O valor das minhas lágrimas

A teia de complexidade que envolve o viver humano é, por demais, interessante. Um misto de dor, alegria, euforia, tristeza, excitação, prazeres. Vive-se, ao longo de um dia, apenas, todas essas emoções e sentimentos. Como é difícil administrar tudo isso. Muitos conseguem, outros tentam e, uma maioria, já perdeu a coragem de se enfrentar e crescer, e mudar, e administrar-se. Muitos perdem a capacidade de perceber suas riquezas de ser e de confiar em suas possibilidades e suas intuições.

Talvez não exista um termômetro tão eficaz para um mergulho em nossa alma do que as nossas lágrimas. As lágrimas que choramos são extraídas do poço que somos nós. A lágrima tem vida própria: fala, grita, acalma, conforta, silencia, agradece, denuncia. É muito rebelde. Em certos momentos, sai sem autorização. É autônoma e só faz o que quer. Por vezes, é hipócrita, fingida, interesseira e dissimulada. Mas, nós poderíamos crescer muito se ouvíssemos mais as nossas lágrimas. Elas afloram por razões esquisitas e, sem qualquer razão também, e nenhuma força terrena pode retê-las.

Se pensarmos em todas as lágrimas que choramos ao longo de nossa vida, poderíamos nos dar conta de que construímos um diário lacrimal. Elas diriam muito de quem somos hoje. E não são as lágrimas de uma traquinagem de infância, das quedas ao aprender andar de bicicleta, da cabeça que bateu em algum lugar, de um arranhão, mas lágrimas que vêm de um lugar que nem mesmo sabemos onde, mas que ela conseguiu tocar e atingir. Cada lágrima que rola em meu rosto, é um texto de mim mesmo que acabo de escrever.

Seria muito oportuno ouvir nossas lágrimas. Elas poderiam dizer-nos que já choramos demais por motivos fúteis, que choramos demais amores impossíveis, que choramos demais situações que nem sempre podemos resolvê-las, que choramos demais e ficamos, apenas, parados esperando que outros resolvam nossos problemas, que choramos muito por orgulho e medo de pedir ajuda, que choramos muito sem motivos aparentes, o que pode ser sinal de algo mais grave.

Lágrima, também, tem gosto. É um líquido composto de água, sais minerais, proteínas e gordura. Óbvio que não é uma combinação das mais gostosas, mas a lágrima tem o gosto das nossas vitórias e conquistas, das realizações dos nossos sonhos, das dores do nosso próprio viver, das perdas inevitáveis daqueles que amamos, das desilusões que vivemos, das decepções nas amizades, do golpe da infidelidade, da sensação de não sermos ouvidos por Deus.

Nossas lágrimas são companheiras inseparáveis de nossos momentos de solidão. Começamos sozinhos, mas ela sempre chega, silenciosa, sorrateira, vai nos envolvendo, nos comovendo e, quando nos damos conta, ela já rolou. Pensamentos tristes, sentimentos doídos, tristezas mal curadas, são, por demais, insuportáveis sem a companhia de lágrimas. Mas, Deus pode nos curar num momento como esse. O choro é uma das respostas essenciais do sistema límbico, é uma experiência profunda das emoções. Jesus chamou de bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. Se a dor lhe toma, se o mundo lhe esqueceu, se os problemas são maiores que você, se o tempo parece que fechou para o seu lado, se aquela doença insiste em lhe maltratar, se o sofrimento de alguém que você ama lhe corta o coração, saiba que Jesus quer aliviar, pelas suas lágrimas, a sua dor.

O mestre também chorou! Poderia ser estranho ver Jesus chorando, mas é um momento extraordinário da humanidade de Deus. Sente como nós sentimos, chora como nós choramos. É gente como a gente. Então porque chorou? Chorou porque era hora de chorar. Há tempo pra tudo debaixo do céu, inclusive tempo de chorar. Cristão que é cristão chora. Se não chora por seus motivos, chora por motivos alheios, pois devemos chorar com quem está chorando. Somente as pessoas que já morreram nos seus sentimentos não choram. Seus corações estão tão ressecados que não conseguem escorrer uma lágrima. Pessoas assim estão mortas na sua tristeza, angústia, depressão ou até mesmo dentro de um falso sorriso. Por fim, cada lágrima é sabedoria para viver a vida. Se você seguir suas lágrimas, achara seu coração.

 

Frei Mário Sérgio dos Santos Souza, ofmcap
Salvador⁄BA