A vida religiosa, normalmente marcada pelo silêncio e oração, também está sujeita aos riscos do ativismo. Ao doar-se nas atividades pastorais, o padre é tentado a deixar a própria espiritualidade em segundo plano – o que seria um grave prejúizo. Quem levanta esses assuntos é o doutor em Teologia Moral e membro da Comunidade Canção Nova, padre Wagner Ferreira.
O sacerdote, que concluiu os estudos de doutorado em Roma, no ano passado, também destaca a necessidade da formação permanente dos padres. “Muitas vezes, a formação que o seminarista recebe é insipiente, e precisa de um aprofundamento ainda maior”, explica.
Nessa entrevista ao noticias.cancaonova.com, padre Wagner aborda o tema central da 47ª Assembléia Geral dos Bispos do Brasil, que começa nesta semana em Itaici, bairro de Indaiatuba (SP): “Formação Presbiteral: desafios e diretrizes”.
noticias.cancaonova.com – Padre Wagner, existe uma formação continuada dos padres, após a ordenação?
Padre Wagner – A responsabilidade pela formação do presbítero diz respeito ao próprio bispo diocesano. Sem dúvida alguma, o padre precisa se interessar por sua própria formação e por sua atualização teológica, para responder aos desafios pastorais. Os bispos procuram, nas suas dioceses, promover retiros, encontros de aprofundamentos teológicos, até mesmo estudos sobre temas da atualidade, iluminados pela Sagrada Escritura e pela reflexão teológica. Aqui, no Brasil, existe essa preocupação. Os bispos estão atentos à necessidade formativa dos presbíteros.
noticias.cancaonova.com – A Assembléia dos Bispos deste ano vai tratar exatamente sobre a formação dos presbíteros, os desafios e diretrizes. O que o senhor vê como prioridade na formação dos sacerdotes?
Padre Wagner – Existe uma espécie de tentação do ativismo e, portanto, o padre se doa na atividade pastoral deixando, muitas vezes, para segundo plano a sua necessidade espiritual. O padre é um homem de Deus. Ele também traz consigo a vocação à santidade e, portanto, deve estar atento à sua espiritualidade.
O padre é, por graça de Deus, pela própria ordenação sacerdotal, chamado a ser um outro Cristo, que é e sempre será o modelo para o exercício do ministério sacerdotal. Cristo nos revela a necessidade de o padre rezar, cultivar o diálogo de amor com Deus. O padre não pode simplesmente celebrar os mistérios da salvação, através da liturgia da Santa Missa, dos Sacramentos. Ele não pode celebrar simplesmente como alguém que está dando ao povo alguma coisa, mas deve, antes de tudo, perceber que em cada Sacramento, o padre é chamado também a se dar, com Cristo, a dar ao povo um testemunho de quem realmente acolheu um chamado à santidade, a ser um outro Cristo.
A vida, a formação espiritual, acredito eu, é uma prioridade, juntamente com a formação espiritual. Nós temos que destacar a formação teológica. Muitas vezes, a formação que o seminarista recebe é insipiente, e precisa de um aprofundamento ainda maior. O padre, por causa das necessidades pastorais, muitas vezes, acaba deixando de lado a necessidade de aprofundamento teológico. Os desafios pastorais são muitos e, por isso, o padre precisa tomar o cuidado de continuar refletindo os fatos, as questões da vida, das pessoas, da sociedade e da política. Refletir tudo isso à luz da fé, da revelação e da reflexão teológica. Por isso, a atualização teológica é importante, também na formação do presbítero.
noticias.cancaonova.com – Como o senhor analisa as vocações sacerdotais hoje, na Igreja do Brasil?
Padre Wagner – A crise das vocações deve ser analisada por diversos ângulos, não é uma análise que pode ser feita de forma rápida, porque a crise das vocações traz consigo, por exemplo, os problemas que muitas famílias estão enfrentando, como divórcio, separação e desunião. Muitas famílias já perderam aquela referência importante de criar vínculo com a paróquia, com a comunidade cristã, portanto, faltam referências cristãs dentro da própria família.
Agora, não só, nós vivemos num mundo marcado por um processo de secularização, ou seja, por uma certa perda de valores cristãos, portanto os jovens acabam recebendo muitas informações, tendo contato com muitas situações da vida, da sociedade e perdendo o contato com Cristo. Nós vivemos também numa sociedade muito preocupada com a realização profissional, mas não a profissão como realização pessoal e para que a pessoa possa depois contribuir com o bem da sociedade. Mas uma preocupação com a questão do salário, ou seja, os jovens hoje correm atrás de uma profissão, de um estudo, preocupados com seu futuro econômico, com a questão material.
A questão da vocação é um tema que nem sempre é trabalhado do ponto de vista da realização pessoal, para que a pessoa possa contribuir para o bem da sociedade, mas é visto muitas vezes como vocação para que a pessoa possa ganhar a vida, ganhar dinheiro, então estes problemas estão presentes, certamente, nessa questão da diminuição do número de vocações, acredito eu, que superando estes problemas e tantos outros que nós poderíamos estar abordando nós certamente teremos um aumento no número de vocações.