Pe. Joãozinho, scj[1]
Durante o 12º Congresso Mariológico, em Aparecida, em 2018, tive a oportunidade de apresentar ao povo um livro publicado por um irmão redentorista. Falei da capa, do título e do conteúdo. Achei a temática muito interessante por ser um resgate fiel dos fatos que deram origem ao Santuário Nacional que acolhe milhões de peregrinos todos os anos. Gostei daquilo que li. Era uma pesquisa séria e um texto bem escrito. Mas confesso que era letra morta. O livro não tinha vida. De repente em um recorte de tempo que apareceu durante o Congresso tive o impulso de chamar o Ir. José Mauro Maciel, para ele mesmo falar de sua obra. Misturando amor com humor, saber com sabor, o escriba deu vida ao livro. Em menos de 10 minutos ele mostrou que sabia seu livro de cor (que vem do latim: de coração). Falou os pontos essenciais com fluência e simplicidade. Ele enfrentou a complexidade do tema em horas de pesquisa silenciosa e, por isso, tinha habilidade de falar de modo simples. Se escritor é isso. É viver no silêncio contemplativo da pesquisa dias, meses e até anos. A gestação de um livro dura bem mais que nove meses. Por isso todo livro é um filho e o parto é mais que dolorido. Escrever dói! O autor não vê seu livro como um produto ou como um impresso qualquer. É um membro de seu corpo. Tem alma e personalidade. É único. É o retrato eternizado de uma parte do seu ser.
Mas nem tudo são flores e amores na vida do escritor. Quando escrevi meu primeiro livro, ainda na mais tenra juventude, o saudoso Pe. Galache, jesuíta diretor da Loyola, insistiu diversas vezes com aquele vigor típico de espanhol para que eu lhe entregasse os originais para a publicação. Da minha parte sempre pedia mais um tempo pois achava que havia algo para melhorar. Depois fui perceber que todo escritor é assim. Seguramos o livro até que nos arrancam a criança dos braços. E assim fez o Pe. Galache dizendo: “Meu jovem, marque o que vou dizer… nenhum autor entrega seu livro para a editora. Todos se livram de um problema que têm em casa”. No meu ingênuo idealismo juvenil achei aquilo vigoroso demais. Hoje vejo que é um fato. Os editores “ajudam” os escritores. Eles nos livram de ideias mirabolantes e completamente fora do interesse do público. O livro é escrito para ser lido e não apenas como um desejo de exprimir algo.
A vida me levou intensamente para o lado das letras. Já são mais de cinquenta livros nestes quase trinta anos dedicados à escrever. Além disso, tenho minha obras secretas… duas teses de doutorado ainda não publicadas. Sempre acho que ninguém irá ler. De fato a primeira tese foi publicada como uma espécie de reconhecimento da editora por meus outros livros populares mais vendidos. Esse “livro científico” ficou na prateleira. Mas tenho imenso orgulho quando tomo nas mãos meu livro “Teologia da Solidariedade”. Um dia alguém descobrirá intuições interessantes ali.
Recentemente descobri a vocação de tradutor. Tive oportunidade de traduzir o livro do papa Francisco “Deus é Jovem”. Alguém poderia imaginar que esse é um trabalho mecânico e sem graça. Nada disso. Após a tradução literal vem o trabalho de fazer a versão. Isso significa dar o tom, o sotaque, a fluência portenha para o livro. É como se fosse uma música. Não basta traduzir a letra e ser rigorosamente fiel ao sentido. É preciso grudar as palavras na melodia. Uma pessoa comentou comigo ao ler o livro de Francisco que traduzi: “Parece que a gente escuta o papa falar”. Pensei: essa pessoa nem imagina o trabalho que deu para me esconder nas palavras e evidenciar o jeito do autor. Não tenho pudor de autografar a tradução quando me trazem. Traduzir é de certa-forma ser co-autor.
Escrever tem sua sacramentalidade pois o Verbo se fez carne e habitou no meio de nós, armou entre nós sua tenda na no livro que chamamos de Bíblia (cf. Jo 1,14). Aliás, voltando ao começo deste escrito, a Bíblia é mais que um livro: É UMA PESSOA.
[1] João Carlos Almeida, nasceu em Brusque-SC (10.05.1964) e é sacerdote religioso da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus (Dehonianos). Tem cerca de 50 livros publicados por diversas editoras e mais de dois milhões de exemplares vendidos. Doutor em Teologia pela Pontifícia Faculdade N. Sra da Assunção (SP), em Educação pela USP e em Espiritualidade pela Gregoriana (Roma), atualmente é professor de Teologia da Faculdade Dehoniana, em Taubaté-SP.
Pe. Joãozinho, scj
O tempo é um dom de Deus. É um “presente”. O passado repousa nas memórias. O futuro não nos pertence. A única coisa que temos é este tempo de agora. Jesus aconselhou a “não se preocupar com o dia de amanhã”. Para isso é preciso preparar bem para não ser surpreendido pelo inesperado que poderia muito bem ser previsto. Para não se preocupar: PREPARE! Isso significa exercitar a administração espiritual do tempo. Ao longo dos últimos dez anos tenho exercitado essa arte de estudar cuidadosamente a geografia do tempo. Sim. Os momentos não são todos iguais. Existem uma sucessão mecânica e monótona de minutos, horas, dias, semanas, meses… Mas o tempo é mais do que esse “Cronos”. Existe o “tempo-kairós”. A intensidade não é sempre a mesma. E não estou falando da percepção subjetiva do tempo que faz uma espera na antessala do dentista durar uma eternidade quando estamos com dor de dente… e faz as quatro horas com a pessoa amada passe em alguns “minutos”. Isso é bem verdade. Cada um tem sua percepção do tempo. Mas existe também um mapa objetivo e universal que muda a cada ano o kairós das semanas. Antes de marcar algum evento ou compromisso consulte o mapa do tempo. Normalmente faço isso dois anos antes. Veja, por exemplo, com a ajuda desse site como será o movimento temporal em 2020.
Descobri, por exemplo, com muita antecedência que esse ano meu aniversário cairia no mesmo dia da semana que em 1964, quando eu nasci: segundo domingo de maio: DIA DAS MÃES. Com isso pude estar preparado para celebrar meu aniversário em sintonia com minha mãe.
Existem datas móveis no primeiro semestre. Em 2020 o carnaval foi no dia 25 de fevereiro. Isso acontece porque a data da Páscoa segue a tradição judaica de calcular a partir do calendário lunar. A Páscoa foi no dia 12 de abril. Poucos dias depois tivemos o feriado de Tiradentes, no dia 21 de abril que caiu em uma terça-feira. Quem trabalha com agenda ficou atento ao final de semana de 18-19 de abril, pois tinha tudo para ser umas “pequenas férias” em que todos iriam para praia ou campo e não seria um bom tempo para marcar aquela “assembleia” ou “reunião”. Quem não prepara o tempo acaba caindo nessas armadilhas previsíveis.Apesar de que sempre existem fatores imprevisíveis, como é o caso da pandemia do Coronavírus que subverteu completamente a nossa percepção de tempo por causa do isolamento social. Quem poderia imaginar que o Brasil iria parar a partir da segunda quinzena de março e a segunda-feira iria se parecer tanto com o domingo?
Esperamos que o segundo semestre seja um tempo mais “normal”, sem as previsíveis variações lunares que tumultuam o calendário do primeiro semestre. Mas ainda assim os arquitetos de agenda precisam estudar para não naufragarem no tsunami das semanas. Vejamos o que pode nos aguardar.
Estudar o tempo não é perda de tempo. Vamos voltar para 2018. Depois de um agosto bem normal os meses de setembro, outubro e novembro estavam repletos de feriados. Isso pode implodir qualquer programação. Veja só: o dia 07 de setembro caiu em uma sexta-feira. O dia 12 de outubro também. Finados no dia 02 de novembro também caiu na sexta. Proclamação da República, no dia 15 de novembro caiu na quinta… emenda a sexta: eram quatro dias a menos em seu cronograma. E não se foi necessário riscar o dia 07 de outubro… Eleições… um domingo que não é bom para nenhum evento. E foi necessário ficar atento com o dia 28 de outubro pois estava previsto para o segundo turno das eleições. E foi!
Passemos para 2019. Quem gosta de feriados não ficou satisfeito ao estudar o segundo semestre daquele ano. O dia 07 de setembro caiu no sábado, Aparecida (12.10) também… finados (02.11) também… Proclamação da República (15.11) caiu na sexta-feira. Mas isso não foi motivo para estresse… no Natal, o dia 24 de dezembro caiu em uma terça-feira. Os “tempólogos” se prepararam para tirar umas “pequenas férias” a partir do dia 21 e prolongar até o dia 25. É claro que alguns espertinhos aproveitaram para propor aos seus funcionários “férias coletivas… pois o dia 26 caiu em uma quinta… 27.12 já é sexta e o ano acabou por aí, pois o dia 30 caiu em uma segunda e o ano terminou em terça-feira. Ninguém trabalhou no dia 1º de janeiro de 2020, quarta-feira. Por isso, esse ano começou mesmo na segunda-feira dia 06.01.2020, dia de Santos Reis. Percebeu? Pouca coisa de útil acontecerá entre 21.12.2019 e 05.01.2020. São 15 dias de férias. Quem estudou o tempo estava preparado para viver este período com qualidade.Quem tirou férias nesse período e ficou frustrado por perceber, depois, que mesmo que não estava de férias não trabalhou. Viu? Ao menos por isso vale a pena estudar o mapa do tempo.
O tempo é um “presente” de Deus. Recebemos cada minuto como um dom. Cuidar bem do tempo que temos é uma forma de louvar ao Senhor do Tempo.
(Sermo 83,4-6: Opera omnia, Edit. Cisterc. 2[1958], 300-302)
Amo porque amo, amo para amar
O amor basta-se a si mesmo, em si e por sua causa encontra satisfação. É seu mérito, seu próprio prêmio. Além de si mesmo, o amor não exige motivo nem fruto. Seu fruto é o próprio ato de amar. Amo porque amo, amo para amar. Grande coisa é o amor, contanto que vá a seu princípio, volte à sua origem, mergulhe em sua fonte, sempre beba donde corre sem cessar. De todos os movimentos da alma, sentidos e afeições, o amor é o único com que pode a criatura, embora não condignamente, responder ao Criador e, por sua vez, dar-lhe outro tanto. Pois quando Deus ama não quer outra coisa senão ser amado, já que ama para ser amado; porque bem sabe que serão felizes pelo amor aqueles que o amarem.
O amor do Esposo, ou melhor, o Esposo-Amor somente procura a resposta do amor e a fidelidade. Seja permitido à amada corresponder ao amor! Por que a esposa e esposa do Amor não deveria amar? Por que não seria amado o Amor? É justo que, renunciando a todos os outros sentimentos, única e totalmente se entregue ao amor, aquela que há de corresponder a ele, pagando amor com amor. Pois mesmo que se esgote toda no amor, que é isto diante da perene corrente do amor do outro? Certamente não corre com igual abundância o caudal do amante e do Amor, da alma e do Verbo, da esposa e do Esposo, do Criador e da criatura; há entre eles a mesma diferença que entre o sedento e a fonte.
E então? Desaparecerá por isto e se esvaziará de todo a promessa da desposada, o desejo que suspira, o ardor da que a ama, a confiança da que ousa, já que não pode de igual para igual correr com o gigante, rivalizar a doçura com o mel, a brandura com o cordeiro, a alvura com o lírio, a claridade com o sol, a caridade com aquele que é a caridade? Não. Mesmo amando menos, por ser menor, se a criatura amar com tudo o que é, haverá de dar tudo. Por esta razão, amar assim é unir-se em matrimônio, porque não pode amar deste modo e ser menos amada, de sorte que no consenso dos dois haja íntegro e perfeito casamento. A não ser que alguém duvide ser amado primeiro e muito mais pelo Verbo.
Pe. Joãozinho, scj
Teólogo e Comunicador
Neste artigo gostaria de refletir sobre este binômio que ocupa diariamente os debates entre os músicos católicos: Ministério & profissão. Começo pelos termos para entendermos bem do que estamos falando.
Ministério
Pode-se utilizar o termo “ministério” para o serviço da música em nossas liturgias e eventos de evangelização? A questão não é muito simples. Em 1999 a CNBB publicou o Documento 62 sobre a “Missão e Ministério dos Cristãos Leigos e Leigas”.
O texto demorou a ser aprovado exatamente por debates sobre se seria próprio ou não utilizar a terminologia “ministério” para as tarefas eclesiais desempenhadas por leigos que, por definição, vivem suma missão própria no mundo e não necessariamente ao interno da Igreja. Mas estas definições eclesiológicas estavam em crise e já não se sustentavam. O Papa João Paulo II, então, encomendou um estudo específico sobre este tema à Congregação para a Doutrina da Fé, presidida pelo então Cardeal Joseph Ratzinger. O resultado foi um sólido estudo que ficou conhecido como “Instrução acerca de algumas questões sobre a colaboração dos fiéis leigos no sagrado ministério dos sacerdotes” (1997). Logo no início a instrução coloca com clareza teológica a diferença entre o ministério ordenado dos sacerdotes e os ministério confiados aos leigos mediante o sacerdócio comum recebido no batismo: “Tanto o sacerdócio comum dos fiéis como o sacerdócio ministerial ou hierárquico ‘ordenam-se um ao outro, embora se diferenciem na essência e não apenas em grau, pois ambos participam, cada qual a seu modo, do único sacerdócio de Cristo’. Entre eles dá-se uma eficaz unidade, porque o Espírito Santo unifica a Igreja na comunhão e no serviço e a provê de diversos dons hierárquicos e carismáticos”.
A partir destas ponderadas reflexões pode-se utilizar com segurança a expressão Ministério de Música. Naturalmente não é a pessoa que se auto-institui ministro. É um chamado de Deus que, para esta missão, dá o seu “carisma”. Quem recebe o chamado é acolhido na Igreja que o ajuda a discernir esta vocação e missão e, de alguma forma, o autoriza ao exercício do seu ministério da comunidade. Esta é a dimensão eclesial do ministério. Jamais pode ser discernido e vivido de maneira totalmente pessoal e desvinculada da comunidade. Ministros precisam deixar claro o seu elo de “agregação” à comunidade. Não existe cristão sem comunidade. Isto vale para um Ministro Extraordinário da Sagrada Comunhão ou para alguém que receba o carisma extraordinário de rezar pela cura e torna-se um “ministro de cura e libertação”. Em algum momento seu ministério deve ser explicitamente autorizado pela comunidade. A ministerialidade espontânea e informal se presta a uma série de desvios. Um pregador que vai a outra diocese deve ter o mandato do seu bispo ou pároco. Não deveria ser diferente com os ministros de música que andam pelo Brasil. A este propósito o nº 85 do Documento 62 da CNBB é bastante claro: “Só pode ser considerado ministério o carisma que, na comunidade e em vista da missão da Igreja e no mundo, assume a forma de serviço bem determinado, envolvendo um conjunto maios ou menos amplo de funções, que responda a exigências permanentes da comunidade e da missão, seja assumido com estabilidade, comporte verdadeira responsabilidade e seja acolhido e reconhecido na comunidade eclesial”.
É essencial que o ministério seja recebido e reconhecido pela comunidade eclesial, pois representa uma atuação pública e oficial. O ministro é portador da palavra da Igreja e não fala somente em nome próprio. Existem, porém, diversas modalidade e graus de ministérios. Existem os “reconhecidos”, os “confiados”, os “instituídos” e os “ordenados”. Do meu ponto de vista o Ministério de Música é simplesmente “reconhecido”. Leitor e acólito são ministérios instituídos. Mas nem tudo pode-se chamar de ministério. Alguém que atue na vida política não poderia se chamar “ministro”. Este seria mais propriamente um “serviço”. O mesmo se aplica às demais profissões. Não falamos de ministro do direito ou da padaria. O ministério se aplica mais propriamente a um serviço intra-eclesial.
Profissão
Aqui vem a segunda parte de nossa reflexão. Uma parcela importante de músicos católicos no Brasil se profissionalizou nestes últimos anos. A Igreja como um todo também se profissionalizou. Não se admite hoje, por exemplo, uma secretária paroquial voluntária. Nem se imagina um sacristão de final de semana. Uma paróquia tem seus colaboradores com salário, carteira assinada e todos os direitos previstos em lei. Este avanço organizacional, porém, na maioria dos casos, não chegou aos músicos (nem aos teólogos e teólogas que se formam todos os anos em bons cursos de teologia e normalmente não encontram espaço de trabalho dentro das paróquias… mas este é outro assunto). É raro uma paróquia que tenha um músico contratado para exercer profissionalmente o ministério de música. As que tiveram esta ousadia estão muito satisfeitas com o resultado. Estas palavras podem chocar alguns. Mas estou profundamente convencido de que a música exige uma série de saberes e competências. Isto significa ser profissional. Ter uma profissão é ser dotado de habilidades certificadas pela categoria. No caso da música existe uma Ordem dos Músicos do Brasil. Para exercer esta profissão regularmente via de regra se exigiria um teste para receber a carteira da OMB e pagar a anuidade.
Existe um grande grupo de músicos católicos que já não são apenas voluntários amadores que tocam na missa das 10h. São profissionais que esperam viver deste trabalho. São competentes. Têm uma história dedicada à música e são reconhecidos no meio. Raramente, porém, encontram a porta aberta de uma paróquia. Então acontece uma ruptura lamentável entre ministério e profissão. Estes músicos, não reconhecidos, abandonam a ministerialidade e aventuram-se em pregar a fé cantada em shows de evangelização por todo o Brasil. Organizam seus próprios escritórios de promoção. Têm um site, CDs, material promocional. Isto envolve custos e nem sempre todos conseguem se sustentar. Acompanho o drama de muitos músicos pais e mães de família que precisam ter ao menos quatro shows por mês para pagar as contas e alimentar seus filhos. Este é o drama de todo profissional. Mas exige nossa reflexão quando esta profissão é cantar a fé. Alguns caem nas graças do público e têm muitos pedidos de shows. Já não lhes interessa tanto o reconhecimento eclesial. A maioria dos shows não é pago mesmo pela paróquia. A prefeitura sempre acaba incluindo um show religioso na festa da cidade. Isto envolve uma série de complicadores que não vale a pena tratar aqui. Mas a situação dos nossos músicos profissionais de shows de evangelização não é nada fácil.
Existe neste meio os músicos católicos pobres. São aqueles que nunca conseguem shows e vivem dramas familiares que poucos párocos conhecem. São geniais em sua música, mas não caíram no gosto do povo, ou simplesmente não são bons de marketing. Alguns têm que ouvir coisas do tipo: “por que você não arruma uma profissão?”. Sinceramente não consigo imaginar estes fantásticos compositores, cantores e instrumentistas, fazendo pão durante a semana para poder cantar na quermesse de graça no sábado a noite, vendendo o seu CD promocional a R$ 5,00.
Desculpe o tom nú e cru deste artigo. Mas escrevo vendo as lágrimas de alguns Ministros de Música que receberam de Deus o chamado para avançar para águas mais profundas e para isso eles só precisam da barca de Pedro… sua paróquia!
A revista Paróquias abre o ano de 2019 noticiando e apresentando um encontro único e extraordinário para a Igreja no Brasil. Com a missão de educar, ensinar e indicar caminhos para a evangelização, a gestão e equipe da revista Paróquias lança o “Catequistas Brasil” e, em comunhão com a Igreja, traz essa boa notícia que vem integrar e abraçar os catequistas em um verdadeiro encontro de formação, liderança, encorajamento, compromisso e vivência da vocação como promotores da fé católica em sua missão de catequistas. O projeto que, em seu tempo de preparação para acolher milhares de catequistas, na cidade de Aparecida no mês de fevereiro, reuniu pessoas de todas as áreas comuns da Igreja e agora colhe em sua temática levar esse novo anseio para ajudar na missão catequética e cultivar sempre a decisão de contribuir na evangelização em sua plena atividade nas paróquias e comunidades pelo Brasil. Por isso, convidamos o Padre Joãozinho, scj (João Carlos Almeida), um dos colaboradores e assessores do ‘Catequistas Brasil’, para responder a algumas inquietações sobre a catequese e a formação dos agentes dispostos e vocacionados nessa grandiosa missão. Padre Joãozinho ajuda a pensar esta ideia de levar uma catequese instruída pela Igreja e suas diretrizes e orientações e, assim como a revista Paróquias, quer se unir cada vez mais a este propósito evangelizador ajudando e oferecendo conteúdo. Nesse sentido, Padre Joãozinho, conhecido de todos como compositor, cantor, escritor, professor de teologia na Faculdade Dehoniana em Taubaté-SP, dentre tantas outras atividades, formações e trabalhos, nessa entrevista responde, então, a algumas aspirações do leitor para que este possa conhecer o evento ‘Catequistas Brasil’ e além disso, contribui com uma reflexão sobre a formação dos catequistas e catequese. Confira.
Olho: “A estrutura e os assessores desse ‘Catequistas Brasil’ vão surpreender muito todas as pessoas, e quem fizer esse encontro com certeza não se arrependerá”
Apesar de ser a pastoral pioneira da Igreja, a catequese continua a ser desafiada e/ou confrontada com a nova cultura, por sua linguagem e método. Uma sensação de estar sempre um passo atrás das novas gerações. Que adequações a Catequese precisaria fazer para responder a essa demanda e projetar-se no tempo?
De fato, a catequese é a pastoral pioneira da Igreja. Se lermos com atenção o evangelho de Lucas e Atos dos Apóstolos, e mesmo textos dos primórdios do cristianismo, como a ‘Didaqué’, encontraremos a figura dos catecúmenos, aqueles que se preparavam para receber o batismo, a eucaristia, e também o sacramento da unção, da crisma, que eram aqueles que se convertiam à fé cristã e precisavam receber uma catequese. O Evangelho de Lucas, por exemplo, é todo construído como um verdadeiro manual de catequese para iniciar na vida cristã aqueles que se convertiam. Hoje, a catequese tenta buscar esta inspiração de novo.
O Documento 107 da CNBB fala da catequese voltar a uma catequese de inspiração catecumenal, ou seja, aquela catequese dos primórdios do cristianismo. Mas não simplesmente preparando para os sacramentos, como a primeira comunhão, e a crisma, ou mesmo outras formas de catequese, como por exemplo, o batismo e a preparação para o matrimônio. Se você pensar na ordenação sacerdotal, levei dezessete anos para me preparar para ser padre, mas muita gente para se casar basta apenas um encontro de um final de semana ou às vezes uma tarde. E para batizar um filho, basta uma ou duas horas de palestra. Então, a Igreja vem tomando consciência que é preciso retomar aquela iniciação à vida cristã de inspiração catecumenal e que seja querigmática, quando anuncia Jesus como Pessoa e que leva à conversão, ou seja, Jesus é o Salvador. Logo, a catequese precisa anunciar o querigma, precisa ser mistagógica – a pedagogia do mistério – ou seja, é preciso que aquele que participa da celebração da liturgia, da eucaristia, de todos os sacramentais saiba o que está celebrando porque foi iniciado nos mistérios, no culto e assim ele tem uma iniciação mistagógica. Essas são as características que a Igreja pretende com a catequese: não simplesmente como instrução para a vida cristã, mas iniciação à vida cristã.
Diante dos apelos da Igreja, que apresentou como uma de suas urgências, “Igreja, casa de iniciação a vida cristã”, como fazer para que os catequistas, sobretudo os de iniciação à vida cristã, se preparem para formar seus catequizandos de modo que eles se iniciem de fato na vida cristã?
O novo catequista, o catequista da iniciação à vida cristã, o catequista querigmático, mistagógico, é uma pessoa convertida, é uma pessoa catequizada. Não é uma pessoa que sabe tudo de catequese, não é um bom leitor de um manual, mas é uma pessoa que vai dar o seu testemunho junto aos seus catequizandos. Vai levar os catequizandos ao encontro real com Cristo na Palavra de Deus porque ele medita e vive essa Palavra e dá testemunho dela. Então, essa é uma forma do catequista se comportar diante dos seus catequizandos, como um verdadeiro testemunho de vida, levando a que eles também se coloquem na partilha e que sigam o método de Jesus.
Os sete passos de Jesus no caminho de Emaús mostram o itinerário catequético que a Igreja propõe. 1) Jesus que primeiro vai ao encontro daqueles dois que estavam indo embora; 2) faz perguntas e escuta seus lamentos e dores; 3) depois reflete a Palavra de Deus; 4) entra para cear com eles; 5) partilha o pão; 6) depois eles fazem uma revisão de vida; 7) finalmente, eles se tornam também evangelizadores. Portanto, um catequista pode medir o seu desempenho, se ele foi um bom catequista, se os seus catequizandos se tornam catequistas. Essa é uma pergunta que eu sempre faço nos encontros de capacitação para catequistas. Quem aqui é um catequista que tem o seu ex-catequizando como catequista? E aí várias pessoas dizem: ‘olha, fulana de tal era minha catequizanda e hoje é catequista”. Posso testemunhar que minha catequista foi a minha mãe e hoje eu sou padre, um catequista do povo. Portanto a catequese dela deu certo.
Que contribuição o Documento 107, da CNBB, sobre a iniciação à vida cristã, trouxe para a catequese, e que sugestão o senhor daria para que ele fosse aplicado de modo eficaz na formação dos catequistas?
O Documento 107, aprovado na Assembleia dos Bispos do Brasil, a CNBB, em 2017, é um documento, aliás, é um texto fundamental para todo aquele que queira ser um catequista do terceiro milênio, um catequista em comunhão com a Igreja. Acompanho os documentos sobre catequese desde a década de 1980, quando saiu o documento ‘Catequese Renovada’ (Doc. 26 da CNBB) e realmente parece que agora fechamos um ciclo, fortemente inspirado no episódio de Jesus com a Samaritana junto ao Poço de Jacó. Os bispos do Brasil encontraram um ícone, um modelo de como dar passos desde um diálogo até a verdadeira conversão, dar passos para uma catequese que realmente seja transformadora, que não seja simplesmente transmissão de conteúdo, de conhecimento, mas que seja transformação da vida.
Depois, o Documento 107 volta aos primórdios do cristianismo para aprender com a iniciação à vida cristã lá no catecumenato do primeiro milênio e chega à conclusão de que é preciso recuperar isso hoje, e que o catecumenato é atual. Nós já tivemos um documento para iniciação cristã de adultos, o RICA. Ele foi tão bem sucedido que acabou contagiando toda a iniciação à vida cristã que quer ser de inspiração catecumenal. É bom notar que o documento 107 não é só teórico, não é só inspirante, ele também é muito prático, ele propõe essa lógica catecumenal para nós hoje. Indica, por exemplo: como deveria ser um projeto diocesano de iniciação à vida cristã? O que precisa ter de mudança de estrutura? Precisa de conversão, conversão inclusive de estruturas, porque se nós continuarmos com algumas estruturas que temos, vai continuar a aula de catequese, vai continuar a Crisma para depois não ter jovens participando da comunidade. Então, a Igreja se pergunta nesse documento 107, o que é o querigma? Como se apresenta o querigma? O que é o catecumenato? Como fazer o processo de purificação, iluminação, mistagogia? Como acompanhar estes candidatos à vida cristã? Não é candidato a um sacramento como se fosse um prêmio, como se fosse uma formatura; é candidato à vida cristã. Depois esses sujeitos eclesiais não são simplesmente crianças ou mesmo adolescentes. Os âmbitos da catequese chegam na família; a família precisa ser também evangelizada. São adultos, claro são crianças, mas também são pessoas com deficiência, são pessoas afastadas e até bispos, padres que precisam ser iniciados na vida cristã. E aí temos a revisão dos manuais, dos textos. Enfim, o documento 107 merece uma leitura atenta porque é um dos melhores documentos que a CNBB publicou até hoje.
O ‘Diretório Nacional de Catequese’ fala da importância de incentivar uma preparação dos catequistas, abrangendo método, conteúdo, pedagogia e linguagem. O que senhor explica sobre essa orientação?
O Diretório Nacional de Catequese repercute para o Brasil aquilo que já dizia o Diretório Geral para Catequese da Congregação para o Clero publicado lá pelos idos de 1997, mas para o mundo inteiro. O Brasil tem situações particulares, mas as linhas gerais são as mesmas. O Concílio do Vaticano II foi um movimento catequético e é uma renovação da catequese. Aliás, ele fala em catequese renovada, alguns desafios. Então, talvez este seja o grande desafio da catequese renovada, que agora é catequese de iniciação à vida cristã: o método! A palavra método significa um jeito de caminhar, como é que se caminha? Fala-se agora de ‘iter’ ou itinerário catequético. Catequese se faz no caminho, não é sentado, não é aprendendo conceitos, mas praticando! Como Jesus lá no poço de Jacó, mas mesmo como Jesus nos discípulos de Emaús, como Maria diante do anjo Gabriel. São catequeses itinerantes, mas é claro, é preciso pensar o conteúdo dessa catequese. A catequese não é apenas um diálogo sem propósito e João Paulo II promoveu uma síntese do conteúdo catequético no Catecismo da Igreja Católica e é preciso que os catequistas bem informados conheçam esse conteúdo.
Para ser um bom catequista é preciso preparar-se pedagogicamente e até didaticamente. Pedagogia é levar o educando pela mão e o iniciar na vida cristã. A didática se refere aos meios: como que eu vou montar o encontro de catequese? Que recursos eu tenho? Quem estudou pedagogia sabe o que é didática. Nós precisamos educar os catequistas nesses macetes didáticos, senão ele pode cair numa série de erros primários que vão até fazer com que você tenha um bom desempenho na sua catequese, mas no final ninguém se converteu, ninguém aprendeu nada. Tudo isso passa por uma questão de linguagem. Já tivemos vários modelos de catequese na igreja, mas hoje nós queremos um modelo que leve realmente à conversão.
E como integrar uma formação dos catequistas como comunicadores de experiências de fé, comprometidos com uma “Igreja em Saída”, seguindo os passos do Papa Francisco?
A Igreja em Saída do Papa Francisco tem tudo a ver com a catequese como iniciação à vida Cristã. Por que essa catequese não forma apenas discípulos, gente que sabe o catecismo, gente que sabe o Credo, conhece o Pai Nosso, conhece os sacramentos e conhece os mandamentos. Não é apenas isso, é gente que está disposta se tornar também evangelizador para sair em missão. Então o catequizando se torna um catequista, o evangelizado se torna um evangelizador. Se isso acontecer então começa um círculo virtuoso da evangelização. É isso que significa catequese em tempos de Igreja em Saída.
Quais são as perspectivas e desafios para a catequese no Brasil hoje, sobretudo, depois do Sínodo da Juventude?
Depois do Sínodo da Juventude, um dos grandes desafios é conhecer a mente desse jovem da pós-modernidade líquida. Hoje os valores estão difusos, a verdade está relativizada e tudo é subjetivo. O mundo sólido desapareceu e um dos efeitos disso na juventude – o papa Francisco fala muito bem disso no livro Deus é Jovem – é que esse jovem, náufrago da pós-modernidade líquida, como dizia Zygmunt Bauman, quer se apegar a uma boia, a um barco qualquer, e há piratas de ideologias oportunistas que estão passando por aí tentando coletar essa juventude e transformá-los numa geração de neoconservadores alienados, gente que pegou uma boia porque precisa se segurar em alguma coisa e quando eles perceberem que venderam a alma para uma ideologia de segunda categoria, então talvez não tenham mais a capacidade de crer, porque perdem a fé até na última boia que se apresentou. O resultado dessa tragédia é uma geração frustrada, que encontra no suicídio uma solução louca para os seus dramas. Em vez disso, vamos apresentar para essa juventude a pessoa de Jesus Cristo. Não devemos apresentar uma ideologia de direita ou de esquerda, mas simplesmente apresentar a pessoa de Jesus Cristo, a partir da Bíblia, a partir da Palavra de Deus. Essa é a Verdade Sólida, a única que realmente salva. O jovem que conhece Jesus Cristo na Palavra de Deus não venderá sua alma para uma ideologia oportunista.
A revista Paróquias está promovendo o ‘Catequistas Brasil’, evento inédito para a Igreja no Brasil, quando reunirá os catequistas na cidade de Aparecida/SP de 8 a 10 de fevereiro de 2019. Para o senhor, um dos palestrantes e assessor na produção geral do evento, qual a sua observação e análise sobre o encontro?
O evento ‘Catequistas Brasil’ acontece na hora certa. Eu não sei como é que já não aconteceu antes. Mas agora é o momento! Em 2017 tivemos o documento 107, Iniciação a Vida Cristã. Em 2018 tivemos a 4ª Semana Brasileira de Catequese que digeriu a iniciação à vida cristã e evidenciou uma série de manuais publicados pelas editoras católicas já em sintonia com essa nova perspectiva e linguagem, mas voltado para um grupo de especialistas em catequese, coordenadores de catequese nas diversas dioceses do Brasil. Agora o ‘Catequistas Brasil’ quer levar essa maravilha para todo mundo, para todo catequista, todo aquele que quer evangelizar por meio da catequese. Por isso o evento é um serviço àquilo que está bem expresso nos documentos da Igreja, mas nem sempre é traduzido para os catequistas de nossas paróquias em uma linguagem que ele realmente entenda e consiga colocar em prática. Esse é o foco do “Catequistas Brasil”: não cria novos conteúdos de catequese mas forma a pessoa do catequista naquilo que a Igreja ensina.
Portanto, um evento que se propõe a reunir 5 mil pessoas na Casa da Mãe precisa do apoio de todo mundo, porque não é todo dia que leigos promovem um evento para leigos. E isso surgindo no ano do Laicato, que foi nesse ano de 2018, o ano do Laicato deu origem ao projeto ‘Catequistas Brasil’ e a Revista Paróquias é responsabilidade de um grupo de leigos. Então, estou muito feliz de poder contribuir com essa iniciativa que é a primeira de uma série de eventos que vai marcar a Igreja no Brasil e vai levar esse projeto todo de iniciação à vida cristã até lá na realidade daquele catequista que tem os seus catequizandos e que quer saber como fazer isso da melhor maneira possível.
O que a Igreja pode esperar do ‘Catequistas Brasil’?
A Igreja pode esperar do ‘Catequistas Brasil’ um movimento inspirado todo ele de cima a baixo no Documento 107 da CNBB, inspirado todo ele no itinerário catequético, inspirado todo ele no diretório nacional de catequese, que por sua vez, está fundado no diretório geral para catequese. Um momento de capacitação séria do sujeito eclesial, que é o catequista, de capacitação para que ele possa sair daquele lugar sentindo que tem jeito de evangelizar por meio da catequese. Que ele saia dali cheio de esperança, de ânimo, com as mãos cheias de sementes práticas para lançar no seu lugar de apostolado. Nós não queremos no ‘Catequistas Brasil’ colocar um ideal inatingível, alguma coisa que seja tão idealizada que todo catequista vai dizer: “Tão alto que eu não consigo alcançar”. Não! É possível para todos os catequistas de A a Z. Por isso, a estrutura e os assessores desse ‘Catequistas Brasil’ vão surpreender muito todas as pessoas e quem fizer esse encontro com certeza não se arrependerá.
O senhor, como membro da Faculdade Dehoniana, que é parceira e apoiadora do “Catequistas Brasil”, fale que novidade vem por aí que somará ainda mais com a formação dos catequistas?
A Faculdade Dehoniana, em parceria com a Promocat e a Revista Paróquias, pretende apresentar uma oportunidade para aqueles que querem mergulhar ainda mais fundo. Nós temos catequistas que querem mais formação e para isso nós estamos montando uma pós-graduação para catequistas do Brasil, ou seja, para quem quider, além daquele conhecimento de um final de semana em Aparecida, fazer 360 horas de um curso de pós-graduação lato sensu que habilita inclusive para lecionar no ensino superior e capacita para lecionar ensino religioso escolar. Nós queremos reunir umas 100 pessoas, possivelmente lá no hotel Rainha (do Brasil), em Aparecida, durante 2 anos, a começar de julho de 2019 até janeiro de 2021. Dois anos, 24 meses de um estudo profundo e sistemático. A Faculdade Dehoniana já tem uma tradição na oferta de pós-graduação de qualidade. A pós-graduação em Mariologia é um exemplo disso, e agora oferece a Pós-graduação para catequistas do Brasil.
Para finalizar, fale como a paróquia pode participar do ‘Catequistas Brasil’ incentivando seus agentes da Pastoral da Catequese. O que o pároco pode aguardar do evento enviando seus catequistas?
A generosidade dos catequistas é notória em todas as paróquias do Brasil. São voluntários, que dedicam seu tempo, um tempo de preparação, um tempo de capacitação e também aquele tempo da catequese. É gente comprometida, gente convertida. Por isso, penso que o pároco tem uma oportunidade maravilhosa de manifestar a sua gratidão a um grupo de catequistas, para que venham ao ‘Catequistas Brasil’ e depois possam repercutir isso, porque catequese significa repercutir, ‘Kat-ekhéo’ é eco, que eles possam repercutir para os outros catequistas. Talvez não possam vir todos, mas com o auxílio da paróquia podem pelo menos virem alguns com o compromisso de depois repassarem para os outros. E por que não um ou dois da paróquia ou diocese virem com o incentivo, inclusive financeiro, fazer uma pós-graduação para depois se tornarem aquele catequista que já tenha talvez uma caminhada com um pouco mais de experiência? Uma paróquia que está bem estruturada possui uma gestão bem elaborada, forma seus agentes. Essa é uma maneira inteligente de aplicar o dízimo, não apenas em paredes, em alfaias, em beleza exterior, mas em preparar pessoal qualificado. As empresas fazem isso, investem muito e depois colhem frutos saborosos do investimento em capacitação de pessoal. Um dos melhores investimentos que uma paróquia pode fazer é formar seus catequistas.
Para participar do ‘Catequistas Brasil’ acesse o site: www.catequistasbrasil.com.br e faça sua inscrição.
Por telefone (12) 3311-0665 e Watsapp (12) 99360-1989
Por e-mail: contato@catequistasbrasil.com.br
Inscreva seus agentes da Pastoral da Catequese! Vale a pena participar!
Pe. Joãozinho, scj
No seu recente livro Ave Maria (Editora Planeta, 2019), O Papa Francisco retoma uma bela imagem da aurora do cristianismo utilizada por Santo Irineu (130 – 202 d.C) “O nó da desobediência de Eva foi desatado pela obediência de Maria; aquilo que a virgem Eva atara com a sua incredulidade, desatou-o a virgem Maria com a sua fé” (Adversus Haereses III, 22, 4). Provavelmente essa é a origem remota da devoção a Nossa Senhora Desatadora dos Nós.
A frase é tão forte que atravessou dois mil anos de história e entrou no texto do Concílio Vaticano II: “Maria, filha de Adão, dando o seu consentimento à palavra divina, tornou-se Mãe de Jesus e, não retida por qualquer pecado, abraçou de todo o coração o desígnio salvador de Deus, consagrou-se totalmente, como escrava do Senhor, à pessoa e à obra de seu Filho, subordinada a Ele e juntamente com Ele, servindo pela graça de Deus onipotente o mistério da Redenção. Por isso, consideram com razão os santos Padres que Maria não foi utilizada por Deus como instrumento meramente passivo, mas que cooperou livremente, pela sua fé e obediência, na salvação dos homens. Como diz Santo. Ireneu, ‘obedecendo, ela tornou-se causa de salvação, para si e para todo o gênero humano’. Eis porque não poucos Padres afirmam com ele, nas suas pregações, que ‘o nó da desobediência de Eva foi desatado pela obediência de Maria; e aquilo que a virgem Eva atou, com a sua incredulidade, desatou-o a virgem Maria com a sua fé’; e, por comparação com Eva, chamam Maria a ‘mãe dos vivos’ e afirmam muitas vezes: ‘a morte veio por Eva, a vida veio por Maria’” (Lumen gentium 56).
Mas o que significa isso? O Papa Francisco com simplicidade profunda nos ajuda a entender numa das mais belas respostas dadas ao padre Marco Pozza no livro Ave Maria: trata-se do “nó da desobediência, o nó da incredulidade. Poderíamos dizer, quando uma criança desobedece à mãe ou ao pai, que se forma um pequeno ‘nó’. Isto sucede, se a criança age sabendo o que faz, especialmente se existe aí pelo meio uma mentira; naquele momento, não se apóia na mãe e no pai. Sabeis que isto acontece tantas vezes! Então a relação com os pais precisa ser limpa desta falta e, de fato, pede-se desculpa para que haja de novo harmonia e confiança. Algo parecido acontece no nosso relacionamento com Deus. Quando não O escutamos, não seguimos a Sua vontade e realizamos ações concretas em que demonstramos falta de confiança n’Ele – isto é o pecado –, forma-se uma espécie de nó dentro de nós. E estes nós nos tiram a paz e a serenidade. São perigosos, porque de vários nós pode resultar um emaranhado, que vai se tornando cada vez mais penoso e difícil de desatar. Mas, para a misericórdia de Deus – sabemos bem –, nada é impossível! Mesmo os nós mais complicados desatam-se com a sua graça. E Maria, que, com o seu ‘sim’, abriu a porta a Deus para desatar o nó da desobediência antiga, é a mãe que, com paciência e ternura, nos leva a Deus, para que Ele desate os nós da nossa alma com a sua misericórdia de Pai. Cada um possui alguns destes nós, e podemos interrogar-nos dentro do nosso coração: Quais são os nós que existem na minha vida? ‘Mas padre, os meus nós não podem ser desatados’! Não, isto está errado! Todos os nós do coração, todos os nós da consciência podem ser desatados. Para mudar, para desatar os nós, peço a Maria que me ajude a ter confiança na misericórdia de Deus? Ela, mulher de fé, certamente nos dirá: ‘Siga em frente, vá até ao Senhor: Ele entenderá você’. E Ela nos leva pela mão, Mãe, Mãe, até ao abraço do Pai, do Pai da misericórdia”.
Exatamente por isso a Tradição da Igreja aprendeu a proclamar Maria como “Mãe de Misericórdia”. A Salve Rainha é uma dessas preces que repousa no coração do povo e acorda diariamente em seus lábios, principalmente ao final da recitação do Terço. Se pensarmos no seu autor, em torno do ano mil, entenderemos o sentido de cada palavra: Herman Contract (1013-1054). Nasceu com todas as doenças que se pode imaginar, inclusive com o palato do céu da boca fendido, o que o impedia de falar. Sua mãe o consagrou a Maria logo ao nascer. Mas a criança aparentemente não iria sobreviver. Foi entregue aos cuidados de um orfanato em um mosteiro. Tornou-se um milagre vivo. Além de se tornar monge e aprender a falar diversos idiomas foi compositor, matemático, poeta, escritor, historiador, musicólogo, teórico musical, astrônomo. Assim, entende-se o “gemendo e chorando nesse vale de lágrimas”, mas com a fé e confiança de que Maria nos “mostra para Jesus”. Cem anos depois, Bernardo de Claraval completou a prece de modo genial e definitivo: “ó clemente, ó piedosa, ó doce Virgem Maria”.
Além disso, a palavra “misericórdia”, na sua origem hebraica – Rahamin – significa literalmente “útero”. Maria é para nós o reflexo humano de um Deus Materno que nos gera para a vida. No seu colo encontramos o colo misericordioso de Deus. Ela nos representou diante do céu naquele dia em que o anjo Gabriel lhe fez a proposta para ser a mãe do Filho do Altíssimo. “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em segundo a sua promessa” (Lc 1,38). E foi aberta na terra a porta para o céu. Foi um sim totalmente livre, pois Maria não estava refém do pecado original: foi concebida imaculada. Era tão livre quanto nossos primeiros pais. Mas, ao contrário deles, ela disse SIM. Esse foi o seu principal ato de misericórdia.
Naquele momento Maria ficou grávida de Deus. Em seu ventre foi gerado o Cristo todo: totalmente Deus e totalmente homem, como diria muito depois o Concílio de Calcedônia (451 d.C). O divino assumiu completamente o humano para nos redimir. Como havia dito Santo Irineu: “O que não foi assumido, não foi redimido”. O colo de Maria se tornou o sacrário desse mistério de salvação. Ali dentro, em Jesus Cristo, não era mais possível separar o que é humano do que é divino. Por isso a liturgia cristã, aos poucos começou repetir poemas em que reconhecia Maria como “Theotokos”, que a partir da tradução latina costumamos dizer em português: “Mãe de Deus”. Literalmente seria “portadora de Deus“. Oficialmente a Igreja levou um pouco mais de tempo para reconhecer essa verdade como dogma: apenas no Concílio de Éfeso, em 431, sob forte pressão popular.
Por todos os lados que olhamos, Maria sempre aparece como aquela que reconcilia. Se retomarmos o primeiro texto cristão que faz referência a uma mulher, que depois seria identificada com o nome de Maria, veremos que o contexto é de salvação, reconciliação. Trata-se do versículo 4 do capítulo 4 da Carta de São Paulo aos Gálatas, utilizado por São João Paulo II logo no primeiro número de sua belíssima carta Redemptoris Mater: “A Mãe do Redentor tem um lugar bem preciso no plano da salvação, porque, ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei, a fim de resgatar os que estavam sujeitos à Lei e para que nós recebêssemos a adoção de filhos. E porque vós sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: ‘Abbá! Pai!’” (Gálatas 4, 4-6). Se olharmos um texto bem recente, no capítulo 8 da Lumen gentium, dedicado à Maria, teremos algumas pérolas que vale ressaltar: Maria “Cuida, com amor materno, dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, caminham ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada. Por isso, a Virgem é invocada na Igreja com os títulos de advogada, auxiliadora, socorro, medianeira. Mas isto entende-se de maneira que nada tire nem acrescente à dignidade e eficácia do único mediador, que é Cristo”.
Portanto, podemos segurar nas mãos de Maria e pedir abrigo no seu colo. Ela nos protegerá em nossas angústias, desafios e tristezas e ao chegar perto da mãe sempre nos encontraremos com seu Filho. É sempre assim: a mãe leva para o filho. Não é possível separar. Algo de nossas mães estará eternamente em nós. E apenas para citar um poema lapidar de Pe. Zezinho, scj: “Em cada mulher que a terra criou, um traço de Deus, Maria deixou, um sonho de mãe Maria plantou”. Fomos gerados no ventre de Maria com Jesus Cristo. Somos membros do seu corpo Místico. Por isso, reconhecemos Maria como Mãe da Igreja e mãe de cada um de nós.
Podemos agora rezar uma das mais antigas preces marianas das história:
Português
À vossa proteção recorremos,
Santa Mãe de Deus.
Não desprezeis as nossas súplicas
em nossas necessidades,
mas livrai-nos sempre
de todos os perigos,
ó Virgem gloriosa e bendita.
Amém.
Latim
Sub tuum praesidium confugimus,
Sancta Dei Genetrix.
Nostras deprecationes ne despicias
in necessitatibus,
sed a periculis cunctis
libera nos semper,
Virgo gloriosa et benedicta.
Amen.