“Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos céus!” (Mt 5, 10).
Em tempos, nos quais nós cristãos continuamos a ser perseguidos, ameaçados; em muitos países sofremos violências, torturas, somos escravizados e mortos, meditemos sobre esta promessa de nosso Senhor Jesus Cristo: “Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos céus!” (Mt 5, 10). Este é o tema do oitavo e último artigo da série “As Bem-aventuranças”, que a Fraternidade Discípulos da Mãe de Deus produziu, e que apresentamos exclusividade:
A perseguição por causa da justiça
Logo no início da História Sagrada, vemos a presença da perseguição. Abel reconhecia Deus como seu Senhor e dava a Ele, em gratidão, o que era de melhor. Isto incomodava Caim, pois as suas ofertas não eram por amor, por reconhecimento. Caim não conseguia ter o mesmo desapego de seu irmão e para não mais se sentir importunado, resolveu o perseguir, e a melhor forma que encontrou de vingar-se foi assassinar Abel (cf. Gn 4, 1-8). Sabe o real motivo? Porque as suas obras eram más, e as do seu irmão, justas (1 Jo 3, 12). Esta perseguição perdurou em toda a história da humanidade, se faz presente até nossos dias e faz parte das nossas vidas muito mais do que imaginamos.
Normalmente, a perseguição existe quando alguém quer proibir o posicionamento, as crenças de outra pessoa, ou de um grupo. Para impedir que seja desenvolvido uma opinião que venha a ser contraria a um poder, a um status adquirido. A perseguição pode ser expressa por represálias, pelas mais variadas violências, bem como em forma de vingança. Com estes escândalos em nossa economia, os que receberam as “propinas”, será que não perseguem aquelas pessoas que possam denunciá-las? Com o crescimento na economia, decorrente do consumismo, será que os empresários não querem perseguir aquelas pessoas que propagam o desapego e a modéstia e o “não” ao consumismo desenfreado?
A justiça dos homens e a justiça de Deus
Jesus Cristo é da descendência do rei Davi. Ele foi escolhido pelo Altíssimo, pois era bem firmado nos princípios e tinha um profundo amor por Deus. Entretanto, em suas tentações carnais, desejou a mulher de um de seus valentes soldados, o hitita Urias. Davi, como “rei” podia ter tudo e todos. Afinal seu poder era “absoluto” em seu reino. Este “poder” o levou a cobiça e consequentemente ao adultério com Betsabé. A grande questão: Ele usou de justiça quando escreveu a Joab: “Ponha Urias na linha de frente e deixe-o onde o combate estiver mais violento, para que seja ferido e morra”? (2 Sm 11, 15).
Provavelmente, Davi estava “cego” e não tinha entendimento pleno de sua infração. Diz a palavra que, com a morte de Urias, e alguns dias do luto: “Davi mandou que a trouxessem para o palácio; ela se tornou sua mulher e teve um filho dele” (2 Sm 11, 27). Será que a forma de proceder de Davi foi justa? Existe justiça quando se desagrada Deus?
A justiça que vamos estabelecer neste artigo, não é referente à civil, a dos homens, a da carne. Pois, segundo a justiça civil, em algumas realidades é justificável, por exemplo, abortar, quando a gravidez é proveniente de um estupro, por isso, apesar do aborto ser um crime, não se aplica a pena.
Na Lei de Deus, perguntamos: existe justiça, quando não se respeita o próximo? Existe justiça, quando não se está em conformidade com os preceitos de nossa Igreja? Para ser considerado justo diante do Altíssimo, a pessoa deve se encontrar em “estado de graça” perante este mesmo Deus. E se perder este “estado”? Devemos fazer de tudo para o readquirir.
Imagine: sua casa está sempre limpa? Não, claro que não! Mesmo que você faça uma boa higienização, em pouco tempo, percebe-se novas sujeiras. E aí? Será preciso uma nova faxina, para a casa readquirir o estado de limpeza novamente. Pois, se sabe a “graça” de conservá-la limpa. Nossa vida interior também se “suja”, com os nossos pecados e ingratidões a Deus. Reconhecemos Deus como único Senhor e Salvador, mas, mesmo assim, o traímos, pois pecamos. Daí, por misericórdia, invade-nos o arrependimento, o remorso e o entendimento das ofensas que causamos ao Senhor e aos nossos irmãos, e nos vêm também o desejo de saneamento de alma. Recorremos ao confessionário, pelo anseio do reencontro e da reconciliação com Deus, de restabelecer a amizade e o amor para com Ele. Com a absolvição, as impurezas das culpas são apagadas, ou seja, perdoadas.
Uma pessoa é considerada justa quando deseja cumprir os mandamentos de Deus e reconhece que a adesão a Cristo Jesus é o único caminho que leva à vida verdadeira, à felicidade eterna. Aí sim, quando a sua fé está em Deus e está em estado de graça, a pessoa está “justificada”, pelos méritos da paixão, morte e ressurreição de nosso Senhor.
Você é perseguido por causa da justiça?
Desde o princípio, os seguidores de Jesus cristo sofreram perseguições dos poderes civis e religiosos, como aconteceu com os apóstolos:
Chamaram os apóstolos e mandaram açoitá-los. Ordenaram-lhes então que não pregassem mais em nome de Jesus, e os soltaram. Eles saíram da sala do Grande Conselho, cheios de alegria, por terem sido achados dignos de sofrer afrontas pelo nome de Jesus. E todos os dias não cessavam de ensinar e de pregar o Evangelho de Jesus Cristo no templo e pelas casas. (At 5, 40-42).
Você já viveu a experiência de ser perseguido, “chingado, e/ou açoitado”, por propagar os ensinamentos de Jesus? Diz-se que todo perseguido por causa do Reino, padece humilhação, sofre perseguição e experimenta a injustiça. Reflita. Será que você conhece alguém que já sofreu abuso por causa dos preceitos de Deus? Veja algumas situações de perseguição que fazem parte do dia a dia de muitas pessoas:
Uma criança, que já foi caçoada por ser temente a Deus, não querer se envolver com os coleguinhas da escola na leitura de horóscopo e/ou brincadeiras evocando os espíritos. Será que já foi “empurrada” para longe do grupo?
Um jovem, que não queria estar sintonizado com o mundo, que não estava interessado nas noitadas, farras, bebedeiras e orgias, e foi considerado retrógrado e perturbador quando demonstrava e exortava a prática da reparação aos Sagrados Corações.
Um homem, que já foi ridicularizado por ter rezado e divulgado a oração do Santo Terço? Será que já foi chamado de “mulherzinha”?
Uma mulher, que já foi chacoteada por cuidar bem dos homens, por ter sido sensível e feminina e querendo cuidar do lar, buscou ser virtuosa? Será que já foi nomeada de “traidora” pelas feministas?
Um celibatário, que em suas férias, fora de sua comunidade, foi passar uns dias em casa e seus antigos amigos criaram as mais variadas astúcias e vexames, para ver se o mesmo deixaria seus compromissos espirituais.
Um universitário, que já foi hostilizado no seu grupo por defender a castidade? Será que já recebeu o nome de “otário” e que estava perdendo a vida?
Um médico, que já foi intimado pelo Conselho de Medicina, por defender a dignidade da vida, se pronunciando contrário aos métodos anticoncepcionais e ao aborto?
Um padre, que queira honrar os votos assumidos e a imitação dos ensinamentos de nosso Senhor e que é alvo de crítica do próprio clero?
Uma professora, que não aderiu a sujeição imposta de greve, por compaixão de seus alunos e foi jogada para “escanteio” nas reuniões dos demais membros de sua classe?
Um político, que por princípio quis defender as minorias: os pobres, as crianças, as viúvas e em seus projetos apelou em favor destes. Será que não recebe zombaria de sua própria família, que o exorta a ser esperto?
Um devoto exterior, que por portar uma camisa de Nossa Senhora foi provocado e constrangido publicamente por um “protestante” sem fundamento, dizendo a heresia que Deus não tem mãe.
Um funcionário, que foi coagido a trabalhar em dias santificados, como na semana Santa, contrariando a sua fé, com a ameaça de perder seu emprego, caso se negasse.
Você mesmo já sofreu por ser católico? Já “mangaram” de você, por ser mariano? Todo este escárnio, é consequência da firme decisão de viver a serviço do bem e contra o mal, de lutar pela justiça e contra toda a injustiça.
Assista o programa Consagra-te TV com o tema “Bem-Aventurados os Perseguidos”:
Quem é Deus para você?
Você tem certeza que Deus é o seu Criador, Consolador e Salvador? Se tem esta convicção, receberás o mesmo que Ele recebeu. Mas, diante de toda a perseguição, não desista de proclamar as verdades e as Leis de Deus.
Muitas pessoas, nas Sagradas Escrituras, já sofreram com a maldade daqueles que os perseguiam. Você já ouviu falar de Herodíades? Cuidado, se você encontrar com uma mulher do “tipo” dela, a sua cabeça também poderá “rolar”. Contudo, serás proclamado mártir, se isto acontecer por causa da fé. Sabe o que significa ser mártir? É uma pessoa submetida a suplícios e à morte, pela recusa de renunciar à fé cristã ou a qualquer um de seus princípios fundamentais.
Para não perder o prestígio diante de seus convidados, o rei Herodes cometeu uma das maiores injustiças da história bíblica, que foi precisamente a decapitação de João Batista (cf. Mc 6, 27). E o porquê disto? “João tinha dito a Herodes: Não te é permitido ter a mulher de teu irmão. Por isso Herodíades o odiava e queria matá-lo” (Mc 6, 18-19). Desse modo, São João Batista tornou-se um mártir.
João Batista era considerado um grande profeta. Os profetas não foram perseguidos de graça. Eles possuíam valores, mensagens e um estilo de vida que denunciava. Por isso, aqueles que estavam em pecado e desejavam permanecer no engano e na farsa, que não queriam ser descobertos, perseguiam os profetas, eram seus acusadores com toda a diversidade de maldades, quando não os matavam. Mas, em meio à perseguições, o apóstolo São Paulo nos dá uma certeza:
Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação? A angústia? A perseguição? A fome? A nudez? O perigo? A espada? Realmente, está escrito: “Por amor de ti somos entregues à morte o dia inteiro; somos tratados como gado destinado ao matadouro” (Sl 43, 23). Mas, em todas essas coisas, somos mais que vencedores pela virtude daquele que nos amou. Pois estou persuadido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem as potestades, nem as alturas, nem os abismos, nem outra qualquer criatura nos poderá apartar do amor que Deus nos testemunha em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm 8, 35-39).
O que é ser perseguido por causa da justiça?
Independente da família, da profissão, do grupo social e econômico que pertença, quando uma pessoa segue Jesus Cristo e tem comportamentos e atitudes condizentes com o Reino, provoca reflexão. Se vai de encontro, ou seja, se contraria e entra em conflito com pensamentos e interesses dos outros, certamente vai receber agressões.
Todos que não compreendem o amor e o perdão, acharão o cristianismo um elemento perturbador e perseguirão os cristãos, como perseguiram Jesus. No entanto, um cristão está muito mais envolvido em permanecer fiel a Deus e ser salvo por Ele do que interessado em buscar a segurança de guardar a própria vida, como bem expressa São Paulo:
Cumpre, somente, que vos mostreis em vosso proceder dignos do Evangelho de Cristo. Quer eu vá ter convosco quer permaneça ausente, desejo ouvir que estais firmes em um só espírito, lutando unanimemente pela fé do Evangelho, sem vos deixardes intimidar em nada pelos vossos adversários. Isto para eles é motivo de perdição; para vós outros, de salvação. E é a vontade de Deus (Fl 1, 27-28).
A Virgem Maria e a confiança na justiça de Deus
A Virgem Maria, por ser portadora do Príncipe da Paz, também foi perseguida (cf. Mt 2, 13-15). Lembre-se, com quem estava a Criança que o rei Herodes queria matar? Na condenação de seu Filho, a atitude dela, nunca foi de vingança, ou de ódio, para com aqueles que preferiram Barrabás e gritaram em relação a seu Filho: “Crucifica-o!” (Mc 15, 13).
Nossa Senhora pauta seus atos na justiça de Deus, que inclui liberdade e amor. Não encontramos na Tradição da Igreja, nem nos Evangelhos, cenas nas quais a Mãe de Deus fica com autopiedade, murmurando seus desgostos pelas ingratidões dos homens.
A Mãe de Deus é a Mulher da exortação, da ordem e da obediência. Santo Irineu dizia que a Virgem Maria tornou-se, através de sua obediência, causa de salvação tanto para si mesma, quanto para toda a raça humana1.
Nossa Rainha é modelo de estar de pé (cf. Jo 19, 25), mediante a qualquer perseguição. Suas atitudes nos lembram, sempre resignação, paciência, doçura e sabedoria. Se agirmos desta forma, independente das persignações, o Senhor sempre livrará seus filhos.
A inimizade entre a Virgem Maria e a serpente permanecerá até o fim dos tempos, bem como a batalha entre o Reino dos Céus e o reino deste mundo. Este conflito, tribulação e perseguição de Satanás contra os filhos da Luz continuará até a vinda definitiva do Reino de Deus, especialmente contra os escravos da Santíssima Virgem, como nos ensinou São Luís Maria Grignion de Montfort:
Deus não pôs somente inimizade, mas inimizades, e não somente entre Maria e o demônio, mas também entre a posteridade da Santíssima Virgem e a posteridade do demônio. Quer dizer, Deus estabeleceu inimizades, antipatias e ódios secretos entre os verdadeiros filhos e servos da Santíssima Virgem e os filhos e escravos do demônio. Não há entre eles a menor sombra de amor, nem correspondência íntima existe entre uns e outros. Os filhos de Belial, os escravos de Satã, os amigos do mundo (pois é a mesma coisa) sempre perseguiram até hoje e perseguirão no futuro aqueles que pertencem à Santíssima Virgem, como outrora Caim perseguiu seu irmão Abel, e Esaú, seu irmão Jacob, figurando os réprobos e os predestinados. Mas a humilde Maria será sempre vitoriosa na luta contra esse orgulhoso, e tão grande será a vitória final que ela chegará ao ponto de esmagar-lhe a cabeça, sede de todo o orgulho. Ela descobrirá sempre sua malícia de serpente, desvendará suas tramas infernais, desfará seus conselhos diabólicos, e até ao fim dos tempos garantirá seus fiéis servidores contra as garras de tão cruel inimigo2.
São Luís Maria também profetizou sobre as perseguições e a fúria de Satanás contra o seu livro “Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem” e também contra aquelas pessoas que o lerem e puserem em prática seus ensinamentos:
Vejo, no futuro, animais frementes, que se precipitam furiosos para dilacerar com seus dentes diabólicos este pequeno manuscrito e aquele de quem o Espírito Santo se serviu para escrevê-lo, ou ao menos para fazê-lo ficar envolto nas trevas e no silêncio de uma arca, a fim de que ele não apareça. Atacarão até, e perseguirão aqueles e aquelas que o lerem e o puserem em prática. Mas não importa! tanto melhor! Esta visão me encoraja e me dá a esperança de um grande sucesso, isto é, um esquadrão de bravos e destemidos soldados de Jesus e de Maria, de ambos os sexos, para combater o mundo, o demônio e a natureza corrompida, nos tempos perigosos que virão, e como ainda não houve3.
A grande promessa da Bem-aventurança: o Reino dos céus!
A cultura do mundo está em total contradição com a cultura de nosso Senhor. O mundo parabeniza os “espertos, os corruptos, os enganadores” e despreza, rejeita, e pior, persegue aqueles que chamamos de “bem-aventurados”. Mas, não nos esqueçamos: “uns irão para o castigo eterno, e os justos, para a vida eterna” (Mt 25, 46). Os anjos virão, separarão os perversos dos justos e lançarão aqueles na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes (cf. Mt 13, 41-42).
Precisamos ser “justificados” por Jesus perante Deus. Sabemos do fim, do juízo e da vinda do Reino dos Céus, para o qual o mundo não está se preparando e se purificando.
Sejamos justos com o presente que nosso Senhor nos deu do Alto da Cruz (cf. Jo 19, 26-27). Que possamos fazer como o Discípulo amado fez. É preciso nos entregar, consagrar-nos a Virgem Maria e definitivamente a levar para a nossa casa (cf. Jo 19, 27) e, estando na intimidade desta Advogada, rogar por esta bem-aventurança, de alcançar o Reino dos Céus.
Mara Maria, fundadora da Fraternidade Discípulos da Mãe de Deus.
Acesse todos os artigos da série “As Bem-aventuranças”:
TODO DE MARIA. Meditações sobre as Bem-aventuranças.
Links relacionados:
DISCÍPULOS DA MÃE DE DEUS. História da Fundação.
DISCÍPULOS DA MÃE DE DEUS. Objetivo do Carisma Discípulos da Mãe de Deus.
TODO DE MARIA. Mara Carvalho e a Discípulos da Mãe de Deus.
Referências:
1 SANTO IRENEU. Contra as heresias, III, 22.
2 SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem, 54.
3 Idem, 114.