Em nossa caminhada de fé, nos perguntemos: qual é a decisão mais importante da minha vida?
Nós cristãos devemos sempre buscar, como fez Jesus Cristo, no silêncio do deserto a resposta para a decisão mais importante das nossas vidas. O deserto, onde Jesus foi levado pelo Espírito Santo (cf. Lc 4, 1-2), é o lugar do silêncio, da pobreza, onde não temos nem mesmo o básico para viver e nos encontramos diante das necessidades fundamentais da nossa existência. No deserto, somos impelidos a ir ao essencial e, justamente por isso, nele é mais fácil encontrar Deus. Todavia, o deserto é também o lugar da morte, pois onde não há água também não há vida, e é o lugar da solidão, onde sentimos mais intensamente a tentação. Jesus vai ao deserto e sofre a tentação de deixar o caminho indicado pelo Pai para seguir outros rumos, mais fáceis e mundanos (cf. Lc 4, 1-13). Dessa forma, o “Servo Sofredor” assume as nossas tentações, traz consigo a nossa miséria, para vencer o maligno e nos abrir o caminho para Deus, que é a via da conversão, da mudança de vida.
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Meditar sobre as tentações de Jesus no deserto é um convite para respondermos a uma questão fundamental: o que conta verdadeiramente em minha vida? Na primeira tentação, o Demônio propõe a Jesus que transforme uma pedra em pão, para saciar a Sua fome (cf. v. 3). O Senhor responde que o homem não vive somente de pão, pois “sem uma resposta à fome de verdade, à fome de Deus, o homem não se pode salvar” (Papa Bento XVI, Audiência Geral, 13 de Fevereiro de 2013). Na segunda tentação, o Diabo propõe a Jesus o caminho do poder: conduz o Salvador para um alto monte e Lhe oferece o domínio do mundo; “mas não é este o caminho de Deus: para Jesus é evidente que não é o poder mundano que salva o mundo, mas o poder da cruz, da humildade e do amor” (Idem). Na terceira tentação, o Satanás diz ao Filho de Deus que se jogue do ponto mais alto do Templo de Jerusalém, para que Deus O salve através dos seus anjos, colocando o Pai à prova (cf. vv. 9-10). A resposta do Filho do Altíssimo é que não podemos impor as nossas condições para Deus, pois Ele é o Senhor de tudo (cf. v. 12). O núcleo das três tentações que sofre o Senhor Jesus é a proposta de fazer de Deus um instrumento que podemos usar para os nossos próprios interesses, como a glória e o sucesso. Trata-se de nos colocar no lugar de Deus, retirando o Senhor da nossa existência e fazendo-O parecer desnecessário. Diante deste perigo, deveríamos nos perguntar: que lugar tem Deus em minha vida? Ele é o Senhor da minha, ou sou eu o senhor?
Superar as tentações de submeter Deus a nós mesmos e aos nossos interesses, ou de deixar Deus de lado, e converter-nos para a justa ordem das coisas, dando a Deus o primeiro lugar em nossas vidas, é um caminho que devemos percorrer sempre de novo. “Converte-te”: esta é ordem de Deus que ouviremos muitas vezes no tempo da Quaresma, e conversão significa: seguir Jesus de modo que o Seu Evangelho seja o guia concreto das nossas vidas; deixar que Deus nos transforme, deixar de pensar que nós somos os únicos construtores da nossa existência; reconhecer que somos criaturas, que dependemos de Deus, do seu amor, e que só “perdendo” a nossa vida por causa Dele podemos ganhá-la (cf. Mt 16, 25). Devemos fazer as nossas escolhas à luz da Palavra de Deus. “Não podemos continuar a ser cristãos como uma simples consequência do fato de vivermos numa sociedade que tem raízes cristãs: até quem nasce de uma família cristã e é educado religiosamente deve, todos os dias, renovar a escolha de ser cristão, ou seja, reservar a Deus o primeiro lugar, diante das tentações que uma cultura secularizada lhe propõe continuamente” (Papa Bento XVI, Audiência Geral, 13 de Fevereiro de 2013).
A sociedade atual nos submete a numerosas provações, que dizem respeito à nossa vida pessoal e social. Não é fácil sermos fiéis ao matrimônio cristão, praticar a misericórdia no dia a dia, reservar tempo para a oração e o silêncio interior. Não é fácil sermos contra, em público, as escolhas que muitas pessoas consideram evidentes, como o aborto no caso de gravidez indesejada, a eutanásia em caso de doenças graves, a seleção dos embriões para prevenir doenças hereditárias. “A tentação de pôr de lado a própria fé está sempre presente e a conversão torna-se uma resposta a Deus, que deve ser confirmada muitas vezes na vida” (Idem).
As grandes conversões dos inícios da Igreja, como a de São Paulo ou de Santo Agostinho, servem de exemplo e incentivo para nós, mas também em nossa época, de perda do sentido do sagrado, a graça de Deus continua a agir e a realizar maravilhas na vida de muitos fiéis. Uma das provas desta ação da graça de Deus em nosso tempo é o testemunho de Santa Gianna Beretta Molla (1922-1962), médica italiana que é colocada diante de um grande dilema durante a gravidez. Ela tinha um fibroma (tumor) no útero, por isso o parto seria de risco. Com grande confiança em Deus, Gianna demonstra-se pronta a sacrificar a própria vida para salvar a do seu filho: “Se deveis decidir entre mim e o filho, nenhuma hesitação: escolhei – e isto o exijo – a criança. Salvai-a”. Outro testemunho da maravilhosa ação da graça de Deus é o da Beata Chiara Luce Badano (1971-1990), uma jovem italiana comum, que gostava de nadar, esquiar, ouvir música e estar com os amigos. Aos 17 anos, Chiara descobre que estava com um osteossarcoma (tumor maligno dos ossos) e passa por uma profunda luta interior. Mas, logo a jovem decide aceitar a doença e suporta bravamente os sofrimentos e as dores causadas pela sua enfermidade. No dia 7 de outubro de 1990, Chiara Luce deixa este mundo com um último sorriso para o pai, Ruggero, e uma palavra à sua mãe, Maria Teresa: “Mamãe, seja feliz, porque eu o sou!”. Que os testemunhos luminosos de Gianna, Chiara e de tantos outros santos e santas da Igreja nos ajudem em nosso processo de conversão, de santificação, e a dar a Deus o primeiro lugar em nossas vidas. Nossa Senhora das Dores, rogai por nós!