"DIREITO AO ABORTO?"

Lamentavelmente neste momento grave em que todo o Brasil católico se une para vencer a tentativa de se descriminalizar o aborto no país, Frei Betto, mais uma vez, atira contra a Igreja, e contra o Magistério da Igreja. Escreveu esta matéria que segue abaixo (Direito ao aborto) onde apresenta uma série de argumentos falsos em defesa do aborto em caso de estupro.

Em boa hora o Padre Jonas Eduardo MIC dá-lhe uma boa resposta, que vai aqui também transcrita com sua autorização.

 

 

 Direito ao aborto  Frei  Betto

 

Embora  contrário ao aborto, admito a sua descriminalização em certos casos, como o de  estupro, e não apoio a postura do arcebispo de Olinda e Recife ao exigir de  uma criança de 9 anos assumir uma gravidez indesejada sob grave risco à sua  sobrevivência física (pois a psíquica está lesada) e ainda excomungar os que a  ajudaram a interrompê-la.

 

Ao  longo da história, a Igreja Católica nunca chegou a uma posição unânime e  definitiva quanto ao aborto. Oscilou entre condená-lo radicalmente ou  admiti-lo em certas fases da gravidez. Atrás dessa diferença de opiniões  situa-se a discussão sobre qual o momento em que o feto pode ser considerado  ser humano. Até hoje, nem a ciência nem a teologia tem a resposta  exata. A questão permanece em aberto.

 

Santo  Agostinho (sec. IV) admite que só a partir de 40 dias após a fecundação se  pode falar em pessoa. Santo Tomás de Aquino (séc. XIII) reafirma não  reconhecer como humano o embrião que ainda não completou 40 dias, quando então  lhe é infundida a “alma racional”. 

 

Esta  posição virou doutrina oficial da Igreja a partir do Concílio de Trento (séc.  XVI). Mas foi contestada por teólogos que, baseados na autoridade de  Tertuliano (séc. III) e de santo Alberto Magno (séc. XIII), defendem a  hominização imediata, ou seja, desde a fecundação trata-se de um ser humano em  processo. Esta tese foi incorporada pela encíclica Apostolica Sedis (1869), na qual o papa Pio IX condena toda e qualquer interrupção voluntária da gravidez.

 

No  século XX, introduz-se a discussão entre aborto direto e indireto. Roma passa  a admitir o aborto indireto em caso de gravidez tubária ou câncer no útero.  Mas não admite o aborto direto nem mesmo em caso de estupro. 

 

Bernhard  Haering, renomado moralista católico, admite o aborto quando se trata de  preservar o útero para futuras gestações ou se o dano moral e psicológico  causado pelo estupro impossibilita aceitar a gravidez. É o que a teologia  moral denomina ignorância invencível. A Igreja não tem o direito de  exigir de seus fiéis atitudes heróicas. 

 

Roma é  contra o aborto por considerá-lo supressão voluntária de uma vida humana.  Princípio que nem sempre a Igreja aplicou com igual rigor a outras esferas,  pois defende o direito de países adotarem a pena de morte, a legitimidade da  “guerra justa” e a revolução popular em caso de tirania prolongada e  inamovível por outros meios (Populorum Progresio).

 

Embora  a Igreja defenda a sacralidade da vida do embrião em potência, a partir da  fecundação, ela jamais comparou o aborto ao crime de infanticídioe nem  prescreve rituais fúnebres ou batismo in extremis para os fetos abortados… 

 

Para a  genética, o feto é humano a partir da segmentação. Para a ginecologia-obstetrícia, desde a nidação. Para a neurofisiologia, só quando se  forma o cérebro. E para a psicossociologia, quando há relacionamento personalizado. Em suma, carece a ciência de consenso quanto ao início da vida  humana.

 

Partilho  a opinião de que, desde a fecundação, já há vida com destino humano e,  portanto, histórico. Sob a ótica cristã, a dignidade de um ser não deriva  daquilo que ele é e sim do que pode vir a ser. Por isso, o cristianismo  defende os direitos inalienáveis dos que se situam no último degrau da escala  humana e social.

 

O  debate sobre se o ser embrionário merece ou não reconhecimento de sua dignidade, não deve induzir ao moralismo intolerante, que ignora o drama de mulheres que optam pelo aborto por razões que não são de mero egoísmo ou conveniência social, como é o caso da menina do Recife.

 

Se os  moralistas fossem sinceramente contra o aborto, lutariam para que não se  tornasse necessário e todos pudessem nascer em condições sociais seguras. Ora,  o mais cômodo é exigir que se mantenha a penalização do aborto. Mas como fica  a penalização do latifúndio improdutivo e de tantas causas que, no Brasil,  levam à morte, por ano, de cerca de 21 entre cada 1.000 crianças que ainda não  completaram doze meses de vida?

 

“No  plano dos princípios – declarou o bispo Duchène, então presidente da Comissão  Espiscopal Francesa para a Família – lembro que todo aborto é a supressão de  um ser humano. Não podemos esquecê-lo. Não quero, porém, substituir-me aos  médicos que refletiram demoradamente no assunto em sua alma e consciência e  que, confrontados com uma desgraça aparentemente sem remédio, tentam aliviá-la  da melhor maneira, com o risco de se enganar” (La Croix, 31/3/79). 

 

O caso  do Recife exige uma profunda análise quanto aos direitos do embrião e da  gestante, a severa punição de estupros e violência sexual no seio da família,  e dos casos de pedofilia no interior da Igreja e, sobretudo, como prescrever  medidas concretas que socialmente venham a tornar o aborto  desnecessário.

 

Fonte: http://amaivos.uol.com.br/amaivos09/noticia/noticia.asp?cod_noticia=11962&cod_canal=53

 

 

Resposta a Frei Betto. – Pe. Jonas Eduardo MIC

 

 

O artigo “Direito ao aborto” do Frei Betto incorre em diversos erros graves, inaceitáveis para alguém que é noto pela sua cultura:

 

1. Segundo os dados seguros da ciência atual, a partir do momento da fecundação um novo ser vivo se faz presente em nosso mundo e em nossa história – dotado de patrimônio genético próprio, que há de se desenvolver harmonicamente em comunhão com a mãe, mas adquirindo cada vez mais independência própria. Suas potencialidades inerentes (p. ex., sistema nervoso) hão de desabrochar paulatinamente – e não se acrescentar de fora.

 

2. Os fins não podem justificar os meios, e por isso não se deve promover a eliminação direta do ser humano em estado fetal por causa de estupro – violência não se resolve com violência. Não se importa se este ou aquele teólogo pense o contrário; como diz o adágio, “Amicus platus sed magis amica veritas”.

 

3. É uma falácia afirmar que a gravidez aos 9 anos põe necessariamente a menina em risco de vida – os dados da literatura médica dizem exatamente o contrário; p.ex., recentemente uma menina deu à luz aos 11 anos; aos 14/05/1939 a peruana Lina Medina deu à luz aos 5 anos e 7 meses de idade (sic!).

 

4. O direito não pode prescindir dos ditames da lei natural (exigências éticas intrínsecas à natureza humana). Matar um inocente é anti-natural (nossa vida não nos pertence, é-nos dada e tirada por Alguém maior), e portanto pecado grave (se cometido de modo livre e consciente) e justamente condenável no âmbito cívil (crime) e eclesiástico (excomunhão).

 

5. As oscilações da Igreja a respeito do aborto ao longo dos séculos não dizem respeito à condenação, em si mesma considerada, do ato de matar diretamente um ser humano no ventre materno (Didaqué 2,2 já ensinava no século I-II d.C.: “Nâo matarás o embrião por aborto”!), mas à certeza empiricamente adquirida sobre o momento exato em que um novo ser surge no ventre materno – a matéria adequada. É ridículo querer esperar que no século IV alguém tivesse disto certeza, sem aparelhos adequados como os que dispomos apenas nas última décadas!

 

6. Certamente uma mulher pode estar fortemente abalada por causa da violência sexual que sofreu, impedindo-lhe de compreender naquele momento que o ser que carrega em seu ventre não tem culpa disto, é inocente, e tem o direito natural à vida. Cada caso há de ser considerado com o devido respeito, de modo privado; ela poderá até decidir pelo aborto sem nenhuma oscilação de mente ou vontade (consciência subjetivamente firme e objetivamente errônea), e deverá agir assim (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 1790; 1793); mas de modo algum ela pode ser induzida a pensar que tal modo de pensar é objetivamente correto; isto seria uma omissão culposa por parte daqueles que lhe acompanham.

 

7. A defesa da vida de um ser inocente – como o é uma criança de 4 meses no ventre de uma mãe, por exemplo! – não requer uma virtude “heróica”, mas decorre simplesmente da lei natural, que inclui a defesa da vida.

 

8. A legítima defesa (social ou individual) decorre do direito e dever de defender a própria integridade quando ameaçada por um agressor – como p.ex. numa guerra. Uma criança no ventre materno não é um ser humano que conscientemente está agredindo alguém! Portanto, a comparação claudica.

 

9. O aborto pode ser comparado ao infanticídio se levarmos em conta os termos utilizados pela Igreja ao falar daquele: “O aborto direto (..) é gravemente contrário à lei moral”; “gravidade do crime cometido”; “prejuízo irreparável causado ao inocente morto” (Catecismo da Igreja Católica, 1997, nn. 2271s). O fato de nao existir um rito fúnebre próprio para fetos abortados não significa que sejam desprezados pela Igreja; a liturgia também evolui, e é de se esperar que no futuro o ritual possa contemplar este caso.

 

10. Uma verdade não nega a outra. É certo que devemos defender a justiça social (p. ex., a justa distribuição das terras improdutivas), mas é outrossim certo que devemos defender a vida humana desde a fecundação (a sacralidade do ventre materno). Não há exclusão (“aut- aut”), mas complementariedade (“et -et”), como uma sadia lógica nos recorda!

 

Pe. Jonas Eduardo MIC

Curitiba, 20.3.2009.

 


Professor Felipe Aquino é viuvo, pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova. Página do professor: www.cleofas.com.br Twitter: @pfelipeaquino