Sou humano. Isto significa que fui feito de humus, terra, barro. Não sou de ferro nem de outro tipo de metal qualquer. Tenho que reconhecer a fragilidade de minha carne. Tenho mil limites. Sou limitado pelo tempo. Não posso fazer tudo em apenas 24 horas. Além disso, quando chega um certo momento preciso dormir. Não posso funcionar em um turno de 18h sem repouso. Sou limitado pelo espaço. Não posso estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Não posso estar no trabalho e em casa; não tem jeito de assumir dois compromissos em dois lugares diferentes ao mesmo tempo. Não sou onipotente, nem onisciente, nem onipresente. Não sou Deus.
Existe um mito grego muito interessante a este respeito. Atlas era na verdade o nome de um de dos titãs que foi condenado por Zeus a carregar o mundo nas costas. Ele teria sido o primeiro rei da mitológica Atlântida, que acabou recebendo seu nome. O Oceano Atlântico faz referência a esta figura mitológica. Sua figura é representada sempre com o globo terrestre as costas. O único momento em que teria sido aliviado deste peso foi quando outra figura mitológica, Hércules, pediu a Atlas para realizar seu 11º trabalho, que consistia em buscar uma maça em um jardim proibido. Enquanto Atlas realiza o trabalho, Hércules sustenta o mundo nas costas. Mas logo que volta, o pobre Atlas recebe seu peso de volta e Hércules vai embora feliz com a leve maça em suas mãos.
Todas estas histórias mitológicas na verdade escondem uma grande sabedoria. Quantos pais e mães vivem com o mundo dos filhos nas costas… pagam as contas e vivem as penas. Muitos filhos querem apenas a leveza da maçã. Não querem carregar seu mundo. O peso sempre fica para os pais. Depois daquela reunião sempre alguém acaba tendo que caregar o balaio. Pode ficar esperto. Se você tem o complexo de Atlas, o escolhido sempre vai ser você. É bonita a disponibilidade para com a comunidade e a família. Mas cuidado! Carregar o mundo pode não dar certo. Não somos deuses, lembra? Ou já esqueceu? Vai vindo um cansaço e vc vai sentindo uma tristeza e a sensação de que está sendo explorado pelos outros. É preciso libertar-se desta doença que faz com que você acumule mais compromissos do que pode assumir.
A cura deste complexo de Atlas vem pelo cultivo da humildade. Temos que reconhecer os limites. Existe uma pedagogia da ausência que precisa ser aprendida por pais e mães. As mulheres, especialmente, tem esta tendência de dar colo eternamente para seus filhos. Mas carregar um marmanjo de 30 anos pode ser até ridículo. Mas é isso que muitas mães teimam em fazer.
Existem pessoas que exercitam a síndrome de Atlas na sua vida pastoral. Estes têm reuniões de segunda a sexta. No final de semnaa estão repletos de compromissos e acham que Deus não poderia nada sem eles. O que seria de Deus se eu faltasse na catequese? É bonitaa atitude de engajar-se na pastoral, desde que tudo não dependa de você. Uma vez um grande lider escreveu: – “Procure o funcionário imprescindível em sua empresa, e demita-o”. Como disse Jesus, ´”uma só coisa é necessária… Maria escolheu a melhor parte”. De fato, somos meramente importantes. Necessário é apenas Deus.
Pense bem. Qual é o peso que você carrega inutilmente? Tem gente carregando maçãs ao seu redor enquanto você carrega o mundo? Está cansado e triste? É hora de dar um basta. Não é fácil. Mas Deus não quer que você viva nesta opressão. O fardo que ele tem preparado para você é leve… é suave… é possível de carregar (Cf. Mt 11, 25-30).