Papa dedica catequese de hoje a São João da Cruz
O caminho para a união mística com Deus não consiste tanto em “fazer”, mas em “deixar-se fazer”. Esta é a grande lição de São João da Cruz, cuja obra é um dos cumes da mística cristã de todos os tempos.
O Papa Bento XVI dedicou sua catequese de hoje, na audiência geral realizada na Sala Paulo VI, a este santo espanhol, em sua série dedicada aos doutores da Igreja.
Depois de falar sobre Santa Teresa de Jesus (2 de fevereiro) e São Pedro Canísio (9 de fevereiro), o Papa dedicou a sua intervenção de hoje a São João da Cruz, conhecido como “Doutor místico” e autor de obras místicas universais como “Subida ao Monte Carmelo”, “Noite escura da alma”, “Cântico Espiritual” e “Chama viva de amor”.
No entanto, a vida de São João da Cruz, afirmou o Papa, “não era um ‘voar pelas nuvens místicas’; foi uma vida dura, muito prática e concreta, tanto como reformador da ordem, onde encontrou muitas oposições, quanto como superior provincial, ou na prisão dos seus irmãos na religião, onde foi exposto a insultos incríveis e agressões físicas”.
“Foi uma vida dura, mas precisamente nos últimos meses na prisão, ele escreveu uma de suas obras mais belas”, explicou.
O caminho com Cristo, prosseguiu o Papa, “não é um peso adicional à carga já bastante difícil da nossa vida; não é algo que tornaria ainda mais pesado este fardo, e sim algo completamente diferente, é uma luz, uma força que nos ajuda a carregar esse peso”.
“Se um homem tem em si um grande amor, este amor quase lhe dá asas, e então suporta mais facilmente todos os aborrecimentos da vida, porque carrega dentro de si esta grande luz; esta é a fé: ser amado por Deus e deixar-se amar por Deus em Cristo Jesus.”
“Esse deixar-se amar é a luz que nos ajuda a carregar o peso de cada dia. E a santidade não é obra nossa, muito difícil, mas é precisamente esta ‘abertura’: abrir as janelas da nossa alma para que a luz de Deus possa entrar”, sublinhou o Papa.
A cruz de São João
Este santo espanhol, contemporâneo e amigo espiritual de Santa Teresa de Jesus, colaborou com ela na reforma da Ordem do Carmelo, sofrendo por isso grandes privações e penalidades.
O Papa percorreu brevemente sua biografia, desde sua infância pobre e difícil até seu ingresso no Carmelo, sua ordenação sacerdotal e seu encontro com Teresa de Ávila, que transformaria o curso da sua vida.
“O jovem padre ficou fascinado pelas ideias de Teresa, chegando a se tornar um grande apoio para o projeto” de reforma do Carmelo, afirmou.
No entanto, “a adesão à reforma carmelita não foi fácil e custou a João inclusive graves sofrimentos. O episódio mais dramático foi, em 1577, sua captura e reclusão no convento dos Carmelitas da Antiga Observância de Toledo, devido a uma acusação injusta”.
Depois de seis meses de prisão em duras condições, e de conseguir fugir repentinamente, São João foi destinado aos conventos de Andaluzia. Lá, em Úbeda (Jaén), faleceu dez anos mais tarde.
De suas quatro grandes obras místicas, o Papa destacou os ensinamentos do santo sobre o caminho de purificação que a alma deve percorrer até sua união mística com Deus.
Esta purificação “é proposta como um caminho que o homem empreende, em colaboração com a ação divina, para libertar a alma de todo apego ou afeto contrário à vontade de Deus”.
“De acordo com João da Cruz, tudo o que existe, criado por Deus, é bom. Através das criaturas, podemos chegar à descoberta d’Aquele que deixou nelas seu selo”, explicou.
No entanto, qualquer coisa criada “não é nada comparada com Deus e nada vale fora d’Ele; por conseguinte, para alcançar o amor perfeito de Deus, qualquer outro amor deve ser conformado, em Cristo, ao amor divino”.
Por isso, esta “purificação, sublinhou Bento XVI, “não é mera ausência física de coisas ou de sua utilização; o que torna a alma pura e livre, na verdade, é eliminar toda a dependência desordenada das coisas. Tudo deve ser colocado em Deus como centro e fim da vida”.
Neste sentido, acrescentou o Papa, este processo de purificação “exige esforço pessoal, mas o verdadeiro protagonista é Deus: tudo que o homem pode fazer é “dispor-se” para estar aberto à ação divina e não colocar obstáculos a ela”.
O esforço humano, prosseguiu, “por si só é incapaz de chegar às raízes profundas das más inclinações e maus costumes da pessoa: pode freá-las, mas não desenraizá-las totalmente.”.
“Para fazê-lo, é necessária a ação especial de Deus, que purifica radicalmente o espírito e o dispõe para a união de amor com Ele”, afirmou o Pontífice. “Neste estado, a alma está sujeita a todo tipo de provas, como se estivesse em uma noite escura.”
“Quando se alcança este objetivo, a alma mergulha na própria vida trinitária, de forma que São João diz que esta chega a amar a Deus com o mesmo amor com que Ele ama, porque a ama no Espírito Santo.”
Fonte: Zenit