“Caritas in Veritate” e a questão antropológica
Por Antonio Gaspari
ROMA, quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010 (ZENIT.org). – No primeiro dos encontros de 2010 na Catedral de Roma, ocorrido nessa segunda-feira, o cardeal Camilo Ruini explicou a relevância da Doutrina Social da Igreja como uma verdadeira revolução antropológica, cuja proposta é anunciar a verdade de Cristo na sociedade.
O tema do encontro, organizado pelo Vicariato de Roma, foi “Caritas in veritate. Reflexões sobre seus fundamentos antropológicos”.
Apresentando o tema, o cardeal Agostino Vallini, vigário de Roma, precisou que com a encíclica Caritas in Veritate, o Papa ofereceu à Igreja e a todos os homens de boa vontade uma reflexão de grande empenho argumentativo acerca do desenvolvimento humano, um documento orgânico de análise e de propostas por um mundo novo; poderíamos dizer, um manual ético para a economia e também – em certo sentido – um guia para a política. Enfim, um texto de ampla inspiração e esperança”.
“Para o Papa Bento XVI” – acrescentou o purpurado – nenhuma questão que diga respeito ao homem – incluída a questão social – pode prescindir de remeter aos fundamentos. O conceito de homem não muda, e o modo pelo qual são interpretadas as relações entre homem e natureza, homem e liberdade, homem e trabalho, homem e economia, alteram, consequentemente, o conceito de sociedade, o escopo do processo econômico, as regras e objetivos do desenvolvimento”.
O cardeal Ruini, atual presidente do Projeto Cultural da Conferência Episcopal Italiana, sublinhou que, com a encíclica papal, “a questão social foi radicalmente transformada numa questão antropológica”, e que, “sem a verdade, a caridade se degrada no sentimentalismo, e um cristianismo de caridade sem verdade facilmente se torna marginal”.
Daí a asserção de que a “a Doutrina Social da Igreja é ‘Caritas in Veritate in re sociali’: anúncio da verdade de Cristo na sociedade”.
O presidente da CEI e vigário de Roma explicou que “a verdade do homem se expressa primeiramente na centralidade da pessoa humana”, princípio-chave de uma “atuação correta e fecunda de desenvolvimento”.
“É a pessoa, de fato, o sujeito que deve assumir primariamente o dever do desenvolvimento, e é a pessoa o recurso fundamental que possibilita o desenvolvimento, o primeiro capital a proteger tendo em vista o próprio desenvolvimento”.
Neste contexto, segundo o purpurado, “a encíclica derruba o argumento, muito difundido, de que o excessivo incremento demográfico esteja na origem do sub-desenvolvimento”.
“É justamente a crise de natalidade” – precisou – “que se revela hoje a causa de incertezas e do declínio das nações economicamente desenvolvidas, enquanto que a abertura moralmente responsável à vida representa uma riqueza social e econômica”.
“Portanto, o respeito pela vida e pela abertura à vida constituem o centro do verdadeiro desenvolvimento, enquanto que a mentalidade anti-natalista e as legislações contrárias à vida, tais como políticas de controle demográfico impostas por governos, comportam pesados custos humanos e sociais”, acrescentou.
No contexto que une a ética social e a ética da vida, é evidente a proximidade da Caritas in Veritate não apenas com a Populorum Progressio, mas também com a Humanae Vitae, assim como a Evangelium Vitae.
A este propósito, o prelado apoiou com vigor o clamor do Papa Bento XVI por uma superação das diferenças na sensibilidade moral que caracteriza o moderno ocidente.
Retomando à Evangelium Vitae, de João Paulo II, o cardeal Ruini afirmou que “não pode ter bases sólidas uma sociedade que – enquanto afirma os valores da dignidade humana, da justiça e da paz – contradiz radicalmente a si própria, aceitando e tolerando as mais diversas formas de desvalorização e violação da vida humana”.
Após ter denunciado o risco de um niilismo tecnológico, com o uso utilitário e cientificista da consciência científica e das novas tecnologias, o presidente da CEI chamou também a atenção para as “atuais tendências de desarticular a cultura da natureza, (…) problema decisivo também para a proteção da criação”.
“Quando se considera a centralidade do homem, sob a ótica da ética e da lei natural, é inevitável a questão sobre Deus”, explicou.
A conclusão da encíclica abre-se assim com uma afirmação contundente, que representa a instância central do magistério de Bento XVI: “Sem Deus, o homem não sabe para onde ir, e não é capaz nem sequer de compreender quem é”.
Consideração alinhada ao pensamento de Paulo VI, que na Populorum Progressio afirma: “o homem não está apto a conduzir sozinho seu próprio progresso, porque não é capaz de fundamentar em si mesmo um verdadeiro humanismo”.
“Apenas se acreditarmos que somos chamados a fazer parte da família de Deus na condição de filhos, é que seremos capazes de produzir um novo pensamento e de expressar novas energias a serviço de um verdadeiro humanismo integral”. É justamente “o fechamento ideológico a Deus e o ateísmo da indiferença, que se esquecem do Criador e se arriscam a esquecer também os valores humanos, que figuram hoje entre os maiores obstáculos para o desenvolvimento”, concluiu o cardeal Ruini.