A chave da solução para a crise econômica

Segundo o presidente do IOR, Ettore Gotti Tedeschi

Oferecemos a seguir vários extratos do capítulo escrito pelo economista e presidente do Istituto per le Opere di Religione (IOR), Ettore Gotti Tedeschi, para o Anuário 2010 da Federazione universitaria cattolica italiana (FUCI), sobre a crise econômica atual. Seus pensamentos foram publicados neste 29 de abril pelo diário L’Osservatore Romano.
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Desde que terminei os estudos universitários, em 1971, no fim de uma crise econômica – e pessoalmente eu já vi muitas —, continuam propondo-se novas regulamentações e novos controles como solução. Desta forma, a crise vai ficando cada vez mais complexa: quando se está em dificuldade e se estabelecem sistemas de controle, todo o sistema se torna mais rígido. Além disto, recoloca-se uma pergunta que nunca encontra resposta: quem é que controla os controladores? Não é o instrumento o que faz funcionarem os processos, mas sim o homem.

Max Weber distinguiu, de modo oportunista e maquiavélico, a ética pessoal da responsabilidade e a ética da convicção. Segundo o sociólogo alemão, existe uma ética de quem tem a responsabilidade sobre um determinado setor e a ética de quem está realmente convencido dele. Como é possível ter a responsabilidade e praticá-la se não se está convencido? O convencimento, a convicção, ou seja, a referência a algo forte, estável, verdadeiro, é determinante para podermos obter resultados. Não existe a ética dos instrumentos, a ética do mercado, a ética do capitalismo: existe um homem que dá sentido ético a cada comportamento.

As famílias norte-americanas, por causa da crise, perderam cerca de 50% dos seus investimentos, porcentagem correspondente ao valor do tombo da riqueza americana. Isto porque nos últimos vinte e cinco anos tinha-se inflado em 50% toda a economia dos Estados Unidos. As famílias viram reduzir-se pela metade o valor da casa, das poupanças, do fundo de pensões, e agora têm que enfrentar um futuro feito de dívidas e um alto risco de desemprego.

Por que o PIB da maior economia do mundo precisou ser inflado durante dez anos? A resposta correta geralmente não é dada, mas o Papa a proporciona na encíclica Caritas in veritate: porque há trinta anos, o sistema do mundo ocidental (Estados Unidos, Canadá, Europa e Japão) deixou de ter filhos.

Quando se afirma que a origem da crise está no uso errado de instrumentos financeiros, na avidez dos banqueiros ou na falta de controles, contam-se mentiras. Por que a economia se viu obrigada a expandir o crédito sem controlá-lo? Porque nos anos oitenta houve um bloqueio do crescimento econômico: o PIB dos países ocidentais crescia muito pouco e estava ligado ao crescimento zero da população. Se a população não cresce, não pode crescer a economia; então, é preciso resignar-se. O mundo ocidental, rico, ávido de coisas e egoísta, decidiu não se resignar. E assim foi inventada a crise econômica.

Bento XVI salvará o mundo: salvará porque está propondo uma mudança cultural radical para o homem. Ao lermos a introdução à Caritas in ventate, notamos que o Papa remete ao primeiro mandamento do Decálogo, distinguindo explícita e implicitamente verdade e liberdade.

Na cultura dominante, a liberdade, que desde o Iluminismo é adornada com positivismo, relativismo, até o niilismo atual, precede a verdade. O homem deve ser livre para encontrar a verdade, mas, desta maneira, não só não a encontra como também a confunde com a própria liberdade. Bento XVI reafirma a necessidade de mudar os homens, não os instrumentos. Os novos homens é que mudarão os velhos instrumentos.
A verdade precede à liberdade, e não existe verdadeira liberdade responsável que não se refira a uma verdade absoluta. O Papa destrói o pensamento niilista, que leva o homem a ser um animal inteligente, que orienta a sua ação só à satisfação das necessidades materiais.

Se o homem vivesse apenas desse tipo de satisfações, hoje deveria exultar, porque as conquistas da ciência e da tecnologia o levaram a níveis nunca atingidos no passado. Se o homem é apenas filho do caos ou da casualidade, que dignidade poderá pretender? A de viver o maior tempo possível, de preferência sem doenças, e nada mais. O Papa pode salvar o homem, no sentido de voltar a abrir os seus olhos para a sua dignidade real de filho de Deus.

Os instrumentos, em geral, são todos neutros. As grandes iniquidades praticadas no mundo das finanças não se deveram somente a interpretações ou aplicações erradas das normas das finanças. Em muitas ocasiões, os próprios governos apoiaram a infração de algumas regras. Os abusos verdadeiros existem porque foi permitido que existissem, não porque faltassem estruturas de controle. Existem 23 boards, estruturas de regulamentação dos mercados financeiros, do Financial Stability Board até as mais periféricas que afetam determinadas áreas geográficas. Um instituto financeiro precisa hoje submeter-se a 23 novas regulamentações imediatas, com a ameaça de sanções gravíssimas.

Estas regras já existiam antes, mas nunca foram respeitadas. É o homem quem deve progredir da ética da responsabilidade para uma ética em que ele realmente acredite no que faz. Por isto se fala hoje de emergência educativa, porque é necessário ser formados.

No sexto capítulo da Caritas in veritate encontramos uma passagem fundamental, com o mesmo espírito presente na Sollicitudo rei socialis. João Paulo II se perguntava como é que o homem tecnológico, que cresce enormemente na capacidade de elaborar técnicas e instrumentos cada vez mais sofisticados, pode gerir tais conhecimentos na imaturidade que o caracteriza. Mais uma vez, Bento XVI alerta o homem do nosso tempo para o extravio ético, a definitiva autonomia moral dos instrumentos.

Fonte: Zenit