A Virgem Maria está presente na vida dos cristãos como a Mãe dos Crentes e a Mãe da Igreja.
A Santíssima Virgem Maria está presente na vida dos cristãos, na reflexão bíblica e teológica como a Mãe dos Crentes e a Mãe da Igreja. Para compreender esta presença de Nossa Senhora em nossas vidas e na vida da Igreja de Cristo somos convidados a nos voltar para a Palavra de Deus e refletir, com o auxílio do Espírito Santo, sobre um paralelo extraordinário que podemos estabelecer entre o Antigo Testamento e o Novo Testamento. Trata-se de compararmos, a partir da Palavra de Deus e das reflexões dos teólogos, as pessoas de Abraão e de Maria, para entendermos a importância da Mãe de Deus em nossas vidas e na vida da Igreja.
Receba o conteúdo deste blog gratuitamente em seu e-mail.
Um analogia possível que a Palavra de Deus nos apresenta para falar da Virgem Maria, é a que estabeleceremos entre ela e a figura de Abraão. “Cristo, no Novo Testamento, nunca é chamado de novo Abraão, ao passo que é chamado, pelo menos implicitamente, de novo Adão, novo Isaac, novo Jacó, novo Moisés, novo Aarão”1. Isaac, filho de Abraão, é tipo (imagem) de Cristo. Entretanto, “Abraão não tem a sua realidade correspondente em Cristo, mas em Maria, porque ele é constituído pai pela fé, e representa a fé: algo que o Novo Testamento nunca atribui a Jesus, mas atribui a Maria, quando a proclama bem aventurada pela sua fé”2.
A comparação entre a fé de Abraão e a de Maria está presente na correspondência entre dois acontecimentos. Na vida de Abraão, encontramos dois grandes atos de fé: Abraão acreditou na promessa de Deus de que ele teria um filho, apesar da falta de vigor, por ter quase cem anos, e do ventre de Sara, já sem vida3; Abraão também foi provado em sua fé quando ofereceu Isaac, seu único filho, apesar de ter recebido as promessas4. Na vida da Virgem Maria, também encontramos dois grandes atos de fé: a jovem de Nazaré acreditou quando o Anjo anunciou a ela, que era virgem, o nascimento de um Filho, que seria o herdeiro de todas as promessas de Deus5; Nossa Senhora também acreditou quando Deus lhe pediu que assistisse o sacrifício do Filho que lhe tinha dado6. “Aqui se apagam todas as luzes e a pessoa humana entra, de verdade, nas trevas da fé. Parece que Deus se contradiz e esquece de suas promessas”7.
O Senhor tinha sido dito: Ele será Grande e será chamado Filho do Altíssimo8, entretanto, é aniquilado pelos insultos e pelas maus tratos dos algozes; Ele reinará eternamente sobre o Trono de Jacó9, mas é crucificado! “Até o último momento Maria deve ter esperado – porque ela também caminhava na fé e na esperança e não na visão – que Deus intervisse, que as coisas mudassem de rumo”10. A Nossa Senhora é pedido muito mais do que a Abraão, pois a este Deus poupou a vida do filho11, mas a ela não. O seu Coração Imaculado foi transpassado pela espada da dor, do sofrimento12, por causa da paixão e da morte de seu Filho.
Por acreditar nas promessas de Deus, Abraão mereceu, na Palavra de Deus, o nome de “pai”13, de “pai de todos nós”14, de todos os crentes. Da mesma forma, a Virgem Maria, por acolher na fé a vontade do Senhor15, merece mais ainda ser chamada de “Mãe de todos nós”, mãe de todos os crentes! Todavia, Mãe dos crentes não é um simples título de honra. Isto pode ser compreendido a partir da interpretação deste texto da Sagrada Escritura: “Todas as Famílias da terra serão em ti abençoadas”16. Calvino diz que: “Abraão será não só o exemplo e patrono, mas também causa de benção”17. A Abraão é concedida, no plano salvífico de Deus, a função de mediador da benção para todas as gerações da terra.
Estas reflexões a respeito de Abraão nos ajudam a compreender o que a Tradição da Igreja, a partir do pensamento de Santo Irineu, diz da Virgem Maria: “ela não é só um exemplo de benção e de salvação, mas, de alguma maneira, dependente só da graça e da vontade de Deus, é também causa – secundária e instrumental – de salvação; a sua maternidade em relação à Igreja não é só de honra ou uma simples maneira de dizer. ‘Como Eva, pois desobedecendo tornou-se causa de morte para si e todo o gênero humano, assim Maria… obedecendo tornou-se causa de salvação para si e para todo o gênero humano’”18.
Assim, quando a Palavra de Deus diz: “Todas as gerações hão de me chamar bem-aventurada”19, Deus dá uma ordem à todos os crentes, da mesma forma que quanto a Palavra dirigida a Abraão: “Todas as famílias da terra em ti serão abençoadas”20. Devemos reconhecer a função de “mediador” da bênção a Abraão e, com maior razão ainda, reconhecer a mesma função a Virgem Maria, que ela tornou-se causa de salvação para todos nós, pois trouxe ao mundo Jesus Cristo, o Salvador da humanidade. Pois, no Novo Testamento, a mediação única de Cristo se exerce pelas mediações criadas e humanas, por Ele mesmo instituídas, como os sinais sacramentais e o ministério dos apóstolos. Maria é um “capítulo” importante, da Palavra de Deus. A sua vida é uma existência profética, portadora de revelação, não só e não tanto por aquilo que diz, mas por aquilo que faz e é. Maria é sinal sacramental, “palavra visível”, palavra realizada e presente na Igreja de Cristo. Por todas essas razões, a reflexão bíblica e teológica a respeito da Mãe da Igreja pode contribuir muito para a comunhão entre os cristãos. Maria, Mãe dos Crentes, rogai por nós!
Referências bibliográficas:
1 CANTALAMESSA, Raniero. Maria, um espelho para a Igreja. Aparecida: Santuário, 1992, p. 114.
2 Idem, p. 114 (cf. Lc 1, 45).
3 Cf. Rm 4, 19; cf. Hb 11, 11.
4 Cf. Hb 11, 17.
5 Cf. Lc 1, 26-38.
6 Cf. Jo 19, 25.
7 CANTALAMESSA, Raniero. Op. cit., p. 115.
8 Cf. Lc 1, 32.
9 Cf. Lc 1, 32b.
10 CANTALAMESSA, Raniero. Op. cit., p. 115.
11 Cf. Gn 22, 12.
12 Cf. Lc 2, 35.
13 Cf. Lc 16, 24.
14 Cf. Rm 4, 16
15 Cf. Lc 1, 38.
16 Gn 12, 3.
17 CANTALAMESSA, Raniero. Op. cit., p. 116 (Calvino, Le Livre de la Gênese, I, Genebra 1961, p.195).
18 Idem, p. 116-117 (Santo Irineu, Contra as Heresias, III,22,4-SCh 211, p. 442s).
19 Lc 1, 48.
20 Gn 12, 3.