Saiba o que é a oração de recolhimento ativo e como esta prática pode produzir muitos frutos em nossa vida espiritual.
Nesta aula do curso “Ensina-nos a Orar”, Padre Paulo Ricardo nos explica o que é a oração de recolhimento ativo ou oração de simplicidade. Este recolhimento da alma em oração tem suas características e exigências próprias, para que produza bons frutos em nossas almas. Além disso, há graus de recolhimento da alma, conforme o empenho da nossa vontade. Quanto mais nos recolhemos, mais e melhores frutos colheremos de nossa oração na presença de Deus.
Quando progredimos na meditação, percebemos uma realidade que Santa Teresa de Jesus, também conhecida como Santa Teresa d’Àvila, só descobriu quando lhe deram de presente o livro das “Confissões”, de Santo Agostinho. Com o Doutor da Graça, ela aprendeu que Deus habita em nós. Jesus, o próprio Deus feito homem, traz para o nosso coração a presença da Santíssima Trindade, que Agostinho buscava fora de si. Esta busca, que é também a busca de cada um de nós, foi expressa em suas célebres e memoráveis palavras dirigidas a Deus: “Tarde te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Estavas dentro de mim e eu estava fora, e aí te procurava… Estavas comigo e eu não estava contigo”[1].
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O que é a oração de recolhimento ativo da alma?
A oração de recolhimento ativo começa com a graça da consciência dessa presença de Deus, Pai, Filho e Espírito Santo, em nós. Primeiramente, habituamo-nos à realidade da inabitação trinitária através da comunhão eucarística. Mas, depois seremos capazes de notar que esta presença está lá, em nosso espírito, também quando não comungamos e então começamos a nos recolher. Por que isso acontece? Porque passamos a notar que Deus é o “tesouro escondido” do Evangelho, é o “Reino dos Céus” (Mt 13, 44), que está dentro de nós (cf. Lc 17, 21).
Insistimos em dizer que este recolhimento é ativo porque existe um outro recolhimento, místico, passivo, em que a nossa alma é levada por Deus a se recolher. No entanto, não estamos falando disto ainda. Nós estamos tratando de um esforço da alma, que vai se recolhendo interiormente. Aos poucos, este esforço vai se tornando cada vez mais fácil, de tal forma que nos habituamos a nos recolher interiormente.
As exigências da oração de recolhimento ativo da alma
Santa Teresa d’Ávila descreve de forma extraordinária essa realidade do recolhimento ativo, no capítulo 28 do seu clássico livro de espiritualidade: “Caminho de Perfeição”. Vejamos brevemente algumas passagens desse precioso capítulo 28, porque ninguém melhor do que Santa Teresa para descrever aquilo que nós podemos experimentar com esta oração de recolhimento.
Em primeiro lugar, ela diz assim que “este modo de rezar, – ou seja, de ver que o Rei está dentro do nosso coração, que a sua Majestade está em nós – mesmo vocalmente, recolhe o intelecto com muito mais rapidez”[2]. Porque, é evidente, quando temos consciência da presença do Criador do Céu e da Terra dentro de nós, não há razão para nos perder olhando para as criaturas fora de nós?
Então, uma das características da pessoa que consegue rezar desta maneira, que se esforça para rezar desse modo, é que ela vai se acostumando a fechar os olhos durante a oração. Pois, ela sabe quem é o Hóspede de sua alma. A esse respeito, Santa Teresa faz uma comparação: o recolhimento é como se estivéssemos em um palácio real; temos tantas coisas preciosas dentro de nós, da nossa alma, que não temos motivos para olhar pela janela, não temos razões para olhar para fora do palácio. Nesse sentido, Teresa de Jesus descreve a oração de recolhimento: “É um retirar os sentidos das coisas exteriores, abandonando-as de tal maneira que, sem compreender, ela vê os seus olhos se fecharem para não as contemplar e para que mais se desperte a visão das coisas espirituais”[3]. Então, a alma que está em recolhimento ativo, diz Santa Teresa: “quase sempre que reza tem os olhos fechados”[4].
Assista ou ouça aula do Padre Paulo Ricardo sobre “O que é recolhimento ativo?”:
Os graus da oração de recolhimento ativo da alma
Quanto a esse recolhimento ativo, a própria Santa Teresa nos diz que há graus inferiores e superiores, graus maiores e menores. Não nos recolhemos ativamente todos no mesmo grau. Aos poucos, nós nos habituamos e é uma coisa tão ativa que depende muito da nossa cooperação. Teresa d’Ávila diz também que, reconhecendo que há vários graus, se nós nos fizermos esta “violência”, alcançaremos um grande fruto espiritual[5]. Então, com o recolhimento ativo da alma nós estaremos nos preparando para a oração mais contemplativa, na qual o próprio Deus virá para nos tomar para si.
Por fim, Santa Teresa então diz uma coisa muito importante para aquelas pessoas que precipitadamente pensam que já estão na oração mística. Ela conclui o capítulo 28 dizendo que Deus não se entrega inteiramente a quem não se entrega por inteiro[6]. Se nós ainda guardamos uma “reserva técnica”, dizendo: Senhor, eu te dou isso, isso e isso, mas deixa intacto isso aqui – não passaremos para a oração mística. Pois, Deus não se entrega por inteiro para quem não se entrega a Ele por inteiro[7].
Oração de Santo Agostinho
Tarde demais eu te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu te amei! E eis que tu estavas dentro de mim, enquanto eu estava fora: era lá fora que te procurava. Criatura deformada, mergulhei de cabeça nesses objetos de beleza que tu criaste. Tu estavas comigo, mas eu não estava contigo. Elas me detiveram longe de ti, essas coisas belas que, se não estivessem em ti, simplesmente não existiriam. Tu me chamaste, gritaste e rompeste minha surdez. Tu reluziste, brilhaste e aniquilaste minha cegueira. Tu espalhaste doces perfumes, e eu os inalei e suspirei por ti. Degustei, e senti fome e sede. Tu me tocaste, e eu senti um desejo ardente de tua paz[8].
Links relacionados:
PADRE PAULO RICARDO. Aprenda a rezar rezando, com Padre Paulo Ricardo.
PADRE PAULO RICARDO. Projeto Terceira Morada.
TODO DE MARIA. Mudar de vida com o Projeto Segunda Morada.
TODO DE MARIA. Padre Paulo Ricardo ensina-nos a orar.
Referências:
[1] SANTO AGOSTINHO. Confissões, X, 38.
[2] SANTA TERESA DE JESUS. Caminho de Perfeição, C 28, 4.
[3] Idem, C 28, 6.
[4] Idem, ibidem.
[5] Cf. Idem, C 28, 7.
[6] Cf. Idem, C 28, 12.