Conheça o livro “Meditações e Devoções”, que contém todos os escritos destinados à oração pessoal do Bem-aventurado Cardeal Newman.
O livro “Meditações e Devoções”, do Bem-aventurado Cardeal John Henry Newman, reúne todos os escritos destinados à sua oração e devoção pessoais. Por providência divina, estes escritos chegaram até nós porque o Cardeal gostava de escrever em seus momentos de oração. Ele dizia que meditava melhor com caneta e papel na mão. Neste livro, encontraremos orações tradicionais da Igreja, como Ladainhas, a Via-sacra meditada por Newman, e outras orações riquíssimas da espiritualidade tradicional, que fazem parte de nosso patrimônio de fé e devoção da Igreja Católica. No entanto, o que enriquece espiritualmente o livro é que este contém textos com orações e meditações profundíssimas de Cardeal Newman.
Estes escritos originais do Beato, frutos da experiência de oração pessoal, de um coração que fala ao Coração de Deus1, fazem do livro “Meditações e Devoções” muito mais do que um simples livro clássico de oração e devoção. Nas suas orações de meditações, temos um reflexo da experiência profunda de Newman com Deus, que nos permitirá “entrar na sua compreensão da vida cristã como chamada à santidade, experimentada como intenso desejo do coração humano de entrar em comunhão com o Coração de Deus”2.
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Uma breve biografia do Cardeal John Henry Newman
John Henry Newman nasceu em Londres, na Inglaterra, no dia 21 de Fevereiro de 1801. O seu pai, John Newman era banqueiro, pertencente a antiga família inglesa, era indiferente em matéria de religião. A mãe, Jemina Foudrinier, era de origem francesa e de religião calvinista. Ainda em sua infância, Henry Newman converteu-se ao calvinismo. Na sua juventude, em sua busca incansável pelo verdadeiro cristianismo, passou para a igreja Anglicana e nela foi ordenado sacerdote em 1824.
Nem o protestantismo nem o catolicismo lhe agradavam, pois o primeiro lhe parecia ceder ao liberalismo e ao racionalismo, enquanto o segundo era menosprezado em seu país como acervo de superstições romanas. Newman pensou num meio-termo, que seria a vivência da doutrina e da espiritualidade dos Padres da Igreja, dos grandes escritores e Santos dos primeiros séculos, às quais teve acesso e era grande conhecedor. Em decorrência desta tendência, John fundou o “Movimento de Oxford”, em parceria com amigos anglicanos, no qual dedicava-se ao estudo da literatura e da história da Igreja Antiga.
O trabalho incansável de pesquisa dos Padres da Igreja levou Newman a ver que o verdadeiro cristianismo, que procurava desde a sua juventude, estava na Igreja Católica, confiada por Jesus Cristo a São Pedro e aos seus sucessores, os Bispos de Roma. Os escritos da Patrística levaram-no a reconhecer que, tanto o Arianismo, do século IV, o Nestorianismo e o Monofisismo, do século V, quanto o Protestantismo, do século XVI, eram heresias, que diziam não às verdades do cristianismo.
John Henry Newman converteu-se ao catolicismo em 1845 e foi ordenado sacerdote católico em Roma, um ano depois, o que o levou a uma existência atribulada, pois nem sempre foi compreendido, dentro e fora da Igreja Católica. Ainda na Cidade Eterna, Padre Newman fez-se membro da Congregação do Oratório, fundada por São Felipe Neri. De volta à sua pátria, viveu muitos anos dedicados à pregação, à direção espiritual e à apologética. Mesmo com sua fidelidade ao Santo Padre e à doutrina e aos dogmas da Igreja Católica, havia pessoas que consideravam Newman um elemento perigoso para o catolicismo na Inglaterra. Depois de muitos anos, em 1879, como que em desagravo das incompreensões sofridas, o Papa Leão XIII conferiu o título de Cardeal ao Padre John Henry Newman, o que suscitou o contentamento dos católicos de língua inglesa em geral.
Cardeal Newman, homem singular, que na sua época nem sempre foi compreendido, mas cujo vulto emerge à distância, como o de uma figura brilhante, faleceu em 11 de agosto de 1890. Vítima de doenças próprias da idade, Newman faleceu em odor de santidade, após viver destemidamente o que diz a sua inscrição sepulcral que ele mesmo formulou: “Ex umbris et imaginibus in veritatem. [frase em latim, que significa:] Das sombras e imagens para a verdade”3. m Em 19 de Setembro de 2010, o Papa Bento XVI beatificou John Henry Newman, 120 anos depois de sua morte4.
Nesta ocasião, durante a homilia, o Santo Padre recordou-nos que a fidelidade à oração nos transforma gradualmente na imagem divina, como escreveu Newman num dos seus belíssimos sermões:
O hábito da oração, que é a prática de se dirigir a Deus e ao mundo invisível em cada época, em todos os lugares, em qualquer emergência, a oração, digo, possui aquilo que pode ser chamado um efeito natural no espiritualizar e elevar a alma. Um homem já não é o que era antes; gradualmente… interiorizou um novo sistema de ideias e tornou-se impregnado de princípios límpidos5.
Assista ou ouça programa do Padre Paulo Ricardo sobre “O protestantismo”:
A história e o conteúdo do livro “Meditações e Devoções”
O livro “Meditações e Devoções” é o primeiro volume de uma coleção, que tem como principais títulos: “O Ensaio sobre o desenvolvimento da doutrina cristã”, “A ideia da Universidade”, “Gramática do assentimento”, “Apologia pro vita sua”, além de dezenas de volumes de sermões e palestras. Estas são as suas obras mais conhecidas, que fazem jus à sua fama de pensador.
Em Meditações e Devoções, estão reunidos, postumamente, todos os escritos destinados à oração e devoção pessoais do Cardeal Newman, que estavam desenvolvidos suficientemente para serem editados. O próprio Beato tinha o desejo, que não conseguiu realizar em vida, de escrever um livro anual de devoções para leitura e meditação de acordo com a época e as festas litúrgicas do ano. “Depois da sua morte, os padres William Neville, Ryder e Eaglesim, tal como Newman membros da Congregação do Oratório, organizaram e os encaminharam para publicação”6.
Muitos dos escritos de Newman, especialmente a maioria das Meditações, tornaram-se conhecidos devido às circunstâncias que acompanharam as suas origens:
Era costume do Cardeal anotar rapidamente qualquer pensamento que lhe ocorria particularmente durante a meditação, para que pudesse refletir sobre ele durante o dia ou retomá-lo no futuro; e, assim, era levado a expandir esses pensamentos, escrever as notas por extenso e reescrevê-las cuidadosamente (pois ele sempre dizia que meditava melhor com uma caneta na mão). É principalmente este costume do Cardeal, de manter a torrente de santos pensamentos ao seu alcance, que devemos, segundo me parece, a preservação da maior parte deste volume [Meditações e Devoções]7.
Encontramos no livro “Meditações e Devoções”: um conjunto de meditações mais longas para o mês de Maio, centradas na Virgem Maria; outro sobre São Felipe Neri; dois conjuntos de meditações sobre a Via Sacra; as meditações para oito dias, destinadas para serem a base para um pequeno retiro espiritual pessoal; uma série de ladainhas e outras preces para oração vocal; meditações sobre a doutrina cristã, e alguns documentos pessoais relativos à sua morte, a título de conclusão. Nesta primeira edição do livro, publicado pela editora Molokai, foi acrescentado, como apêndice, o famoso poema “O sonho do ancião”, no qual Newman especula o caminho que a alma percorre entre a morte e o juízo particular. Este poema era destinado originalmente a fazer parte do livro que o Cardeal desejava publicar, como parte da devoção às almas do purgatório, própria do mês de Novembro, mas acabou sendo publicado à parte.
Uma reflexão de Newman sobre a Imaculada conceição da Virgem Maria
John Henry Newman foi primeiramente calvinista, depois anglicano e, por fim, tornou-se católico. Poderíamos pensar que, por causa de ter nascido em berço protestante, ao fazer-se católico, Newman teria dificuldades com as devoções católicas aos santos, especialmente a Nossa Senhora. No entanto, o que vemos no pensamento e na espiritualidade do Beato é uma profunda devoção aos santos, dos quais destacamos São Felipe Neri, fundador da Congregação do Oratório, da qual fazia parte, e especialmente a Santíssima Virgem Maria. O motivo desta conversão extraordinária ao catolicismo é justamente o que o fez compreender que a Igreja Católica é a verdadeira Igreja de Jesus Cristo: a Tradição da Igreja, o ensinamento dos Santos Padres. Ao estudar os escritos da Igreja nascente, Newman compreendeu que para interpretar as Sagradas Escrituras é necessário conhecer os Padres da Igreja. A partir deste princípio, somos convidados conhecer uma reflexão do Beato sobre a Imaculada Conceição de Maria, em forma de diálogo com um protestante:
Agora eu gostaria de observar por que cito assim os Padres e a Escritura. Não para provar a doutrina, mas para livrá-la de qualquer improbabilidade monstruosa que faria uma pessoa hesitar a aceitar as declarações da Igreja. Um protestante está apto a dizer: “Ó, eu realmente nunca, nunca poderia aceitar tal doutrina das mãos da Igreja, e prefiro mil vezes determinar que a Igreja se equivocou, do que tão terrível doutrina fosse verdade”. Agora, meu bom homem, por que? Não vai embora em uma agitação tão notável, como um cavalo recuando de não sabe o quê. Considera o que eu disse. É, afinal, certamente irracional? É certamente contra a Escritura? É certamente contra os Padres primitivos? É certamente idólatra? Eu não posso deixar de sorrir ao colocar as perguntas. Pelo contrário, algo não pode ser dito sobre isso partir da razão, da piedade, da antiguidade, a partir do texto inspirado? Pode ser que não vejas nenhuma razão para acreditar na voz da Igreja; podes não ter ainda atingido a fé nela – mas o que esta doutrina tem a ver com abalar a fé nela, se tiveres fé, ou com voltar-se a ela se estás começando a pensar que pode ser de Deus, é mais do que minha mente pode compreender. Muitas, muitas doutrinas são muito mais difíceis que a Imaculada Conceição. A doutrina do pecado original é indefinidamente mais difícil. Maria simplesmente não tem essa dificuldade. Não há nenhuma dificuldade em acreditar que uma alma esteja unida a carne sem pecado original; o grande mistério é que todos nascem com ele. Nosso ensino sobre Maria tem apenas uma dificuldade menos do que o nosso ensino sobre o estado da humanidade em geral. Digo distintamente – pode haver muitas desculpas no último dia, boas e ruins, por não ser católico; uma eu não posso conceber:
“Ó Senhor, a doutrina da Imaculada Conceição era tão depreciativa a Vossa graça, tão inconsistente com Vossa Paixão, tão em desacordo com a Vossa palavra em Gênesis e no Apocalipse, tão diferente do ensinamento dos Vossos primeiros santos e mártires, para me dar o direito de rejeitá-la em todos os riscos, e Vossa Igreja para ensiná-la. É uma doutrina a respeito de que meu julgamento privado justifica-se plenamente em oposição ao julgamento da Igreja. E este é o meu argumento por viver e morrer protestante”8.
Quem pode avaliar a santidade e perfeição dela, que foi escolhida para ser a Mãe de Cristo? Se para o que tem, mais é dado, e santidade e graça divina caminham juntos (isso nos é expressamente dito), o que deve ter sido a pureza transcendente dela, a quem o Espirito Criador dignou-se cobrir com Sua presença milagrosa? O que devem ter sido os dons dela, que foi escolhida para ser a única parente próxima terrena do Filho de Deus, a única a quem Ele estava compelido por natureza a reverenciar e respeitar; a designada para criá-lo e educá-lo, para instruí-lo dia após dia, à medida que crescia em sabedoria, estatura? Esta contemplação revolve a um assunto maior, que nos atrevemos a observar; pois qual você acha que foi o estado santificado da natureza humana da qual Deus formou Seu Filho sem pecado; sabemos que “o que é nascido da carne é carne”, e que “ninguém pode tirar uma coisa pura de uma impura?”.
[…] Nada é tão calculado para imprimir em nossas mentes que o Cristo é realmente participante da nossa natureza, e em todos os aspectos homem, exceto no pecado, do que associá-lo com o pensamento dela, por cujo ministério Ele se tornou nosso irmão9.
Assista ou ouça programa do Padre Paulo Ricardo sobre “Por que os protestantes não acreditam na santidade?”:
Meditando no Sábado sobre a Virgem Maria
Na tentativa de ensinar um jovem inválido a meditar, Henry Newman deixou-nos como legado as suas “Meditações para oito dias”. Em uma destas, na meditação do Sábado, o Beato nos ensina a pensar em Maria vestida de branco, como o lírio, e dizer:
Tu, Maria, és a Virgem das Virgens. Ter uma alma virgem é amar nada na terra em comparação a Deus, ou exceto por Sua causa. A alma virginal está sempre à procura seu amado que está no Céu, e o enxerga em tudo o que é belo na Terra, amando seus amigos terrenos, mas no seu devido lugar, como os Seus dons e representantes, mas amando Jesus com amor soberano, e suportando perder tudo para poder ficar com Ele.
Ó Maria, eu gostaria de saber como te comportavas com teu pai e mãe, especialmente com Santa Ana; e, então, como te comportaste com os sacerdotes do templo; e, em seguida, com São José; e então com Santa Isabel, e São João Batista; e depois com os Apóstolos, especialmente São João. Queria ver como eras doce e afável a cada um deles; mas ainda assim teu coração estava só com Jesus. E todos eles sentem e compreendem isso, independente do quão gentil foste com eles.
Ó Maria, quando vais obter para mim um pouco dessa pureza celestial, esta verdadeira brancura da alma, para que eu possa colocar o meu coração no meu Verdadeiro Amor?10
As meditações de Newman sobre a Ladainha de Loreto para o mês de Maio
Assim, reconhecemos nesta preciosa obra: “Meditações e Devoções”, o pensamento e a devoção de Cardeal Newman, que foi uma espécie de antídoto contra o racionalismo e principalmente o iluminismo, que exerceram grande influência em seu tempo. Em nossos dias, suas meditações e devoções continuam a nos ajudar a encontrar Deus, em uma sociedade cada vez mais confusa em meio às ideologias. Particularmente preciosas são as suas “Meditações sobre a Ladainha de Loreto para o mês de Maio”, mês da Virgem Maria. Newman propõe uma meditação para cada dia de Maio, ajudando-nos a viver com fé e devoção este mês dedicado a Mãe de Deus. Que as “Meditações e Devoções” de Newman nos ajudem a amar Jesus Cristo, Nossa Senhora e a Santa Igreja, como ele amou. Beato John Henry Newman, rogai por nós!
Natalino Ueda, servo inútil de Jesus por Maria.
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Referências e notas:
1 O Cardeal Newman tinha como lema a frase em latim “Cor ad cor loquitur”, que traduz-se por “o Coração fala ao coração”.
2 CARDEAL NEWMAN. Meditações e Devoções, p. 17 (Palavras do Papa Bento XVI por ocasião da Beatificação de John Henry Newman, em 19 de Setembro de 2010).
3 FÉ COM VIRTUDES. Conversões: o cardeal John Henry Newman.
4 Cf. PAPA BENTO XVI. Santa Missa com a Beatificação do Venerável Cardeal John Henry Newman.
5 Idem. Parochial and plain sermons, IV, 230-231.
6 CARDEAL NEWMAN. Meditações e Devoções, p. 16.
7 Idem, ibidem.
8 Extrato do sermão proferido na Universidade de Oxford, em 25 de março de 1832.
9 CARDEAL NEWMAN. Meditações e Devoções, p. 73-75.
10 Idem, p. 163.