Como fazemos a leitura orante da Bíblia?

Saiba como fazer a leitura orante da Bíblia e quais os princípios fundamentais para que esta produza frutos espirituais em nossas vidas.

Nesta aula do curso “Ensina-nos a orar”, Padre Paulo Ricardo nos ensina como fazemos a lectio divina, a leitura orante da Bíblia. Esta leitura orante das Sagradas Escrituras tem alguns princípios fundamentais para ser verdadeiramente o que ela se propõe a ser. Para ser uma leitura espiritual, é necessário que haja um encontro com Jesus Cristo, que é o princípio básico da oração.

Saiba como fazer a leitura orante da Bíblia e quais os princípios fundamentais para que esta produza frutos espirituais em nossas vidas.

Os discípulos de Emaús com Jesus Cristo ressuscitado

A partir deste princípio, que é o encontro com Cristo, somos conduzidos à experiência da fé. A princípio este encontro pode manifestar-se como ausência de afetos. Mas, depois que encontramos com o amor de Jesus por nós, somos impulsionados a amá-Lo de volta. Este amor pode ser, no início, superficial, fruto de uma empolgação momentânea. No entanto, se perseverarmos nesse amor, podemos encontrar a chave para nosso crescimento na vida espiritual.

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A lectio divina e o encontro com o amor Cristo

Como é que nós podemos fazer a lectio divina? Para quem não está acostumado com a linguagem, lectio divina é a leitura orante das Sagradas Escrituras[1]. Nós já falamos da leitura meditada, agora vamos para as Escrituras. Em primeiríssimo lugar, nós temos que entender: o que é importante na lectio divina é o Amor. Como aqueles discípulos que, na manhã da ressurreição, caminhavam para Emaús (cf. Lc 24, 13-35). Jesus, no caminho, ensinava-lhes as Escrituras. A partir do momento que o Senhor passou a caminhar com eles, meditando as Sagradas Escrituras, algo mudou. Depois que Jesus desapareceu, ao pensar naquilo que vivenciaram, um dos discípulos perguntou ao outro: “Não se nos abrasava o coração, quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” (Lc 24, 32). Aqui está a realidade mais importante na lectio divina: o encontro com Cristo.

A leitura divina e o despertar da fé em Cristo

É interessante que, quando Jesus aparece ressuscitado aos discípulos de Emaús, Ele o faz irreconhecível. Por que eles não O reconhecem? Porque quando o Filho de Deus ressuscita, Ele participa, de alguma forma, das propriedades divinas. Deus não é visível. Então, depois da ressurreição, o corpo e a alma de Cristo não são mais visíveis de per si. Mas, Ele pode Se mostrar. Na verdade, as aparições de Cristo ressuscitado para os discípulos foram para ressuscitar a fé deles, que tinha desaparecido. Então, Ele aparece oculto, de uma forma que eles não O reconheçam inicialmente, para que a fé vá surgindo aos poucos. E, quando a fé vai surgindo, sentem ardendo os seus corações. Então, eles reagem com o amor. E o amor deles é claríssimo. Eles saem imediatamente e voltam para Jerusalém para anunciar a ressurreição de Cristo. Ali já não havia mais aquela lerdeza e aquela lentidão com que eles caminhavam para Emaús. Não! Agora eles saem às pressas, empolgados, para Jerusalém (cf. Lc 24, 33). Já não existe mais aquela situação de morte espiritual, na qual eles se encontravam.

Assista ou ouça programa do Padre Paulo Ricardo sobre “O que é a Lectio Divina?”:

A lectio divina e o despertar do amor a Cristo

É importante que nós compreendamos que a lectio divina não é um estudo bíblico. Há pessoas que a chamam de estudo bíblico, mas não é isso. Porque o estudo é simplesmente pensar. Não que a lectio divina não tenha um pensamento por trás. Há um pensamento. Mas, acontece que o importante é o amor. Porque é o amor que nos faz progredir espiritualmente. Santa Teresa d’Ávila, no seu livro “Castelo Interior”, diz assim nas Quartas Moradas, para as irmãs que estão querendo progredir espiritualmente: “para ter benefício neste caminho e subir às moradas que desejamos, [ou seja, para que saibamos caminhar com Jesus como os discípulos de Emaús caminharam] o importante não é pensar muito, mas amar muito. E, assim, deveis fazer o que mais vos despertar o amor”[2]. Aqui está o toque importante, na lectio divina e em todas as orações que nós fazemos: fazer o que mais nos despertar o amor.

A leitura orante e a determinação de amar Deus

Santa Teresa, como grande pedagoga, olha para suas monjas e lhes ajuda a compreender uma realidade fundamental para a leitura orante da Bíblia e para a vida de oração como um todo:

É possível que não saibamos o que é amar; isso não me espantaria muito, porque o amor não está no maior gosto, mas na maior determinação de desejar contentar a Deus, em procurar, na medida do possível, não ofendê-Lo e em pedir-Lhe o aumento contínuo da honra e da glória do Seu Filho, bem como a prosperidade da Igreja Católica[3].

Santa Teresa diz assim: o amor não está no gosto. Às vezes, as pessoas procuram leituras espirituais que provoquem afetos. Às vezes os afetos estarão presentes. Às vezes acontece que o Cristo nos visita e esse toque da graça em nossa alma provoca reações físicas, sensíveis, afetivas. Mas, nem sempre é assim. Portanto, o gosto pode não estar presente. Mas, é importante que nós, ao vermos o amor de Cristo, nos determinemos em agradá-Lo. O importante, quando vamos fazer a lectio divina, é conhecer Aquele que nos amou e, então, mudar a nossa vontade. Aqui está a chave: mudar a nossa vontade para adequá-la à d’Ele. Dessa forma, haverá um verdadeiro matrimônio espiritual. Aí haverá essa conexão com Jesus. Temos que estar dispostos a ir para o horto das Oliveiras com Cristo, para mudar a nossa vontade e fazer a vontade d’Aquele que nos amou. Usando a linguagem de Santa Teresa, necessitamos duma “determinada determinación[4], ou seja, dessa vontade de, em tudo, agradá-Lo e procurar não ofendê-Lo. Se a lectio divina vai ser bem-feita, ela precisa mudar a nossa vida.

Assista ou ouça aula do Padre Paulo Ricardo sobre “Leitura meditada – Como rezar com as Sagradas Escrituras?”:

Oração (soneto) de Santa Teresa d’Ávila: “Não me move”

Não me move, Senhor para Te amar

O Céu que me prometestes

Nem me move o inferno tão temido

Para deixar por isso de Te ofender.

Tu me moves, Senhor,

Move-me ver-Te

Pregado em uma Cruz e escarnecido

Move-me ver teu Corpo tão ferido,

Movem-me tuas afrontas e tua morte.

Move-me enfim o teu amor,

E de tal maneira,

Que ainda que não houvesse Céu eu Te amaria,

E ainda que não houvesse inferno Te temeria.

Nada tens que me dar para que eu Te queira,

Pois mesmo que eu não esperasse o que espero,

O mesmo que Te quero

Eu te quereria[5].

Santa Teresa de Jesus, rogai por nós!

Transcrição e adaptação: Natalino Ueda, escravo inútil de Jesus em Maria.

Links relacionados:

TODO DE MARIA. Mudar de vida com o Projeto Segunda Morada.

TODO DE MARIA. Padre Paulo Ricardo ensina-nos a orar.

TODO DE MARIA. Purificar: inteligência, memória e vontade.

Referências e nota:


[1]  A expressão, em latim, lectio divina significa “leitura divina” ou “leitura espiritual”, ou ainda “leitura orante da Bíblia”. Os princípios da lectio divina foram criados por volta do ano 220 e praticados por monges católicos, especialmente nas regras monásticas dos santos: São Pacômio, Santo Agostinho, São Basílio e São Bento.

[2]  SANTA TERESA DE JESUS. Castelo Interior, Quartas Moradas, C 1, 7.

[3]  Idem, ibidem.

[4]  SANTA TERESA DE JESUS. Caminho de Perfeição, C 21, 2.

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