Toda sexta feira, pela manhã, os fiéis de uma sinagoga sabiam que o rabino deles estava ausente. Não adiantava procurá-lo em casa ou no templo. Simplesmente sumia. Para onde ia ninguém tinha a menor ideia. Sobre isso, ele não falava. À tarde, voltava. Desconfiados com essa atitude do rabino, os fiéis decidiram descobrir seu segredo e colocaram uma pessoa de confiança para segui-lo. Queriam saber com quem ele se encontrava e se por acaso, por ser um homem piedoso, se encontrava com o próprio Deus. Como tinham combinado, ao entardecer daquele dia, todos estavam reunidos antes que o rabino chegasse para a cerimônia do sábado.
– Então – perguntaram ao espião – o nosso rabino subiu para o céu?
– Foi muito mais alto – respondeu o homem que o tinha seguido. Ele havia descoberto que o rabino, toda sexta feira, pela manhã, visitava uma senhora idosa e paralítica, limpava a casa dela, lavava a roupa e lhe preparava o almoço. Quando tudo estava em ordem, rezava com ela. Queria deixar a senhora contente. Finalmente voltava para casa e celebrava o sábado.
Mais uma história de bondade. O céu está mais perto do que pensamos. Quem ajuda o próximo está cada vez mais perto de Deus. É nesse sentido que entendo o evangelho deste domingo. Começa com a cura da sogra de Pedro. Depois sabemos que muitos doentes procuravam encontrar Jesus ao ponto que os discípulos lhe dizem: “Todos estão te procurando”. Jesus cura, mas não fica somente por aí. Vai para frente, em outras cidades, para anunciar o evangelho, como ele mesmo declara.
Podemos dizer que Jesus cura e ensina, mas, se misturarmos um pouco as coisas, o resultado não muda. Jesus ensina também quando cura e quando cura continua ensinando o evangelho. Afinal, a boa notícia que Jesus veio nos comunicar é uma só: o amor de Deus-Pai para com todos. Para anunciá-lo Jesus não tem limites e nem lugares privilegiados. Ele cura a sogra de Pedro dentro de casa, cura outros doentes na frente da casa, outros na rua, andando, outros na beira da piscina, outros na sinagoga. A cura é o sinal que algo de novo estava acontecendo, era o amor de Deus se manifestando, mas também era o ensinamento claro de um caminho novo: se Deus age assim, nós também devemos cuidar dos sofredores, devemos ser amorosos com quem precisa de conforto e de ajuda.
Muitas vezes nós pensamos que ser cristãos seja obedecer a um monte de regras e de normas. Talvez seja até mais fácil reduzir a fé ao cumprimento de meras obrigações. Sentimo-nos fiéis por ser obedientes e nos consideramos mais ou menos cristãos por causa disso. Quem não se encaixa no esquema, ou se julga sem condições para cumprir todos os deveres, acaba pensando não ter uma fé verdadeira e se autoexclui, muitas vezes, da comunidade cristã. Com certeza todas as regras e leis permitem nos orientarmos e organizarmos a nossa vida. Elas são necessárias porque, do contrário, viveríamos na confusão, mas não podem, e não devem, escravizar; menos ainda nos afastar de Jesus.
Por essa razão, a primeira parte do evangelho de Marcos é um grande anúncio da bondade de Deus manifestada em Jesus. Antes de propor o seu “novo” mandamento, a sua “nova” lei – que depois, sabemos, é a lei do amor a Deus e ao próximo – Jesus quis revelar o grande e infinito amor do Pai. Amor que vai além das curas físicas ou psicológicas, porque quer nos libertar da pior de todas as doenças: o pecado.
Contudo, para dizer a verdade, nós não procuramos com o mesmo afinco ser curados do pecado como procuramos ficar bons das doenças que nos acometem ao longo de nossa vida. Convencer a humanidade que precisa do amor de Deus para ser curada do pecado, raiz de todos os males, foi a difícil missão de Jesus. Após os primeiros tempos de sucesso, vieram as perseguições e a cruz. Mas Jesus nunca desistiu, foi até o fim. Ele tinha um segredo: retirar-se no deserto para rezar. Assim podia ficar a sós com o Pai. Estava na terra, mas o seu amor chegava ao céu na comunhão perfeita com o Pai na força do Espírito Santo. Ali estava a fonte de toda a sua generosidade, fidelidade e obediência.
Que bom se nós também tivéssemos um segredo que nos aproximasse mais de Deus: a oração e o amor aos necessitados. Às vezes “sumimos” para dar um tempo para descansar e nem sempre voltamos. Poderíamos “sumir” mais vezes para fazer o bem, para encontrar a Deus e ao próximo no amor e na fé.
Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá (AP)