A consagração e a alegria de Maria

A saudação do Anjo a Virgem Maria é um convite à verdadeira alegria, que não passa, pois tem seu fundamento na consagração total a Deus.

A consagração e a alegria da Santíssima Virgem MariaA saudação angélica a Santíssima Virgem Maria: “Alegra-te” (Lc 1, 28) – o seu “sim” e a consagração total à vontade do Pai (cf. Lc 1, 38) – ressoa por todos os séculos como anúncio da alegria pela vinda de Deus ao mundo. A promessa feita à Filha de Sião: “Grita de alegria, filha de Sião! Canta, Israel! Alegra-te e exulta, de todo o coração, ó filha de Jerusalém!” (Sf 3, 14-17), reaparece na narrativa da anunciação da concepção virginal de Maria e do nascimento do Filho de Deus (cf. Lc 1, 26-38). As palavras do profeta Sofonias tornam compreensível o alegra-te dito pelo Anjo a Maria de Nazaré: “Alegra- te, cheia de graça! O Senhor está contigo” (Lc 1, 28). Esta saudação aparece quatro vezes na tradução grega do Antigo Testamento (Sf 3, 14; Jl 2, 21; Zc 9, 9; Lm 4, 21) e está ligada ao anúncio da alegria messiânica, da vinda do Messias.

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Na saudação do Anjo, o próprio Deus saúda Nossa Senhora e, nela, todo povo de Israel, a humanidade inteira. Esta saudação é convite à alegria mais profunda. A nova alegria que provém de Deus rompe o velho e infindável luto do mundo: “O fundamento da nossa tristeza é a caducidade do nosso amor, a supremacia da finitude, da morte, do sofrimento, da maldade, da mentira; é a nossa solidão num mundo contraditório, no qual os misteriosos e luminosos sinais da bondade de Deus, irrompendo pelas frinchas do mundo, são postos em causa pelo poder das trevas, o qual ou faz com que se atribua o mal a Deus ou faz com que Deus pareça ausente” (Joseph Ratzinger, Maria, a primeira Igreja, p. 63).

O motivo da alegria de Maria é dito pelo Anjo logo após a saudação: “O Senhor está contigo” (Lc, 1, 28). Para compreender o sentido da Anunciação, devemos recorrer aos textos do Antigo Testamento, especialmente o livro de Sofonias (cf. Sf 3, 14-17). Estes contém sempre uma dupla promessa dirigida ao Povo de Israel, à Filha de Sião: Deus virá como Salvador e virá habitar nela. O diálogo com o Anjo retoma e concretiza essa dupla promessa. O que é dito na profecia a respeito da Filha de Sião, vale agora para Maria. Ela é equiparada à Filha de Sião, é a Filha de Sião em pessoa. Jesus, a quem Maria dará à luz, é equiparado a YHWH, aquele cujo nome não se podia pronunciar, o Deus vivo.

A saudação do Anjo, que é o centro da mariologia, não pensada pelo homem, levou-nos ao seu fundamento teológico: “Maria é identificada com a Filha de Sião, com a Esposa, que é o Povo de Deus. Tudo que é dito na Bíblia da ecclesia [Igreja] vale para Maria, e vice-versa: o que a Igreja é e deve ser, é por ela apreendido na contemplação de Maria. Esta é o seu espelho, a verdadeira medida de sua natureza, porque existe à medida de Cristo e de Deus, ‘habitada’ por ele. E para que existiria a Igreja senão para ser habitação de Deus no mundo? Deus não age com coisas abstratas. Ele é Pessoa e a Igreja é pessoa. Quanto mais nós e cada um de nós nos tornamos pessoa, pessoa no sentido da inabitação de Deus em nós, filha de Sião, tanto mais seremos um e tanto mais seremos Igreja, e tanto mais a Igreja será ela própria” (Joseph Ratzinger, Maria, a primeira Igreja, p. 64).

Assim, a saudação do Anjo: “Alegra-te” (Lc 1, 28) não só foi causa de alegria para a Virgem Maria, mas também é a causa da nossa alegria. Pois, de Maria nasceu nosso Salvador, Jesus Cristo autor e consumador de nossa fé. A Santíssima Virgem é templo de Deus, é a primeira Igreja. Por isso, a piedade e o culto a Nossa Senhora, em seu sentido mais autêntico, consiste em sermos aquilo que ela foi e ainda é: Igreja. A verdadeira devoção a Maria significa nos assemelhar a ela, ou seja, sermos Igreja, templo da Santíssima Trindade, habitação de Deus no mundo. Nos consagremos a Nossa Senhora, para que sejamos cada vez mais semelhantes a ela: totalmente consagrada a Deus e templo vivo de Jesus Cristo.

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