A saudade é amarga e as lágrimas não podem deixar de rolar quando perdemos uma pessoa querida. Chore, pode chorar, pois chorar não é um mal, Cristo chorou quando perdeu o amigo Lázaro.
Fé não é insensibilidade e dureza de coração. Pode chorar, mas chore como quem tem fé na ressurreição.
Veremos os mortos na eternidade.
Diante da morte da pessoa amada, é preciso ver contemplar Nossa Senhora aos pés da cruz do seu Amado. Ela perdeu o Filho Único…, que é Deus, e que foi morto de uma maneira tão cruel como nenhum de nós o será. Ela perdeu muito mais do que nós e não se desesperou. Certamente chorou muito… mas nunca se desesperou e nunca perdeu a fé. Aos pés da cruz de Jesus estava de pé (stabat!). Ofereça nesta hora a sua dor a ela, e sem dúvida, ela o consolará.
Podemos chorar os mortos; as lágrimas são o tributo da natureza, mas sem desespero e sem desilusão.
Até o céu; lá nos voltaremos a ver, ensinam os santos. Que grande felicidade será para nós poder encontrá-los, depois de ter chorado tanto a sua ausência! Não nos deixemos levar ao desespero quando alguém parte; não somos pagãos. Lá não haverá mais pranto, nem lágrimas e nem luto.
São Francisco de Sales disse: “Meu Deus, se a boa amizade humana é tão agradavelmente amável, que não será ver a suavidade sagrada do amor recíproco dos bem-aventurados… Como essa amizade é preciosa e como é preciso amar na terra, como se ama no Céu!”
São Tomás de Aquino garante que no Céu conheceremos nossos parentes e amigos. Diz o santo doutor:
“A contemplação da Essência Divina não absorve os santos de maneira a impedir-lhes a percepção das coisas sensíveis, a contemplação das criaturas e a sua própria ação. Reciprocamente, essa percepção, essa contemplação e essa ação não os podem distrair da visão beatífica de Deus.” (S. Teológica, 30, q. 84).
Diz santo Agostinho que os bem-aventurados formarão uma cidade onde terão todos uma só alma e um só coração, de tal sorte que na perfeição desta unidade, os pensamentos de cada um não serão ocultos aos outros. Lá não haverá olhares indiferentes. Todos serão mutuamente amigos, na harmonia de uma intimidade deliciosa.
São Francisco Xavier, jesuíta, foi grande amigo de S. Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus. Lá das Índias, S. Francisco, sabendo que jamais veria o rosto do seu pai espiritual e melhor amigo, escreve a S. Inácio:
“Dizeis, no excesso de vossa amizade por mim, que desejaríeis ardentemente ver-me ainda uma vez antes de morrer. Ah! só Deus, que vê o interior dos corações, sabe quão viva e profunda impressão causou em minha alma este doce testemunho de vosso amor para comigo! Cada vez que me lembro dele – e isto se dá muitas vezes – involuntariamente me correm lágrimas dos olhos. Peço a Deus que se não nos tornarmos a ver na terra, gozemos unidos, na feliz eternidade, o repouso que não se pode encontrar na vida presente. De fato, não nos tornaremos a ver, senão por meio de cartas. Mas no Céu, ah! sê-lo-á face a face! E, então, como nos abraçaremos!” (Cartas de S. Francisco Xavier, XCIII, n.3).
Realiza-se assim a palavra da Escritura que diz:
“O amigo fiel é um remédio que dá a vida e a imortalidade, e os que temem o Senhor encontrarão um tal amigo” (Eclo 6,16).
Pela morte, Deus separa, por um tempo, o que uniu na terra por amor, para reunir tudo depois numa vida melhor e sem fim na eternidade.
A morte não é o aniquilamento estúpido que pregam os materialistas sem Deus, mas o renascimento da pessoa.
Só o cristão valoriza a morte e é capaz de ficar de pé diante dela. Deus não nos criou para o aniquilamento estúpido, mas para a sua glória e para o seu amor. Fomos criados para participar da felicidade eterna de Deus.
E não desesperemos da salvação de ninguém, mesmo daquele que morreu sem fé. No último instante de vida Deus pode salvar muitos. Nossa Senhora sabe conseguir para muitos, ainda que na última hora, a graça do arrependimento e da conversão.
S. Francisco de Sales dizia que “entre o último suspiro de um moribundo e a eternidade, entre Deus e a alma se passam certos mistérios de amor que só no céu conheceremos um dia”.
Vamos nos surpreender com muitos que foram salvos.
Não podemos também nos desesperar com a salvação dos que praticaram o suicídio. A Igreja nunca anunciou o nome de algum condenado, embora já tenha canonizado milhares de santos.
Na vida de S. João Maria Vianney há uma passagem maravilhosa. Uma manhã ele celebrava a santa Missa, e notou no fundo da igreja uma mulher vestida de preto, que chorava continuamente. Seu marido havia se suicidado; pulara de uma ponte e se jogou para morrer em um rio. A esposa o julgava condenado por Deus, e por isso chorava copiosamente.
Ao terminar a Missa, o santo passou pela mulher e disse no seu ouvido: “Pare de chorar. Teu marido está salvo; está no Purgatório; reze por ele.”
A mulher quis saber como Deus o tinha salvado. Ao que o Cura D’Ars lhe responde: “Lembra-se daquele oratório que voce tinha no seu quarto, com a imagem de Nossa Senhora? Lembra-se que, mesmo sem fé, ele rezou algumas vezes com você? Por causa disto Nossa Senhora conquistou para ele a graça do arrependimento, no último instante. Entre a ponte e o rio, ele se arrependeu, e Deus o perdoou.”
São Bernardo gostava de repetir que “o servo de Maria, jamais perecerá.”
Deus é Justiça e Misericórdia; mas a Misericórdia supera a Justiça. E Nossa Senhora é Mãe de misericórdia.
Providenciemos os sacramentos para os doentes graves. Devemos trazer para os doentes em risco de vida a Unção dos Enfermos, que consola, perdoa os pecados, cura, e, se for da vontade de Deus o prepara para acolher a morte sem medo. É uma grande caridade para com o que padece.
A morte nos assusta, mas é preciso saber que quem viveu no Coração de Jesus há de morrer neste Coração misericordioso, que fará prodígios nesta hora.
Um ato de resignação e confiança em Deus pode fazer do pior pecador um justo diante de Deus; é o que nos ensina a salvação do bom ladrão. Lembremos de Madalena, de Zaqueu, do filho pródigo. Por isso é preciso dar confiança aos agonizantes.
Precisamos aceitar a própria morte conformados com a vontade de Deus. Santo Afonso via nisto um gesto semelhante ao dos mártires. Pascal dizia que “a morte é a nossa última oferta a Deus”.
Na Igreja a morte é natalício; ela celebra a festa dos seus santos no aniversário de morte e não de nascimento.
Santa Teresinha disse ao morrer: “não morro, entro para a vida”.
Você já reparou como morrem os animais? Mesmo os mais fortes e ferozes se curvam silenciosos diante da morte. A águia, quando a presente, voa para o pico mais alto, e ali espera a morte; é por isso que ninguém acha uma águia morta. O leão feroz, na hora da morte, queda silencioso nas sua toca… e espera o fim em paz.
Precisamos aprender também a morrer; se preparar para a morte, em primeiro lugar vivendo bem, de acordo com a Lei santa de Deus, e em segundo lugar, aceitando-a segundo a vontade de Deus. Peça a Deus, por Nossa Senhora, São José e São Francisco, a graça de acolhe-la como “irmã”.
A árvore cai sempre do lado em que viveu inclinada; se vivermos inclinados ao Coração de Jesus, nele cairemos.
São João da Cruz, doutor da Igreja, expressa bem o sentido da morte para o santo:
“Para quem ama, a morte não pode ser amarga, pois nela se encontram todas as doçuras e alegrias do amor. Sua lembrança, não é triste, mas traz alegria. Não apavora, nem causa sofrimento, pois é o término de todas as dores e o início de todo o bem”.
Esse aspecto da morte: “término de todas as dores”, era de fato relevante para os santos, pois, para eles a vida é uma luta, como dizia São Paulo, “o bom combate” (2 Tm 4,7). É nesse sentido que o Apóstolo dizia que: “Para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Fil 1,21).
Quando nós também pudermos dizer isso, convictamente, estejamos certos de nossa santificação.
Santa Teresinha não se cansava de exclamar:
“Tenho sede do Céu, dessa mansão bem-aventurada, onde se amará Jesus sem restrições. Mas, para lá chegar é preciso sofrer e chorar; pois bem! Quero sofrer tudo o que aprouver a meu Bem Amado, quero deixar que Ele faça de sua bolinha o que ele quiser”.
São Francisco de Assis chamava docilmente a morte de “Irmã morte”. Como chegou a esta tranqüilidade diante da morte? Primeiro, é claro, pela santidade de sua vida, mas também porque aceitava a morte, e todas as coisas, sem resistir. Temos pânico da morte porque a rejeitamos radicalmente, e quanto mais a rejeitamos, mais ela se torna nossa inimiga. É por isso que ela se tornou o flagelo da humanidade, de tanto ser rejeitada. Acolhida, ela se tornou “irmã” para S. Francisco. Assim, de inimiga ela se transforma em amiga.
Prof. Felipe Aquino