Sede perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito (Mt 5,43-46.48)
No sermão da Montanha, que São Mateus narrou nos capítulos 5, 6 e 7, e que São Lucas narrou no capítulo 6, há uma palavra de Jesus Cristo que a Igreja chamou de “regra de ouro”. Ela diz: “O que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles” (Lc 6,31). Em Mateus, Jesus acrescentou dizendo: “Esta é a Lei e os Profetas” (Mt 7,12b).
À primeira vista, pode parecer que não há tanta profundidade nessa máxima de Jesus, mas, se a examinarmos com mais profundidade, veremos que ela encerra todos os preceitos da caridade e do amor que devemos ter para com os outros. “O que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles” (Lc 6,31). Muitas vezes queremos receber dos outros um tratamento que, entretanto, não lhes oferecemos. Não gostamos, por exemplo, que falem de nós em nossa ausência, que nos julguem ou que analisem em nossos atos sem nossa presença…
Contudo, fazemos assim com os outros. Tantas vezes julgamos até as intenções dos outros e, na maioria das vezes, de maneira simplista e sem dar-lhes o direito de defesa. E, no entanto, ficamos furiosos quando fazem isso conosco. É por isso que o Senhor nos disse: “Não julgueis para não serdes julgados; porque, com a mesma medida com que julgardes, sereis também julgados” (citação livre de Lc 6,37-38). E ainda mais: “Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão, e não reparas na trave que está no teu olho? […] Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho” (Lc 6,41.42b).
A “regra de ouro” nos alerta de que se desejamos não ser julgados pelos outros, então é preciso que não o julguemos também; se quisermos ser respeitados e bem tratados pelos outros, é preciso agirmos da mesma forma para com eles; se queremos ser amados, então precisamos amar se queremos ser compreendidos e perdoados, então precisamos saber compreender os outros, ter paciência com os seus erros e perdoar as suas ofensas, a fim de sermos perdoados por Deus. A única condição que Deus nos impõe para perdoar o nosso pecado, qualquer que ele seja, é que perdoemos os pecados dos outros. A razão disso é que, sendo Pai de todos nós, Deus não pode perdoar a um filho que, por sua vez, não perdoa ao seu irmão.
São claras as recomendações de Jesus sobre isso: “Se estás, portanto, para fazer a tua oferta diante do altar e te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar e vai primeiro reconciliar-te com teu irmão; só então, vem fazer a tua oferta” (Mt 5,23-24). O pior pecado é sempre o pecado contra a caridade, contra o próximo, porque Deus tem em alta conta cada um dos Seus filhos e não quer que a nenhum deles seja negada a caridade e o perdão. É preciso aprendermos a perdoar, porque também precisaremos ser perdoados.
Quem de nós não precisa do perdão do outro? Quem de nós jamais ofendeu a alguém? Na existência da caridade Cristo vai mais longe ainda e exige dos cristãos, isto é dos Seus seguidores, amor até aos inimigos: “Tendes ouvido o que foi dito ‘Amarás o teu próximo e poderás odiar teu inimigo.’ Eu, porém, vos digo: Amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos [maltratam e] perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos. Se amais somente os que vos amam, que recompensa tereis? Não fazem assim os próprios publicanos? (…)
Portanto, sede perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,43-46.48). Cristo deixa claro que ser “perfeito” como o Pai celeste é amar também os inimigos e saber pagar-lhes o mal com o bem, e não com a vingança e o ódio. Notemos que, ao ser massacrado na Sua paixão cruenta, Cristo orava ao Pai elos Seus algozes e perdoava-lhes o terrível crime: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34a). Assim também fizeram os santos em suas vidas: jamais amaldiçoaram alguém por causa de suas ofensas e jamais pagaram o mal com o mal. Por isso tornaram-se “perfeitos” como o Pai do céu. Até mesmo quando eram martirizados, também eles, à semelhança do Mestre, oravam pelos seus carrascos. O amor supera o mal, e a caridade supera o ódio, fazendo nascer a vida e a paz. É preciso sabermos fazer da “regra de ouro” uma norma de conduta diária, para vivermos bem esta vida.“O que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles” (Lc 6,31).
Prof. Felipe Aquino
Artigos relacionados: A beleza cristã não é superficial