geração tem suas luzes e sombras. Esta geração não é pior ou melhor do que outras gerações. É diferente. E o processo de evangelização, a metodologia, os enfoques, o ponto de partida e o sistema de acompanhamento têm que levar isso em conta para não ficar encalhado na estrada de uma história que não espera. Assessores que trabalham com a juventude contemporânea dão testemunho que a juventude de hoje é tão idealista e generosa como antes. Basta saber trabalhar com ela. A questão é a metodologia de trabalho e a paciência para acompanhar os processos de educação na fé. O processo leva mais tempo e exige um investimento maior.