A santidade é para privilegiados?

O cancaonova.com traz para você mais um programa especial com o Prefeito Emérito da Congregação para as Causas dos Santos, Cardeal José Saraiva Martins, a fim de esclarecer todas as suas dúvidas sobre a vida dos servos de Deus que viveram de forma heroica as virtudes cristãs.

A santidade não é para privilegiados. A chamada à santidade é universal, porque se dirige a todos os homens e a todas as mulheres sem exceção. Isso significa que não se destina apenas aos fiéis que se encontram em determinado estado de vida, como é o caso dos religiosos ou dos sacerdotes, mas a cada pessoa no estado e na situação em que vive. João Paulo II foi claro e categórico sobre o assunto. Ele assinalou a santidade de todos como um dos pontos fundamentais para a pastoral da Igreja do terceiro milênio. O Papa Wojtyla indicou ainda a via que cada tem de percorrer para atingir a santidade: o cumprimento fiel dos deveres familiares, profissionais e sociais, ou seja, viver em plenitude, dia após dia e até às últimas consequências, as inúmeras situações, muitas vezes, aparentemente irrelevantes, da vida ordinária. É verdade que a santidade requer o heroísmo na prática das virtudes: também é inegável que a perseverança fiel nos deveres cotidianos pode ser mais heroica do que os feitos, por vezes puramente imaginários, em que alguns pretendem ver a santidade. Uma pastoral voltada para o chamamento à santidade deverá, pois, ter como meta irrevogável ajudar todos os fiéis a descobrir a grandeza da vida ordinária, na qual justamente Deus nos quer santos.

Entendo que hoje é particularmente importante redescobrir a família, o trabalho profissional e a responsabilidade pelo bem comum da sociedade como âmbitos concretos nos quais e através dos quais se realiza a vocação para a santidade da maioria dos cristãos. Quem regressa a casa à noite, cansado do trabalho, cheio de satisfações ou de contrariedades, pode ter a tentação de ligar a televisão e se isolar do mundo que o rodeia: mas ele sabe que, precisamente nesse momento, começa a parte mais importante da sua jornada, o estar em família, partilhar alegrias e dificuldades, o interesse por aquilo que aconteceu aos outros membros da família, a ajuda nos trabalhos domésticos ou nos trabalhos escolares. Não tenho dúvidas em considerar heroica a perseverança nessa alegre dádiva de si por amor de Deus e por amor da própria família.

É asfixiante a busca da santidade concebida nestes termos? Não, de modo nenhum. O santo atinge o cerne da liberdade, exala felicidade por todos os poros e cria à sua volta um ambiente de serenidade e de paz. Não há santos de má cara, porque assim não seriam senão uma caricatura da verdadeira santidade. A santidade, por sua própria natureza, é feliz – porque mais não é do que a experiência vivida, em todo o seu radicalismo, do feliz anúncio do Reino.

(Trecho extraído do livro “Como se faz um santo”, p.16-18, de Cardeal Saraiva Martins)

Sobre o Cardeal

José Saraiva Martins nasceu a 6 de janeiro de 1932 em Gagos de Jarmelo, Portugal. Tendo entrado ainda jovem para a Congregação dos Missionários Filhos do Coração Imaculado de Maria, foi ordenado sacerdote a 16 de março de 1975. Docente de Teologia e Reitor da Pontifícia Universidade Urbaniana, durante o período da sua atividade acadêmica publicou vasta e notória obra de Teologia. Em 1988 foi nomeado arcebispo secretário da Congregação para a Educação Católica. Foi de 30 de maio de 1998 até 9 de julho de 2008 Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Elevado a cardeal pelo Papa João Paulo II em 21 de fevereiro de 2001, foi-lhe atribuído o título da basílica de Nossa Senhora do Sagrado Coração.

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