Leio com um misto de tristeza, indignação e frustração, a entrevista que Frei Leonardo Boff deu recentemente à revista ISTOÉ. Ele se refere à Igreja com uma simplificação infantil que faz qualquer estudante de teologia duvidar que um dia Leonardo tenha sido teólogo também. Diante do natural ostracismo em que se colocou, este tipo de entrevista tem a finalidade óbvia de atrair um pouco de atenção. Na verdade ele insiste em querer se dizer mártir da Teologia da Libertação. Teria sentado na cadeira de Galileo Galilei, para a inquisição promovida por Ratzinger. Nada mais pueril e falso. Na verdade os questionamentos feitos a Leonardo pela Congregação para a Doutrina da Fé tinham pouco ou quase nada a ver com a Teologia da Libertação. Quando Boff chegou ao Brasil ao final de seus estudos na Alemanha (parcialmente financiados por Ratzinger), a TdL já estava em curso. Leonardo tornou-se editor da Vozes. Seu esforço era acadêmico. Publicava suas apostilas. Eram bons textos, mas permitia-se alguns ensaios teológicos passíveis de crítica. Leonardo nunca foi muito amigo da crítica. Prefere criticar. O seu principal livro criticado foi IGREJA, CARISMA E PODER. A primeira parte é um ótimo resumo de eclesiologia. Mas a certa altura ele concentra toda a sua atenção na “Trindade como modelo para toda Comunidade”; ora, admitir relações de subordinação entre as pessoas da Trindade seria cair na heresia do “subordinacionismo”. Deste modo, toda sociedade que admita algum tipo de subordinação (inclusive a Igreja) seria uma espécie de subordinacionismo prático. Assim o papa, os bispos, qualquer autoridade seriam a encarnação de uma heresia prática. Nada mais falso. É uma visão eclesiológica que padece do reducionismo ao modelo trinitário. Há um conjunto de modelos de Igreja, inclusive o modelo paulino do “corpo místico de Cristo”. A Igreja tem esta estrutura hierárquica do corpo, em que o poder está em servir à comunhão. Leonardo sabe disso. Mas sua dificuldade com a autoridade o cega. Una-se isso agora ao desejo de aparecer na mídia. Seu desejo de ser o mártir da TdL acabou por colocar em descrédito a parte boa da Teologia da Libertação.
Há uma parte da entrevista particularmente curiosa, que faço questão de reproduzir aqui:
Istoé – O que o sr. acha da Renovação Carismática Católica?
Leonardo Boff – É um movimento forte, que trouxe muitos elementos positivos, pois tirou o monopólio dos padres. Agora o leigo fala e inventa orações, coisa que não ocorria. Deu certa leveza ao cristianismo, muito centrado na cruz e na paixão e menos na alegria e na celebração. Mas, a meu ver, ela ficou a meio caminho.
Istoé – Por quê?
Leonardo Boff – Não se pode pensar no cristianismo sem justiça social e preocupação com os pobres. Todo carismatismo corre o risco de alienação. Eles se perdem no louvor, no cantar e dançar.
—
Será que o cristianismo realmente era mais “centrado mais na cruz que na alegria”? Teria a RCC ficado na metade do caminho? Não existe opção pelos pobres na RCC? Tudo isso parecem palavras ao vento… simplificações de folhetim, que servem para vender uma revista semanal por ter “afirmações bombásticas de um ex-frade sobre a Igreja católica”, mas não prestam serviço à verdade. Neste sentido, com seu repetitivo refrão, não estaria Leonardo Boff fazendo exatamente o que critica em Pe. Marcelo Rossi? Não produz um discurso “adequado ao que é dominante hoje, que é o mercado?”, para usar suas palavras. Não estaria dizendo exatamente o que as pessoas esperam ouvir? Esperava mais de uma mente brilhante como a do meu conterrâneo catarinense.