Como fazer o jejum na Quaresma?

A prática do jejum no cotidiano e na vida com Deus. 

Com o início da Quaresma retomamos três práticas comuns da Igreja: jejum, oração e caridade. Elas não se limitam apenas ao tempo litúrgico da Quaresma, mas nela ganham mais força por se tratar de um tempo forte de conversão. Jejuar era uma prática muito comum entre os judeus, seja no Antigo Testamento, ou nos tempos do Novo Testamento; até mesmo os discípulos de João Batista praticavam o jejum.

A primeira citação que encontramos no Antigo Testamento sobre o jejum está no livro do Levítico 16,29-31. Dentro de uma instituição perpétua promulgada por Moisés como o dia da expiação, o jejum aparece dentro dessa data considerada a mais importante do calendário dos israelitas no Antigo Testamento. Esse era o dia em que a expiação anual pelos pecados do povo de Israel era feita, tanto corporativa como individualmente. Um dia de jejum e de descanso: 

“Esta será para vós uma lei perpétua: No dia dez do sétimo mês deveis jejuar e não fareis nenhum trabalho, nem o nativo do país, nem o estrangeiro que habita no meio de vós. Porque nesse dia se fará a expiação por vós, para vos purificar. Diante do Senhor sereis purificados de todos os vossos pecados. Será para vós sábado, um dia de descanso absoluto em que fareis jejum; é uma lei perpétua” (Lv 16,29-31).

O antigo termo para jejuar é “afligir a alma”, e seu significado abrange não somente a abstinência dos alimentos, mas a penitência e a humilhação que dão alcance e propósito ao ato externo de jejuar. Com isso, entendemos que o jejum vai além da abstinência apenas dos alimentos, pois é uma prática que começa na alma, com o desejo de se unir a Deus e estar na Sua presença sem nenhum peso externo. Essa prática foi mudando aos poucos no decorrer dos tempos, a ponto de o profeta Isaías declarar: 

“Será este o jejum que eu prefiro, um dia em que a pessoa se humilha: curvar o pescoço como vara, ou deitar na cinza vestido de luto? É a isso que chamais de jejum, um dia agradável ao Senhor? Acaso o jejum que eu prefiro não será isto: soltar as cadeias injustas; desamarrar as cordas do jugo; deixar livres os oprimidos, acabar com toda espécie de imposição? Não será repartir tua comida com quem tem fome? Hospedar na tua casa os pobres sem destino? Vestir uma roupa naquele que encontras nu e jamais tentar te esconder do pobre teu irmão?” (Is 58, 7-9).

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O tema do jejum também foi motivo para que Jesus fosse criticado pelos fariseus e doutores da lei do seu tempo. Ele tinha se tornado apenas uma prática externa, motivo para se orgulhar e se apresentar com santidade diante dos outros. O que Jesus pede é que o ato de jejuar seja motivo para encontrar-se com Deus, crescer na intimidade e sobretudo como um gesto de conversão: “quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para que os outros não vejam que estás jejuando, mas somente teu Pai, que está no escondido. E o teu Pai, que vê no escondido, te dará a recompensa” (Mt 6,17). 

O bom e verdadeiro jejum tem significado enquanto nos aproximamos de Deus. Começa no coração e não nas atitudes externas, ele nos eleva até seu amor e por isso também nos faz olhar a nossa volta com misericórdia. Muito mais do que se abster de alimentos, o jejum é se alimentar de Deus! Despertar no coração a certeza de que o homem não vive somente de pão, mas vive de Deus mesmo, da sua Palavra e da Sua presença.  O jejum nos faz entender a dor de Deus, dor essa que é ver seus filhos distantes, preocupados com os bens deste mundo, correndo atrás do materialismo, do prazer, do possuir e se esquecendo de afligir a alma para se encontrar com Ele. Esse olhar também nos penetra e nos faz enxergar aqueles que também não têm o pão de cada dia; por isso, São Pedro Crisólogo nos diz: “O jejum é a alma da oração e a misericórdia é a vida do jejum, portanto quem reza jejue. Quem jejua tenha misericórdia”. 

A exortação do profeta Isaías e os ensinamentos de Jesus não caíram em desuso, mas continuam ressoando em nossos corações: jejue como prática de amor a Deus, como desejo de se aproximar D’Ele! Jejue como ato de misericórdia, de amor, não apenas como preceito vazio e sem vida! 

Deus abençoe você!

 

Padre Gevanildo Torres – Sacerdote e missionário da Comunidade Canção Nova. Atuação Missionária na Frente de Missão em São José dos Campos/SP.