Noite de terror
Tinhamos terminado de rezar a oraçâo da noite. 20h30m. 3 de agosto de 2010. Quando iamos saindo da capela, três bandidos, bem armados, nos obrigaram a entrar de novo e começaram a tirar, em primeiro lugar, os telefones celulares ( dois somente, pois os noviços nâo têm celular) e mesmo algumas chaquetas. Ajuntaram todos os noviços perto do altar. A mim deixaram no banco atras. Ninguém podia falar. Eles falavam kinande e swahili. A um noviço que tinha algumas unidades ameaçaram com o punhal exigindo o telefone, que ele nâo tinha. Sentado no banco de tràs, rezava o terço pedindo a Deus, à Virgem Maria e ao Padre Dehon que nos protegesse. Aconselhava os noviços a se manterem calmos e a rezarem. Dirigiram-se a mim, e através de um intérprete,exigiram dinheiro. Conduziram-me ao meu quarto. Tive de abri-lo. Insistiam : « dinheiro, dinheiro.. » Eu dizia : « naô tenho mais. » Dei para eles o que ainda tinha na gaveta : 5 dolares e alguns francos congoleses. O chefe, olhou ; ficou furioso, jogou o dinheiro na minha cara, e com a espigarda no meu peito dizia : « um padre jà morreu porque nâo quis entregar o dinheiro ». Eu repetia : « nâo tenho mais nada. » Enquanto isso, dois outros bandidos revistavam meu quarto. Reviraram tudo. Eram ignorantes. Um pegou minha câmera fotografica, mas nâo sabia do que se tratava. Olhava curioso, guardou-a na sua sacola e mais tarde perguntou a um noviço que fazia as vezes de intérprete : quanto valia. Respondi que mais ou menos 300 dolares. Ficou contente. Guardou e levou para si. Sem os acessorios naturalmente. Enquanto isso, o chefe, ordenou-me que deitasse de costas para cima e colocsse os braços para tràs. Ali começou o suplicio, a tortura fisica. Com a corda que ele arrancou de uma cortina do quarto, amarrou-me fortemente. Eu gritava de dor. Os noviços que estavam presos na capela escutavam meus gritos. E cada vez ele apertava mais as cordas. Eu gritava. Os noviços pensavam : eles estâo matando o padre mestre ; depois eles vâo nos matar também. Finalmente terminou de apertar, pegou-me pelo colarinho e me levantou. Sempre com ameaça. « Nâo estou brincando. Quero dinheiro ». Repetia sempre a mesma coisa : « nâo tenho mais, nâo tenho mais ». Depois de saquear o quarto, levaram-me para a frente da capela. Ali soltaram um pouco as cordas. Que alivio ! Enquanto isso, eles pegavam dois ou três noviços e os levavam para os seus respectivos quartos, onde roubavam tudo o que podiam. Depois os trancavam em seus quartos. Assim até passarem os 26 noviços. Limparam o que podiam. Depois de 2 horas de tormento, eles pediram o vinho de missa. TInha meitade de uma garrafa. Eles levaram. Sairam da capela e me disseram : vai dormir. Graças a Deus, eles nâo tentaram profanar o sacrario. Estava firmemente decidido a nâo permitir tal profanaçâo, mesmo sofrendo as ameaças de punhal e de espingarda. Segundo os noviços o grupo era numerosissimo. Nossa casa estava rodeada de bandidos bem armados. Nâo eram militares. Quando chegaram, imobilizaram o guarda noturno e perguntaram imediatamente se havia militares na casa. Os noviços ficaram traumatizados. Mantive-me calmo durante todo o tempo, fazendo silenciosamente minhas preces. Depois do assalto, reuni os noviços na capela para agradecer a Deus, à Virgem Maria e ao P Dehon a graça de nos preservarem com vida. Com apenas um telefone conseguimos entrar em contato com Kisangani. Kisangani chamou as autoridades de Butembo. A resposta : estamos a caminho. Nâo chegaram até o dia seguinte. Somente dois militares, de moto, vieram aqui, às 8 horas da manha do dia seguinte, para fins de estatistica de assaltos. Infelizmente essa é a nossa realidade : Butembo està nas mâos dos bandidos ! Vive-se aqui uma guerra cruel : o pobre povo, sem proteçâo, contra os marginais, os bandidos bem armados, e às vezes mesmo até contra os proprios militares. A tempo : quando deixaram nossa casa, de noite, os assaltantes encontraram um pobre homem. Esse resistiu ao assalto. Eles o mataram. Butembo, 4 de agosto de 2010 P Osnildo Carlos Klann, scj Mestre de noviços |
Comentário do arcebispo do Rio de Janeiro
“Como deve agir o padre, hoje, na cena deste mundo em grande transformação?”, questiona ainda o prelado.
O presbítero – afirma Dom Orani –, “antes de tudo, é o homem da Palavra de Deus, o homem do sacramento, o homem do ‘mistério da fé’”.
Os padres “têm o dever primário de proclamar o Evangelho de Deus a todos os homens”, explica, citando a Presbyterorum Ordinis. Mas nesta proclamação “está o dever também de levar cada homem e cada mulher deste mundo a um encontro pessoal com Jesus”.
Dom Orani considera que hoje, mais do que antes, “devemos nos empenhar para que cada pessoa possa fazer esta experiência do encontro com Deus, o devemos fazer com uma renovada esperança, mesmo nas adversidades de um mundo extremamente secularizado, liberal, ateísta e até cético”.
“As pessoas devem perceber no sacerdote ‘Aquele’ a quem ele está a serviço: o que chamamos na teologia da configuração com Cristo.”
“Nesta dimensão, encerra-se a sua vital presença na celebração eucarística, ápice da vida espiritual da Igreja, em que o sacerdote age na pessoa de Cristo. Em suma, o Sacerdote deve ser um homem em contato com Deus, e que nos leva a fazer esta mesma experiência de santidade.”
“A mais sublime missão do sacerdote hoje – afirma o arcebispo – é, sem dúvida, ser um Cristo agora, pois ‘Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre’”.
Porém – prossegue Dom Orani –, o padre “deve avançar com o tempo, com a história, mas não deve ter uma atenção superficial sobre tal ‘modernidade’. É chamado a ser crítico e também vigilante com a realidade que se lhe apresenta”.
“O grande salto qualitativo na vida de qualquer padre seria uma autêntica renovação, que é possível e necessária, e ao mesmo tempo uma grande afeição a uma plena e radical fidelidade à Palavra de Deus e à tradição da Igreja, aos quais ele serve no seu ministério. A sua primeira e fundamental vocação é a da santidade, juntamente com a de toda a Igreja”, afirma o arcebispo.
Dom Orani assinala que o sacerdote “é chamado a ser capaz de se entreter com cada pessoa, acreditando que o outro vale à pena; a ser uma pessoa mística e que, ao mesmo tempo, se interessa pelas coisas do mundo, pela vida do homem, nas suas angústias e alegrias, para que elas se tornem algo sagrado e agradável ao Senhor”.
“O sacerdote é também aquele que procura uma nova linguagem para se comunicar com o mundo de hoje, principalmente neste mundo da multimídia.”
De acordo com o arcebispo do Rio de Janeiro, o sacerdócio ministerial “é entrega, é imolação, é doar-se integralmente, é cruz. Tomar a cruz significa comprometer-se para derrotar o pecado que impede o caminho rumo a Deus, acolher cotidianamente a vontade do Senhor, aumentar a fé, sobretudo diante dos problemas, das dificuldades, do sofrimento”.