O Ano do Laicato e a vocação universal à santidade

No mês das vocações deste Ano do Laicato, meditemos sobre a vocação universal à santidade.

Neste Ano do Laicato[1], no mês de agosto, dedicado às vocações, é muito oportuno falar da vocação universal à santidade, manifestada explicitamente no Concílio Vaticano II através da Constituição Dogmática Lumen Gentium: “…os cristãos de qualquer estado ou ordem, são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade”, ou seja, à santidade. Falar sobre a vocação universal à santidade é ainda mais oportuno neste domingo em que celebramos a vocação dos leigos.No mês das vocações deste Ano do Laicato, meditemos sobre a vocação universal à santidade.

Na Igreja Católica, os fiéis leigos são a maioria e, por isso, é muito importante falar da vocação de todos nós, católicos, à santidade. Ademais, as vocações ao sacerdócio e aos ministérios ordenados, bem como ao matrimônio, à família e à vida consagrada, tem sua origem entre os fiéis leigos. A maioria dessas vocações inclusive é dos leigos, pois somente os bispos, sacerdotes e diáconos fazem parte do clero. Os que responderam ao chamado de Deus à vocação religiosa, missionária, matrimonial ou celibatária são leigos.

Inscreva-se e receba o conteúdo deste blog gratuitamente em seu e-mail.

A vocação universal à santidade

Este chamado universal à santidade está presente entre o Povo de Deus desde o Antigo Testamento. Desde a era apostólica, havia essa consciência, como podemos ver da primeira carta de São Pedro, que exorta-nos à santidade e cita o trecho do livro do Levítico no qual o próprio Deus faz este chamado aos israelitas: “A exemplo da santidade daquele que vos chamou, sede também vós santos em todas as vossas ações, pois está escrito: ‘Sede santos, porque eu sou santo’” (1 Pd 1, 16; cf. Lv 11, 44; 19, 2; 20, 7).

Nosso Senhor Jesus Cristo não veio ao mundo para abolir a lei ou os profetas, mas para levá-los à perfeição (cf. Mt 5, 17). Por isso, Ele reafirmou este chamado divino à santidade ao falar da nova lei comparada à antiga: “sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48).

Somos todos chamados à santidade, por isso, recebemos o Espírito Santo, que nos move interiormente a amar Deus com todo o coração, com toda a alma, com todo o espírito e com todas as forças (cf. Mc 12,30) e a amar-nos uns aos outros, como Cristo nos amou (cf. Jo 13,34; 15,12).

O que é a santidade?

Santidade consiste em amar, em ultrapassar os limites impostos pelo legalismo dos fariseus, de somente cumprir os mandamentos, como propôs Jesus a um jovem: “Se quiseres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e segue-me” (Mt 19, 21). Neste caso, o Senhor chamou o jovem a renunciar a tudo, vender todos os seus bens, para segui-Lo de forma mais radical. Mas, esta passagem pode aplicar-se a todos nós, no sentido de despegar-nos dos bens terrenos para buscar as coisas do Reino dos Céus.

O Padre António Royo Marín, OP († 2005), dominicano, grande sistematizador da teologia tomista, dedicou preciosas linhas à vocação universal à santidade em sua obra “Espiritualidad de los Seglares”. O Sacerdote define a santidade de três modos: a) o santo é “quem alcançou a perfeita identificação com a vontade de Deus”; b) “quem alcançou a perfeição da caridade”; e c) “quem alcançou a plena configuração a Jesus Cristo”[2].

Nesse caminho de santificação, a Igreja sempre discerniu três vias, – ou três graus de caridade – chamadas tradicionalmente de: purgativa, iluminativa e unitiva. Essa distinção se encontra nos ensinamentos de muitos santos, como Santo Agostinho, e foi convenientemente explicada por Santo Tomás de Aquino:

Os diversos graus de caridade distinguem-se pelos diversos esforços aos quais o homem é conduzido para o progresso da sua caridade. Primeiramente, sua principal preocupação deve ser afastar-se do pecado e resistir aos atrativos que o conduzem para o que é contrário à caridade. E isso é próprio dos incipientes, que devem alimentar e estimular a caridade, para que ela não se perca. – Depois, vem uma segunda preocupação, que leva o homem principalmente a progredir no bem. Tal preocupação é própria dos proficientes, que visam sobretudo fortificar sua caridade, aumentando-a. – Enfim, a terceira preocupação é que o homem se esforce, principalmente, por unir-se a Deus e gozá-lo. E isso é próprio dos perfeitos, que ‘desejam morrer e estar com Cristo’[3].

Como viver a busca pela santidade?

A Igreja recorda-nos da recomendação com que o Apóstolo São Paulo, incitando os fiéis à perfeição da caridade, exorta-nos a ter sentimentos semelhantes aos de Jesus Cristo, que “…aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e assemelhando-se aos homens. E, sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte…” (Fil. 2, 7-8) e, “sendo rico, por nós Se fez pobre” (2 Cor 8, 9).

Sendo necessário que sempre e em todo o tempo imitemos esta caridade e humildade de Jesus Cristo, e delas demos testemunho, a santa mãe Igreja alegra-se de encontrar no seu Corpo Místico muitos homens e mulheres que seguem mais de perto o abatimento do Salvador e mais claramente o manifestam, abraçando a pobreza na liberdade dos filhos de Deus e renunciando às próprias vontades: “em matéria de perfeição, sujeitam-se, por amor de Deus, ao homem, para além do que é de obrigação, a fim de mais plenamente se conformarem a Cristo obediente”[4].

Portanto, todos nós somos chamados e, de certa forma, obrigados a tender à santidade e à perfeição do próprio estado de vida. Sendo assim, procuremos ordenar retamente os nossos próprios afetos, para não sermos impedidos de avançar na perfeição da caridade pelo uso das coisas terrenas e pelo apego às riquezas, em oposição ao espírito da pobreza evangélica, segundo o conselho do Apóstolo dos gentios: “…os que compram, como se não possuíssem; os que usam deste mundo, como se dele não usassem. Porque a figura deste mundo passa” (1 Cor. 7, 30b-31).

Que a Santíssima Virgem Maria – aquela que viveu a perfeição da caridade de modo inigualável – nos ajude a ultrapassar os limites da obrigatoriedade, a amar ao Senhor, nosso Deus, de todo o coração, de toda a alma, de todo o espírito e com todas as forças, e a amar o próximo como a nós mesmos (cf. Mc 12, 30-31).

Links relacionados:

PADRE PAULO RICARDO. Engenharia da Santidade.
TODO DE MARIA. A consagração e a santidade.
TODO DE MARIA. O segredo de santidade de João Paulo II.

Referências:


[1]  A Igreja Católica no Brasil celebra, no período de 26 de novembro de 2017, Solenidade de Cristo Rei, a 25 de novembro de 2018, o “Ano do Laicato”.
[2]  PADRE PAULO RICARDO. 50 anos do Concílio Vaticano II: vocação universal à santidade.
[3]  SANTO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica, II-II, q. 24, a. 9. In PADRE PAULO RICARDO. 50 anos do Concílio Vaticano II: vocação universal à santidade.
[4]  CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Dogmática Lumen Gentium, 42.

Comments

comments