Maria Lata D’Água vira ‘sambista de Deus’...

Mulata que ficou famosa no RJ por sambar com lata na cabeça é exemplo de vida para os mais jovens

Xandu Alves
Cachoeira Paulista

A lata d’água desceu o morro sambando, ganhou o mundo gingando e agora repousa embalada pelas asas do Espírito Santo. Uma das mulatas mais famosas do Carnaval carioca, Maria Lata D’Água, trocou as serpentinas pelo rosário de Nossa Senhora. O samba enredo deu lugar às orações.

A mulher que gritava às multidões: “Olha a nega chegando” passou a pedir silenciosamente, em nome de Jesus Cristo: “Dai-me almas”.

Maria Mercedes Chaves não se envergonha do passado no mundo do samba. Ela, que enfrentou toda sorte de infortúnios, venceu as próprias misérias para se fazer testemunho de vida. Aos 77 anos, a passista vaidosa que encantou o mundo nas décadas de 50, 60 e 70 continua gostando da beleza, mas aquela que espelha Deus para os outros. “Tudo que fiz de errado Deus fez virar adubo para nascer a nova árvore.”

Prostituição. Maria Mercedes nasceu numa família pobre em Diamantina (MG), onde aprendeu a levar latas de água na cabeça. A prática lhe abriria as portas do sucesso.
Ao se mudar para o Rio de Janeiro, conheceu a vida dos morros. Fugiu de casa aos 13 anos e passou a se prostituir e a beber. O rosto bonito e o corpo de passista encantavam os clientes. Um deles a levou para fazer shows de samba. Foi quando a lata d’água reapareceu em sua vida. “Tivemos que improvisar num show em um circo. Me lembrei da lata de água e sai sambando com ela na cabeça”, lembra.

Deus. O sucesso do número a levou para palcos cada vez mais importantes, no Brasil e na Europa. Conheceu artistas e tornou-se a Maria Lata D’Água, imortalizada no samba “Lata d’água”, de Luís Antonio e Jota Júnior, de 1952.

As apresentações e o casamento com um suíço a fizeram morar na Europa por 30 anos. Voltou ao Brasil em 1982, pendurou as chuteiras em 1990 e ficou viúva em 2001. Três anos depois, decidiu morar em Cachoeira Paulista, perto da comunidade católica Canção Nova, que tanto gostava.

Tornou-se evangelizadora e intercessora, e exemplo de vida. Garante que não se arrepende. “A vida que tive me trouxe para Deus”, afirma Maria Mercedes, com a lata d’água de volta à cabeça, dessa vez com símbolos cristãos. “A alegria que tinha no carnaval é a mesma de agora, só que para atrair almas para Deus”.